Jornal Estado de Minas

FILOSOFIA EXPLICADINHA

Professora assassinada em escola e a vitória da pulsão da morte

 

A vida em sociedade tem uma finalidade principal: controlar nossos ímpetos mais violentos, coibir nosso desejo de eliminar qualquer outro que se coloque à frente da realização de nossos desejos mais obscuros. A ideia de que a sociedade é um lugar para nos proporcionar felicidade é apenas uma ilusão construída pelos bonzinhos da esquerda, geralmente gente que recebe mais de dez salários-mínimos, faz pesquisa-sanduíche com financiamento público enquanto comemora sua filiação em algum partido de natureza populista apenas para suprimir um pouco da culpa que pesa em sua consciência social.





 

Este é um dos grandes erros da esquerda acadêmica. Sua vocação rousseauniana, na perspectiva do bom-selvagem, imagina um ser humano que só precisa de incentivos pedagógicos justos para que seu lado bonzinho floresça, tal qual margarida no jardim. No espectro político, essa ideologia é uma espécie de coaching de psicologia positiva. É muito iluminismo para o século XXI. 

Não é à toa que Freud é hobbesiano. Conhecedor profundo da alma humana, deu clareza para os ímpetos mais lascivos e mortíferos que constituem o sujeito. Se convivemos em sociedade é porque aprendemos, ao longo do tempo, que a guerra de todos contra todos não traz benefícios individuais e que mesmo o mais forte uma hora vai dormir e, por isso, os mais fracos terão a oportunidade de eliminá-lo. Reside aí o benefício da vida social: evitar a morte violenta. O contrato social só é viável quando temos a certeza de que estamos renunciando ao nosso desejo por algo que trará maior benefício, para nós e para nossa família, ou pelo simples medo de sofrer as consequências de uma ação que desafie o contrato social.

 

Nesse cenário, a escola tem um papel fundamental no controle dos ímpetos destrutivos e não pode ser reduzida, como apregoam alguns pais e pedagogos, a um espaço de entretenimento e prazer ilimitado. É preciso resgatar o papel moral, a finalidade social e o controle que toda educação exerce sob o indivíduo, pois o espaço escolar é o lugar da norma, da lei e da construção ética de cada sujeito. Em outras palavras, antes de preparar o indivíduo para a sociedade, a escola deve se especializar em proteger a sociedade da chegada de novos indivíduos violentos, que ainda não aprenderam a canalizar a pulsão de morte, elemento natural de toda pessoa humana.  O processo formativo funciona em uma série de estruturações de "sim" e "não" que toda pessoa necessita ao longo da vida: devo respeitar as leis de trânsito, não devo sacanear meu colega, posso ajudar a quem precisa, não devo xingar meu chefe e por aí vai...





 

Não quero ser um profeta do apocalipse - apesar de acreditar que todo otimista é alguém que leu pouco - mas a situação tende a piorar enquanto não entendermos que a escola é, antes de tudo, um lugar para a formação moral do sujeito e não apenas lócus para testagem de QI. As frustações no ambiente escolar, as negativas dos desejos individuais frente à vida coletiva e o corte necessário entre espaço familiar e vida pública são esforços que toda criança deve travar na solidão de sua subjetividade. Alguns aprenderão pela moral, outros se orientarão pelo medo da lei, é assim desde que o mundo é mundo.

 

É um erro acreditar que o progresso moral acompanhará, necessariamente, o avanço tecnológico. Toda ação de ontem, que culminou na morte da professora em pleno exercício de trabalho, foi amplamente divulgada nas redes sociais, com pleno conhecimento de muitos colegas e, ainda, incentivado por parte dos espectadores dessa terra-sem-lei chamada de “comunicação em rede”. Cenas como essas continuarão acontecendo enquanto não acreditarmos que os indivíduos de nosso século precisam mais de ética do que de técnica. No entanto, alguns não conseguirão agir pelo benefício da vida civilizada, para essas pessoas a moral não dará conta. Nesses casos, apenas o medo da lei é capaz de segurar. É assim desde que o mundo é mundo: para males extremos, remédios extremos