Jornal Estado de Minas

coluna do jaeci

Números inimagináveis e indecentes para um mundo de fome

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Há tempos o futebol virou comércio e algo até sob suspeita. Resultados manipulados, árbitros comprados, como o tal Edílson Pereira de Carvalho, que confessou esquema fraudulento em 2005. Corrupção entre dirigentes da Fifa, no escândalo Fifagate, que gerou a prisão de vários deles, e a morte de alguns. Um mundo nebuloso, vergonhoso e tenebroso. Sabemos que no futebol os bilhões de dólares correm soltos e que onde há muito dinheiro sempre há corrupção, infelizmente. Porém, estamos todos assustados com as cifras que o mundo árabe está oferecendo para jogadores veteranos, como CR7, Benzema, Kanté, Roberto Firmino e tantos outros, que vão transformar o futebol daquele país em um grande espetáculo. Claro que não será competitivo, pois os jogadores citados estão em fim de carreira, mas será uma atração para um povo que viveu sob o regime da chibata durante séculos e que hoje pode respirar um pouco mais. Quando estive em Ryad, pela primeira vez, em 1997, as mulheres andavam nas caçambas das caminhonetes e não tinham permissão para dirigir. Hoje, são vistas ao volante dos carros. Lá era o lugar mais fechado do Islã, mas parece que já há uma boa abertura, principalmente pelo fato de os árabes desejarem fazer a Copa do Mundo de 2034, pois no Catar o evento foi um grande sucesso.



Os jogadores sempre ganharam bem e tiveram salários que nós, pobres mortais, jamais alcançaríamos. Alegam sempre que a carreira é curta e que precisam fazer a independência financeira, mas os números atuais são totalmente inimagináveis e fora da realidade do mundo, onde mais de 1 bilhão de pessoas passam fome. Você perceber que um jogador pode ganhar até R$ 1 bilhão por temporada, caso de Cristiano Ronaldo, é imoral, indecente e desumano. Não me importa se ele é estrela, se é desejado, ou se o dinheiro jorra como petróleo por aquelas bandas. A verdade é que isso é inadmissível. Um cientista, que estuda dia e noite, procurando cura para doenças, ganha no máximo R$ 50 mil por mês. Um cara que entra em campo, corre atrás de uma bola, ganha “1 trilhão” de vezes mais. Outro dia um ex-jogador disse: “um cientista, um médico, um engenheiro, um CEO, não enchem um estádio com 100 mil pessoas, como fazemos”. Enche porque os torcedores são bobos. Alguns deixam de comer para pagar o ingresso e ver sua equipe jogar, enriquecendo ainda mais os atletas.

Uma cientista, que ajudou na confecção da vacina contra a COVID-19, foi aplaudida de pé ao assistir a uma partida de tênis em Wimbledon. Garanto que essas palmas valeram mais que qualquer dinheiro do mundo, mas isso não enche barriga. Fosse ela premiada com a fortuna que esses jogadores ganham e eu aplaudiria. Temos que perceber também que é difícil para um cara que sai da favela, onde não teve estudo, educação e berço, entender a importância de um cientista. Para o tal atleta que falou que enche um estádio com 100 mil pessoas, isso é o que é mais importante na vida. Ele não se importa se o cientista, que salvou milhões de vidas, ganha pouco. No seu mundo, bem pequeno, ele é o maioral. Vejam os péssimos exemplos que vieram à tona ultimamente. Robinho foi condenado a nove anos de cadeia, por estupro, na Itália. Daniel Alves está em vias de pegar mais de 10 anos de cadeia na Espanha, também por ser acusado de estupro. São casos e mais casos desse tipo, que ficavam encobertos no passado, e que hoje se tornam públicos. Os caras têm muito dinheiro. Saem do zero ao 100 mais rapidamente que uma Ferrari, e não têm a menor estrutura para tal. Não se educam, não aprendem a cultivar cultura, mesmo vivendo na Europa, com tantas riquezas históricas. Trabalho com o futebol, mas, a cada dia que passa, estou tomando nojo. Confesso a vocês que assim que eu puder eu vou parar. Sou saudosista e tenho como ídolos Zico, Cerezo, Reinaldo, Éder, Joãozinho, Júnior, Nelinho e tantos outros de grande caráter e família. Gente como a gente. Esses caras de hoje não me representam.

Vivemos o mundo do glamour, onde “ter é mais importante do que ser”. Um mundo vazio, onde o dinheiro “compra” quase tudo. Sim, quase tudo, porque berço, educação e caráter, não há bilhões de dólares que compram. O mundo está de cabeça para baixo. Analfabetos criam canais e têm milhões de outros analfabetos e mal-educados a segui-los. Haters (odiosos) infernizam a vida das pessoas, para o seu bel prazer. São fracassados na vida e querem descontar suas frustrações em que trabalha com dignidade. O mundo virtual criou ilusão em subcelebridades, que se acham. E o esporte bretão, sinônimo de diversão, de arte, de genialidade, se deixou corromper por esse mundo tão vazio e cruel. Bilhões de pessoas passam fome, ao passo que jogadores desfilam no verão europeu em iates, jatos e helicópteros, curtindo baladas e mais baladas. Não é que eles não tenham direito a isso, muito pelo contrário. Só acho que os números estão fora da realidade mundial, e o pior é ver o Brasil, de uma economia quebrada, pagar R$ 1 milhão a um jogador ou técnico de futebol. Realmente a humanidade não deu certo. O futebol só é um mundo a parte, na questão salarial. No mais, está inserido numa sociedade podre, egoísta e, acima de tudo, cruel com os menos favorecidos.