Jornal Estado de Minas

PANDEMIA

Dias estranhos ao som de Help!

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Diário da quarentena

Meteoritos pandêmicos

Margarida Soalheiro
atriz 

Perigos:
A rua é perigosa.


As sacolinhas de plástico também.
Toda superfície pode estar contaminada.
Tudo pode estar contaminado por um vírus que ameaça a humanidade.
O medo toma conta do copo de cerveja, do balé sexual, do balão que antes subia e desenhava poesia.
Com tudo isso, há uma campanha verminosa que convida os cristãos a agradecerem a possibilidade que uma pandemia oferece de mirar o seu semelhante com olhos generosos.
Este vírus não traz uma poção mágica com capacidade de transmutar as pessoas.
Essa poção mágica me fisgou há muitos anos, quando a arte me mostrou a magia de conviver com o outro pelos canais da empatia.

Help:
Sim, é help.
Uma sonoridade mais globalizada.


Não. Não pode ser socorro. Não. Tenho pressa de ser ouvida pelo maior número possível de pessoas, porque sinto que me atrasei no tempo, na bússola do verbo to be.
Tantas vezes gritei e grito por socorro...
Ah, infindáveis vezes.
Daí minha garganta seca, fiquei com medo de ficar inaudível de vez.
Me lembrei da música dos Beatles que se chama Help!.
Coloquei pra tocar e comecei a dançar loucamente, embalada por uma droga chamada noticiário.
Meu corpo não suportou o impacto e desfaleci, vindo a óbito na sala de uma família, onde o silêncio era a palavra de ordem quando os conflitos emergiam.
Agora o silêncio é profundo e descansa em paz.



Retração
O corpo vai e volta.
Será que a Lei de Newton não 
funciona mais?
Para cada ação uma reação, não é isso?
Nesse cenário, vejo o contrário: abraço virtual, boteco on-line e o
teatro solitário.
Que puta vontade de subir num palco e abraçar, beijar, correr riscos... Sentir aquele friozinho na barriga.
Doce lembrança , memória emotiva, gosto de jabuticaba na boca.
Sensações sensitivas.
Orgasmos virtuais.
E a água sanitária é pouca pra limpar a sujeira do mundo, dos cofres públicos, das contas fantasmas recheadas de um dinheiro pecaminoso e virulento que fez a dona Esperança perder a esperança desde quando perdeu o filhinho lindo que se chamava Dagmar.