Jornal Estado de Minas

Bloco Raposão, desde sempre um patrimônio cultural dos mineiros

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“A história não mente/jamais vai mudar.” Verso cantando para exaltar o fato de o Cruzeiro jamais ter comprado – com árbitros, federações ou bilionários do Brasil Miséria – nem um naco de sua história. Ao autor, lanço a minha escusa para dizer: a história não mente, mas muitas vezes, pelo caminho, o seu desfecho pode mudar.





Prova maior é a história mais linda do futebol mundial, a do Palestra/Cruzeiro. Não fosse um desvio no rumo da história de Minas Gerais, talvez o nosso time não teria surgido em Belo Horizonte, mas, sim, na periferia de São João del-Rei.

Bruno José, no último domingo, entraria para a história como o autor do primeiro tento do segundo século de vida do Cruzeiro dentro de seus próprios domínios, e não como suposto visitante. “Suposto” porque, corrigindo um lapso, o escrete celeste jamais será visitante em qualquer uma das 853 cidades mineiras. Muito menos, em São João del-Rei, município onde se encontra a Vila do Marçal, o mais injustiçado território da história de Minas Gerais.

Vamos aos fatos. Tudo começa em 1893, quando o então presidente do estado, Afonso Pena, encomenda um estudo técnico sobre as cinco localidades candidatas a nova capital mineira: Curral del-Rei, Barbacena, Juiz de Fora, Paraúna e Várzea do Marçal, essa última zona rural de São João del-Rei.





O relatório do engenheiro Aarão Reis era contundente: Várzea do Marçal, onde desde 1881 se formava uma colônia de imigrantes italianos (viva ao Palestra!), era o local ideal para a construção da nova capital mineira.

Mas aí entram em cena dois atores, que, infelizmente, no Brasil, são capazes de mudar – com conchavos e tramoias – o rumo da história: os políticos e a oligarquia. Mesmo sendo escolhida pelo corpo técnico e vencendo as primeiras rodadas de votação, Várzea do Marçal, aos pés da Serra São José (e não do Curral), banhada pelo Rio das Mortes (e não o Arrudas), teve o seu destino roubado. Curral del-Rei, a futura Belo Horizonte, por politicagem, foi a “escolhida”.

Hoje, a ex-quase capital Várzea (ou Colônia) do Marçal é um bairro periférico de São João del-Rei. Por ela, me permito uma licença poética: não fosse o desvio desonesto na história mineira, caberia à classe trabalhadora de imigrantes italianos e camponeses da Colônia do Marçal o destino de criar um time para chamar de seu. Ali, em São João del-Rei, contra tudo e todos, teria fundado a Società Sportiva Palestra Italia, o amado Cruzeiro Esporte Clube.





Para introduzir outro importante personagem dessa parte roubada da história de Minas Gerais, volto ao domingo passado. Um dia épico, no qual o Cruzeiro foi assistir à festa do seu povo. Um espetáculo executado por milhares de torcedores interioranos, com apoio de grupos como a Associação Grandes Cruzeirenses (AGC), conduzido pelo Reduto Del-Rei Celeste e por um dos maiores patrimônios imateriais dos 101 anos do Palestra/Cruzeiro: o Bloco Raposão.

Toda linha escrita sobre esse ícone da cultura mineira e interiorana deixa meus olhos marejados pelo orgulho por ser, como eles, um torcedor do interior, onde nosso amor é mais difícil, puro, profundo e intenso. O Bloco Raposão talvez seja uma das representações que mais materializem a alcunha de Time do Povo Mineiro. Desde 2013, ele arrasta uma nação carnavalesca pelas ruas tricentenárias de São João del-Rei.

No filme “Em busca da história do Cruzeiro”, obra definitiva sobre os primórdios do Palestra/Cruzeiro, lá está o Bloco Raposão unindo as duas maiores imagens que mais representam Minas Gerais fora do estado: a arquitetura barroca e o manto azul com cinco estrelas brancas soltas.

Quando saem nas ruas de paralelepípedos, é como se o eterno capitão Piazza levantasse uma taça. A bateria evoca a multidão a gritar Cruzeiro como o badalar dos sinos anuncia uma procissão santa.

Por dever de justiça à mineiridade, o Bloco Raposão, filho das redondezas da Várzea do Marçal, a verdadeira nova capital mineira e um dos berços palestrinos, deve ser declarado oficialmente um patrimônio histórico, artístico e cultural de Minas Gerais, esse estado da periferia do Brasil, de alma azul e branca com cinco estrelas a brilhar.




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