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Estado de Minas ENTRE LINHAS

As mil e uma noites no poder e o governo mal administrado por Bolsonaro

Presidente comemora fase de sua gestão sem muita pompa, afinal são 600 mil mortes pelo novo coronavírus


28/09/2021 04:00 - atualizado 28/09/2021 07:19

Bolsonaro reuniu ministros e outros autoridades para discursar no Palácio do Planalto
Bolsonaro reuniu ministros e outros autoridades para discursar no Palácio do Planalto (foto: Marcos Corrêa/PR)
Os mil dias do governo Bolsonaro foram comemorados pelo governo sem muita pompa, não houve nenhuma entrega espetacular para marcar a data. Afinal, são 600 mil mortes por COVID-19, 14 milhões de desempregados e 35 milhões de brasileiros na miséria. “Nada não está tão ruim que não possa piorar”, disse o presidente Jair Bolsonaro, agourento, durante a efeméride no Palácio do Planalto.

Diante de ministros e parlamentares, arrematou: ''Alguém acha que eu não queria a gasolina a R$ 4? Ou menos? O dólar R$ 4,50 ou menos? Não é maldade da nossa parte. É uma realidade. E tem um ditado que diz: 'Nada não está tão ruim que não possa piorar'. Nós não queremos isso.'''

Lembrei-me de uma passagem de um clássico da literatura universal, ''As Mil e Uma Noites'' (Editora Brasiliense), uma coletânea de histórias de origem persa narradas por sua principal personagem, a princesa árabe Xerazade, esposa do rei Xariar. ''Você vai morrer!'', disse o monarca, ''você morreria nem se fosse apenas para eu ouvir sua cabeça falar depois de separada do corpo''.

Suspeito de espionar, o médico Dubane fora condenado à morte, porém, antes da execução, desafiou o monarca a ler um livro que faria sua cabeça decapitada falar. O rei caiu na armadilha e começou a ler as páginas do livro, molhando o dedo na própria saliva para separá-las. A cabeça amaldiçoada esperou o veneno fazer efeito e, antes do rei o morrer, declamou:

Eles julgaram a seu modo
E se acumpliciaram nesse trabalho
Dentro em pouco, seu poder parecerá que
nunca existiu
Poderiam ter permanecidos justos e puros
mas abusaram do poder
e o mundo por seu turno os oprimiu
assim como a adversidade e a provação
Ei-los vivendo na miséria. Seu presente
É tão-somente o fruto do seu passado.
Quem censurará o mundo
Por tratá-los assim.

O poema ajuda a entender a derrocada de governos, regimes e até civilizações. Não é o caso ainda do governo Bolsonaro, ao completar mil dias, mas é o seu rumo atual. Na última sexta-feira, o preço médio da gasolina era R$ 6,09, mesmo subsidiada pela Petrobras; nesta segunda, o dólar estava cotado a R$ 5,37.

O imperador brasileiro dom Pedro II soube bem o que é isso. Foi o primeiro a traduzir diretamente ''As Mil e Uma Noites'' para o português, com rigor raro para a época. Aos 62 anos, pouco antes da abolição e da proclamação da República, começou o trabalho; o último registro de texto traduzido é de novembro de 1891, um mês antes de sua morte em Paris, no exílio. Não conseguiu concluir a obra.

Ao passado

Entretanto, ninguém pense que Bolsonaro está jogando a toalha. Apesar das dificuldades eleitorais, não se sente estrategicamente derrotado.

O seu discurso de ontem, ao se referir à facada que levou na campanha de 2018, constrói um cenário imaginário no qual a eventual vitória de seu adversário principal nas eleições de 2018, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT), faria com que a situação fosse muito pior: “É só imaginar quem estaria no meu lugar.

O perfil dessa pessoa, o seu alinhamento com outros países do mundo, em especial, aqui na América do Sul, onde nós estaríamos agora?", indagou. Obviamente, a comparação é com a Venezuela: ''Você já sabe qual o filme do futuro porque você viveu 14 anos passados esse filme. E pode ter certeza, não serão apenas mais 14 anos. Serão no mínimo 50. É isso que queremos para a nossa pátria?''

Bolsonaro administra mal o próprio tempo, o recurso mais escasso de seu mandato. Governa para os seus, olhando sempre para trás. Constrói um cenário político que lembra um pouco a disputa de 1950, na qual Getúlio Vargas voltou à Presidência pelo voto.

Naquela campanha, o líder da UDN Carlos Lacerda, que mais tarde seria governador da antiga Guanabara, dizia que Vargas não poderia ser candidato, se fosse candidato, não deveria ganhar; se ganhasse, não deveria tomar posse; se tomasse posse, deveria ser derrubado.

Lacerda foi um opositor implacável, mas sofreu um atentado, na Rua Tonelero, em Copacabana, onde morava, sendo ferido na perna. No episódio, morreu o major Rubens Vaz, seu amigo, que cuidava da sua segurança.

O envolvimento no crime de Gregório Fortunato, chefe da segurança pessoal do presidente, e de Benjamin Vargas, seu irmão, encurralou e levou Vargas ao suicídio, em 24 de agosto de 1954. A analogia serve para mostrar que a atual polarização política não se resolverá na eleição. Deixou de ser eleitoral, é mais profunda e, tudo indica, veio para ficar.



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