Jornal Estado de Minas

CÍNTIA CHAGAS

Cada um no seu quadrado

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“Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Com tal dizer bíblico, inicio este artigo sobre a cansativa e desnecessária briga existente entre professores de português e sociolinguistas. Se você não sabe, leitor, existe um grupo de pessoas que, há tempos, luta para levar, às salas de aula das escolas, teorias segundo as quais dizer “nós pesca o peixe”, por exemplo, estaria correto, corretíssimo. Um absurdo que tentarei, em poucas linhas, explicar.


 
Já imaginou? O seu filho volta da escola e diz: “Papai, nós vai jogar bola?”. Você, boquiaberto, questiona onde ele aprendeu a falar assim. E ouve, perplexo, a resposta: “Na escola, na aula de português”. Pois é... De acordo com a sociolinguística, disciplina estudada nas faculdades de Letras, não haveria o certo e o errado no português. Existiria, na realidade, o adequado e o inadequado, a partir do contexto. Um verdadeiro samba do crioulo doido! E ai de você quando disser que “menas” está errado. Imediatamente, os sociolinguistas, inquisitórios, redarguirão: “Seu preconceituoso! Isso é preconceito linguístico!”
 
Ora, quanta bobagem! Tentam diminuir o valor da norma culta em nome dos desassistidos, dos que não tiveram acesso a ela. Todavia, o aprendizado da norma padrão consiste na única saída para os que querem, por meio do intelecto, vencer na vida. Como interpretar e elaborar pensamentos mais sofisticados sem dominar as regras da própria língua? Como compreender Machado de Assis, Aristóteles e afins? A linguagem do povo simplesmente não carrega envergadura gramatical para isso. Aliás, retirar das pessoas o ensino profundo e sistemático da norma culta é o mesmo que as excluir, que retirar delas a chance de progresso.
 
Mais uma vez, leitor, as questões ideológicas insistem em esbofetear a gramática, que, na realidade, nunca foi a vilã, mas a salvadora. Seria, então, mais inteligente se os sociolinguistas investissem o tempo gasto em mestrados e em doutorados (que, na maioria das vezes, só servem para eles mesmos, como uma espécie de masturbação intelectual encontrada em diversas áreas) na solução da desigualdade escolar. Indubitavelmente, teríamos bastantes ganhos. Mas, como isso não acontecerá, seria mais saudável se cada um ficasse no seu quadrado, sem atritos, como Jesus sugeriu em “Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Ou seja: os sociolinguistas, juntamente às suas respectivas teorias, deveriam permanecer onde estão, nas faculdades; nós, meros professores de português, onde fazemos substancial diferença, nas escolas. E ponto final.