Jornal Estado de Minas

ARTES CÊNICAS

Volta ao palco deixa ator com 32 anos de carreira nervoso como principiante

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Renato Milani
Ator

Quando as cortinas se fecharam por causa da pandemia, um medo muito grande tomou conta de mim e de muitos artistas. O medo de não estar mais aqui quando tudo voltasse a acontecer. Me preparei, então, em uma entrega para elaborar novo espetáculo, mesmo sem perspectiva alguma de encená-lo.




Me adaptei a ensaios on-line e, aos poucos, consegui ensaiar presencialmente após tomar as vacinas. Quando ocorreu a abertura dos teatros, meu espetáculo estava pronto para a estreia, que aconteceu no último novembro. Senti o nervosismo de ator em início de carreira.

Embora já sejam 32 anos de teatro profissional, minha impressão era de que o teatro continha algo de novo, algo de inédito naquele momento. Talvez porque as recomendações eram de não me aproximar do público, de evitar as fotos após o espetáculo, de não descer até a plateia em qualquer tipo de quebra da quarta parede. Restrições que não faziam parte do meu modo antigo de relação com o público e me indicavam que o teatro não mais era o mesmo.

Algo mudou. E essa alteração deixa uma pulga incômoda, pois não se sabe se será um aspecto permanente da relação ator/espectador. O fato é que, apesar de todos os pesares, eu estava de volta ao meu ambiente natural, me sentindo mais em casa do que em meu próprio apartamento, mais à vontade dentro do meu personagem do que me sinto às vezes comigo mesmo. Foram poucos dias de uma temporada curta. Vieram dezembro, as festas, as comemorações, a expectativa.



Agora, neste janeiro de um novo ano, não venho só. Trago comigo para os palcos em que estarei até março personagens para falar. Falar de tudo o que quero, pois este é o lugar em que eu, ator, quero me colocar. Falar para as crianças através da direção do “Gato de Botas”, discutir sobre relacionamentos e prazer com “A vovó em: Vamos falar de sexo”, trazer a nostalgia da era de ouro do rádio com “Nas ondas do rádio” e emprestar meu corpo e minha voz para que Shakespeare nos ajude a entender este mundo contemporâneo, mesmo com a escrita de um personagem do século 16.

Subo no palco com “Iago, o elogio da vingança” para questionar o ódio, a violência contra o outro, contra aquilo que é diferente, e para demonstrar que devemos estar atentos a todas as tramas que subterraneamente tentam usurpar nossa liberdade.

Enfim, as cortinas se abrem novamente. No acender das luzes do teatro, se acende também a certeza de que somos suficientemente fortes para enfrentar todas as provações que o mundo diariamente nos oferece. A relação do ator com o seu público é necessidade tão enraizada na experiência humana que nada impedirá que ela se realize eternamente.