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Estado de Minas COLUNA

No bizarro ano de 2020 só nos resta o privilégio da sobrevivência

O remédio, agora, não é reabrir a economia ''à moda boi'' e, sim, executar uma intensa irrigação de recursos para a população desempregada e para reforçar o caixa de micro e pequenas empresas


postado em 10/05/2020 04:00 / atualizado em 10/05/2020 07:16

(foto: Sérgio Lima/AFP)
(foto: Sérgio Lima/AFP)

 
Caiu a ficha. Ninguém mais espera, neste bizarro 2020, senão o privilégio de poder sobreviver física, moral e financeiramente à terrível COVID-19. À exclusão dos parvos, ninguém mais põe em dúvida o poderio do inimigo invisível, capaz de penetrar sorrateiramente no organismo humano. Enquanto escrevemos essas linhas, já são mais de 10 mil vidas de brasileiros que não conseguiram dar conta da virulência do coronavírus. O maligno bichinho continuará atacando nos próximos meses, punindo nossa proverbial indisciplina. Alguns, bem poucos – espero com fé e pouca matemática – serão ceifados no seu bem mais precioso, a própria vida; muitos seremos abalados psiquicamente pelos meses passados em cárcere privado, embora sem culpa formada nem sentença proferida; e quase todos seremos feridos e debilitados no nosso órgão mais importante, depois do coração – o bolso. Micro e pequenas empresas estão sendo dizimadas. São milhões de empregos perdidos.
 
Não é “gripezinha”. Como antes, na crise de 2008, também não foi “marolinha”. Mas há uma diferença, ou várias, para pior, neste episódio do choque do coronavírus em relação ao de 2008. Estamos bem pior agora porque, primeiro, a quarentena geral no país nos provocou uma imobilidade econômica inexistente em 2008, quando havia recessão, mas não paralisação. O presidente Bolsonaro e lideranças empresariais têm toda razão em se preocupar com o prolongamento da quarentena.
 
Porém, o remédio, agora, não é reabrir a economia “à moda boi” e, sim, executar o que, embora anunciado, não está sendo feito pelo governo, que seria uma intensa irrigação, da ordem de R$ 100 bilhões para a população desempregada e mais cerca de R$ 50 bilhões direto para reforçar o caixa de micro e pequenas empresas. Para os desempregados,  isso está acontecendo, em parte; para as MPMEs, necas.
 
A segunda grande diferença entre a crise recessiva vivida pelo Brasil de Lula, em 2008-09,  e a avalanche enfrentada pelo Brasil de Bolsonaro está na reação psicológica das lideranças políticas, de agora e de então, ao serem atropeladas pelo impacto de algo enorme e totalmente imprevisível. Não falo de capacidades humanas.

Consideremos que sejam iguais as habilidades das equipes. Refiro-me à interação do corpo governamental, como um todo. Diante de algo monstruoso e completamente inesperado, uns reagem bem; outros, nem tanto; outros tantos, muito mal. Em 2008, após a frustração com o derretimento da economia e o processo inicial de negação (“é uma marolinha”), a ficha caiu mais rápido e o governo agiu de modo intenso e coordenado para evitar o espalhamento da crise, quer na base da pirâmide social, quer no suporte empresarial.

Só no âmbito do BNDES, cerca de R$ 100 bilhões (que chegaram, depois, a R$ 400 bi) foram prontamente destinados para suporte de centenas de milhares de novas operações de crédito, beneficiando médios e pequenos empresários. Nota importante: tais recursos já foram retornados ao banco, com juros, pelos empresários apoiados, gerando lucro para o BNDES, que, por sua vez, pagou bilhões de reais ao governo sob forma de mais Imposto de Renda e dividendos, ao longo da última década.
 
Celeridade e intensidade são palavras-chave em situações de surpresa total, como quando uma equipe de alpinistas é capturada numa avalanche. É preciso agir muito rápido e com grande assertividade, de modo a melhorar as chances de sobrevivência do time. No caso, o time somos nós, o Brasil. Os chefes da escalada, no entanto, parecem visivelmente chocados. Esperavam – é verdade – uma subida com muito sol e pouco vento, um passeio rumo ao topo.

Eis que o tempo, traiçoeiro, virou sem anúncio prévio, uma tormenta de proporções nunca vista antes. O ministro-guia da excursão se mostra tombado diante da magnitude do enigma maior: como socorrer o campo econômico sem gerar um devastador caudal de dívidas públicas nos anos finais do governo Bolsonaro? Os alpinistas encarregados não são menos bons dos que os de outrora. Mas a avalanche é muito maior!
 
O resultado da gravidade do problema atual é que o senso de coordenação se dispersou, o princípio da autoridade se esgotou, os conflitos se ampliaram, brotaram os ódios gratuitos onde, antes, pairavam apenas antipatias plausíveis. Os passageiros da escalada, agora ameaçada de virar tragédia, começam a contar com o troca-troca de líderes da patética excursão. Mas a solução não está em nomes novos para enfrentar um problema gigante. Está, sim, em ideias novas, “fora da caixa”, capazes de lidar com um problema cuja solução não está em nenhum livro-texto, dado que uma COVID desse quilate nunca existiu antes.

(*) Paulo Rabello produziu, recentemente, um Programa de Retomada Consciente, com recomendações sobre como agir numa avalanche da economia.

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