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Do vazio ao desejo


postado em 30/06/2019 04:00 / atualizado em 01/07/2019 13:46

Vamos falar do vazio. Dizia um sábio comandante muçulmano a seus soldados dias antes da ameaça de uma guerra que se hoje estavam juntos e rodeados de companheiros, sempre haveria lugares vazios.  E que esses lugares, mesmo vazios, representam algo querido que já esteve ali e, portanto, devem permanecer vazios, lembrando os donos daqueles lugares e o desejo de reencontrar em outro mundo os queridos que ali estiveram.

Esta certeza do prêmio em outra vida sustenta muitos atos extremos e terroristas, mas os atos terroristas são feitos por radicais e fanáticos e não do que de fato prega o Alcorão. E com certeza, em toda religião, a certeza mplanta o risco da radicalidade. Toda paixão causa atos extremos. Aí estão como prova o amor-paixão e o feminicídio, o suicídio e outras mortes.

Sempre lembramos na psicanálise a importância do vazio para o surgimento do desejo. Sim, é do vazio que nasce o desejo. Desejamos sempre o que ainda não temos. Este desejo se torna nosso guia para seguir em direção à sua realização. E não nos desviaremos se mantivermos o foco.

No entanto, ter foco no desejo, escutá-lo em nós, e ele é bem sutil e silencioso, requer se permitir um pouco de silêncio, de vazio, de sem sentido. O desejo é em parte inconsciente e nem todo racional. Ele nem sempre está estampado na testa, estando algumas vezes carimbado na nuca, onde não podemos vê-lo, porém seus efeitos se fazem notar.

E não há desejo onde impera o gozo. Se o desejo traz alegria, nem sempre assim é com o gozo que fruímos na vida. Algo do gozo se refere a um excesso que, ao contrário do desejo, traz submissão, compulsão e mortificação. Mas muitos se entregam a este seu viés indigno, sintomático.

A agitação, a mania de fazer coisas, de estar sempre agindo sem conseguir parar para se escutar ou ser razoável é uma das formas clássicas de fugir de si mesmo, da subjetividade, de medos, ansiedades e angústias que nos assaltam em muitos momentos de nossa vida, quando não nos posicionamos bem, quando somos contrariados, quando estamos insatisfeitos, tristes, em luto.

Sobre o gozo, conceito muito usado por nós, podemos lembrar o que disse Jacques-Alain Miller – filósofo, psicanalista e genro de Jacques Lacan – do qual estabeleceu seus seminários falados. Ele os organizou e publicou. E sobre o gozo disse Miller: “O gozo é um conceito necessário, pelo menos para ordenar o que Freud nos traz: que o sintoma, aquele que, como terapeutas, queremos curar, o sujeito se sustenta nele – neste caso, ele o ama como a si mesmo” –, é o que dizia Freud sobre o delírio para o delirante.

Ele se sustenta em seu sintoma que, no entanto, lhe faz mal. É o que justifica que se deva introduzir um conceito distinto, de um gozo que não pode ser confundido com o prazer, e que deve ser aliado à dor, pois o sintoma faz mal, uma satisfação da dor que, nessa situação, coloca o organismo em perigo. A tal ponto que, precisamente, quando esse gozo se autonomiza, é até a morte.

O amor ao sintoma que faz mal... precisamos entender este apego. E romper com ele. É a saída que temos para obter a liberdade, pouca que seja, de passar toda a vida repetindo padrões de comportamento que só fazem nos afastar do desejo e nos lançar no sofrimento, causando com nossos atos prejuízos e teimando em não olhar para nossa errância.

Somos negadores daquilo que pode nos corrigir do erro porque nos amamos narcisicamente, e a nosso sintoma mais do que devemos. Nunca deixamos o vazio se estabelecer para nos dizer que podemos fazer diferente. E para isso, a fidelidade ao desejo é tudo o que precisamos.

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