Há cerca de 10 anos, decidi parar de comer carne. Antes disso, acreditava ser impossível fazê-lo, mesmo tendo o desejo, pois me comprazia muito com seus sabores e texturas. Depois de assistir a uma matança de animais pela TV, acordei com uma sensação que já vinha há muito tempo cultivando. Adotei em minha dieta apenas os peixes e frutos do mar, pois não consegui me livrar de minha tendência animal por completo.
Confesso que há situações em que não consigo escapar de colocar um pedaço de carne na boca e elas surgem não por falta de resistência à tentação degustativa. São cada vez mais raras, pois cada vez mais as pessoas com quem convivo tomam conhecimento de minha dieta. Fato é que quando vou à casa de alguém pela primeira vez e me deparo com um prato feito especialmente para mim à base de carne, acabo aceitando a homenagem (principalmente se for a única opção do cardápio). Não me sinto bem em deixar anfitriões constrangidos.
Ouvi certa vez um vegetariano dizer que não há nada neste mundo que o faça fugir de seus princípios e como princípios ele engloba sua dieta. Até mesmo quando esteve muito doente, ao saber que ingerir proteína animal em maior quantidade ajudaria a recuperar-se, preferiu correr risco de morte a ceder às prescrições médicas que incluíam carne em sua dieta.
Sempre que ouço alguém dizer que faz isso ou aquilo por princípios me lembro desse homem. Muita gente acredita que o que ingerimos, ou seja, o que entra por nossa boca, diz muito sobre quem somos e, certamente, muitas vezes é verdade. Mas prefiro dizer que o que falamos, ou seja, o que sai de nossa boca, e como agimos tem mais condições de atestar nosso caráter e nossa índole.
De que adianta ter uma dieta ideal se nos mantemos preconceituosos, racistas, xenofóbicos, discriminatórios, desrespeitosos com quem é diferente da gente, se menosprezamos os pobres e analfabetos e privilegiamos os mais abastados? Não estariam nessas condições princípios (ou a falta deles) de maior valor se quisermos realmente nos tornar pessoas melhores?
Nunca fumei, nem sequer tive vontade na minha adolescência, na década de 1970, quando um cigarro aceso entre os dedos era sinal de maturidade, principalmente se escondido. Mas não tenho o direito de julgar quem fuma como sendo mais descontrolado ou vulnerável que eu. Existem vícios piores que talvez me acometam.
Já se perguntou para que fins servem seus princípios? Nada melhor que adotarmos como princípio básico para nos reger a vida o desejo de sermos melhores que fomos e não os melhores entre todos. Refazer nossos conceitos a todo instante, com base não apenas em nossas vivências, mas também nas experiências dos outros, nos aproximam mais da realidade, assim como de atitudes construtivas.