A proposta de reforma administrativa entregue ontem ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro é a maior mudança na estrutura administrativa do país já proposta num ambiente de liberdade. As grandes reformas administrativas anteriores ocorreram durante o Estado Novo e o regime militar.
Mesmo no governo de Fernando Henrique Cardoso, que fez uma grande reforma patrimonial, a reforma administrativa não teve a mesma ambição. Por mais que haja entendimento entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), será muito difícil a conclusão da reforma ainda neste ano, pois serão necessárias três emendas constitucionais.
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Projeto polêmico para a Amazônia faz general deixar o governoBolsonaro quer ser um motociclista nas eleiçõesO que há na mente reacionária dos políticosPresidente do STF no pelourinhoDecisão do STF foi doutrinária, mas contaminada pelo caso de LulaSão três propostas básicas: PEC do Pacto Federativo, que dá mais recursos e autonomia financeira para estados e municípios; PEC Emergencial, que cria mecanismos emergenciais de controle de despesas públicas para União, estados e municípios; e a PEC dos Fundos Públicos, que extingue a maior parte dos 281 fundos públicos e permite o uso de recursos para pagamento da dívida pública.
A ideia de estabelecer mecanismos de controle da dívida pública de estados e municípios e dar a eles mais autonomia para aplicação dos recursos tem ampla aceitação no Congresso, mas envolve muitos interesses corporativos e cartoriais, que tendem a se mobilizar durante a discussão das propostas.
Uma das principais medidas é a alteração no processo de distribuição dos recursos do pré-sal, o que resultará na distribuição, aos estados e municípios, de R$ 400 bilhões a mais em 15 anos. A expectativa do governo é de que esses repasses, nos próximos anos, encerrem a disputa judicial sobre a Lei Kandir entre os estados e a União. O governo federal não pagou as compensações por perdas nos últimos anos com a desoneração das exportações.
A PEC do Pacto Federativo prevê a criação de um Conselho Fiscal da República, que se reunirá a cada três meses para avaliar a situação fiscal da União, estados e municípios. Participam do conselho: Presidência da República, Câmara, Senado, Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal de Contas da União (TCU), governadores e prefeitos. A proposta é polêmica, teria o objetivo de padronizar os mecanismos de controle fiscal em todo o país. O pacote também extingue o Plano Plurianual (PPA); limita a criação de despesas por leis e decisões judiciais à previsão orçamentária; e reavalia benefícios tributários a cada 4 anos, limitando-os a 2% do PIB a partir de 2026.
Emergência fiscal
O pacote também acaba com a “securitização” pela União de dividas de estados e municípios. A partir de 2026, a União só será fiadora (concederá garantias) a empréstimos de estados e municípios com organismos internacionais, e não mais com os bancos, que terão que correr mais riscos. Estados e municípios, porém, serão compensados pela transferência de royalties e participações especiais do pré-sal. Além disso, passarão a receber toda a arrecadação de salário-educação e a definir o uso dos recursos. Com isso, os gastos mínimos em educação e saúde serão geridos pelos entes federados, que poderão compensar o gasto de uma área na outra, de acordo com suas necessidades.
Uma das medidas mais polêmicas é o Estado de Emergência Fiscal, que desindexa despesas obrigatórias e estabelecerá mecanismos automáticos de redução de gastos, inclusive redução de salários de servidores, em até 25%, proposta que deve provocar grande reação do funcionalismo público.
As despesas obrigatórias serão desindexadas em casos de emergência fiscal, mas estarão garantidos os reajustes dos benefícios previdenciários e do BPC (Benefício de Prestação Continuada), de um salário mínimo, para idosos e pessoas com deficiência. Na emergência fiscal, o Congresso Nacional vai autorizar o “desenquadramento” da Regra de Ouro no caso da União, e, nos estados, quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.
A proposta de Paulo Guedes é uma resposta aos questionamentos feitos no Congresso, após a aprovação da reforma da Previdência, no sentido da adoção de medidas para retomada efetiva do crescimento. Transfere para estados e municípios a responsabilidade principal pelas políticas sociais e foca a ação do governo na gestão da economia.