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COLUNA

Bolsonaro se agarra ao Centrão para se blindar contra impeachment

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Imagine ser possível voltar no tempo, mais especificamente para outubro de 2018. Jair Bolsonaro acabou de se tornar presidente derrotando Fernando Haddad (PT). Durante essa breve viagem no tempo, você conta para uma interlocutora que Sergio Moro seria defenestrado do governo antes da metade do mandato, que o líder do Centrão, Ciro Nogueira (PP-PI), seria nomeado ministro da Casa Civil, que as denúncias de corrupção se acumulariam na mesma proporção que os pedidos de impedimento contra o presidente, e que Bolsonaro, com receio de perder a eleição, ameaçaria a democracia diuturnamente. Bem provável que ela não acreditasse. Pelo menos não em tudo.




 
Talvez, a ameaça à democracia fosse o que menos espantaria a interlocutora do passado. Desde o início, o aparelhamento perpetrado por Bolsonaro, nomeando militares para cargos relevantes, já dava indícios da intenção de cooptar o apoio das forças de segurança. O comando militar não foi unânime nessa adesão sem volta ao governo. Não por acaso, de forma inédita, comandantes das três Forças foram demitidos, juntamente com o então ministro da Defesa, Fernando Azevedo. O sucessor de Azevedo – general Walter Braga Neto – não só endossou toda a pauta bolsonarista, como nomeou aliados para o comando das Forças, além de fazer coro no condicionamento da realização das eleições à adoção do voto impresso.
 
Agora, essa história de colocar o governo no colo do líder do Centrão era exigir demais da credulidade dessa interlocutora de outubro de 2018. Se pareceria improvável no passado, no presente faz bastante sentido. Ciro se tornará o primeiro senador e primeiro político filiado ao Partido Progressistas (PP) a se tornar ministro no governo Bolsonaro. Apesar de controlar a presidência da Câmara dos Deputados e representar a quarta maior bancada tanto na Câmara como no Senado Federal, o PP havia sido preterido na Esplanada dos Ministérios até então. Com isso, o presidente se blinda mais ainda dos pedidos de impeachment e ainda tem potencial para melhorar sua situação no Senado, um ambiente bem mais hostil às pautas do governo e contaminado pela CPI da Pandemia.
 
Mas quem diria que Bolsonaro cogitaria se filiar ao próprio Partido Progressistas e ainda bradar aos quatro ventos: “Sou do Centrão”? Novamente, hoje faz sentido. Bolsonaro já havia colocado a deputada Flávia Arruda, aliada do presidente da Câmara, Arthur Lira (também do PP, de Alagoas), na Secretaria de Governo, e nomeado o deputado Ricardo Barros (PP de novo, do Paraná) como líder do governo na Câmara.




 
Trazer tantos políticos experientes, mas envolvidos em casos de corrupção no passado, tem ônus e bônus: tende a melhorar a articulação política, mas enfraquece muito uma das bandeiras principais da eleição de Bolsonaro em 2018: o combate à corrupção. Uma das apostas é que o abandono da bandeira, simbolizada pela saída do ex-ministro Sergio Moro, já está “precificado” na perda atual de popularidade do presidente.

Agora, imagine que a interlocutora é uma senhora de 72 anos chamada Eliana e Silva Nogueira, mãe do senador Ciro Nogueira. No final da conversa, ela é informada que poderá vir a se tornar senadora da República. Não é difícil imaginá-la respondendo: “Duvido. Nunca tive cargo público. Além disso, Ciro acha Bolsonaro um fascista. Jamais será ministro no governo dele”.
 
A família Nogueira é a prova de que a política no Brasil, além de ser a arte do possível, é também o ofício do improvável.

audima