“Meu marido se separou de mim dizendo não mais me amar. Não consigo esquecê-lo nem deixar de amá-lo.
Isso me pôs num sofrimento sem fim. O que fazer?” - Joana, de Belo Horizonte
A mãe toda esperançosa saiu correndo para cumprir a exigência de Buda. Depois de uma procura exaustiva por muito tempo e não encontrando uma única casa que não tivesse sido visitada pela morte, ela retornou à presença do iluminado e disse: - Meu grande mestre, agora entendo que não é possível a ninguém escapar do seu destino humano. Sei que não podes ressuscitar meu filho, mas ajude-me a ressuscitar meu coração.?
Todos nós temos muita dificuldade em lidar com as perdas, separações e com a morte. Na tentativa de negá-las, idealizamos uma vida para nós onde elas não existirão. E, quando, mercê da realidade universal, nos deparamos com uma perda indesejada, ficamos completamente perdidos, sem saber o que fazer. Em vez de gastar nossas energias e nossa experiência para superar as dores inevitáveis da perda, as gastamos na tentativa de reverter a situação e controlar aqueles que provocaram o fato. Diante da decisão de alguém se separar de nós, é justo e sábio que tentemos entender o porquê do seu desejo e procuremos caminhos que possam reconstruir a relação, evitando o gesto final.
Esgotados todos os esforços, após um certo período de tempo temos de encarar a realidade e mudar a estratégia de vida. Já não mais podemos permanecer no desejo obsessivo da volta, usando como arma o sofrimento, o desespero, a sensação de injustiçados. Chegou a hora de mudar de problema. A questão não é mais a separação, e sim o sofrimento emocional ao qual estamos grudados.
Há momentos na vida em que é preciso ter a humildade de "jogar a toalha". Perdi a luta, agora é levantar. Saber lidar com as perdas na vida não é ser indiferente e anestesiar-se para não sofrer. É apenas saber que todo sofrimento humano, assim como tudo, é um processo que tem início, meio e fim. Fazer da dor um ponto de chegada, transformar a dor em um jeito de viver, prolongá-la indefinidamente, não fazer nenhum esforço deliberado para ir adiante é o que nos ensinaram e que temos de desaprender se queremos ser felizes. Para isso, duas coisas são fundamentais: primeiro, aumentar a consciência da inevitabilidade das perdas. A vida é assim.
Segundo, querer, de verdade, sair do sofrimento. Há algum tempo, uma amiga me procurou com o mesmo problema da leitora acima. O marido tinha se separado dela contra a sua vontade. Ela estava desesperada, com raiva, noites maldormidas, total sofrimento. Ela insistia que ainda o amava, que nunca deixaria de querê-lo, que não conseguia esquecê-lo. Eu lhe perguntei: - Mas você quer deixar de amá-lo? Ela respondeu prontamente: "Não!".
Mesmo no auge do sofrimento, mesmo tendo ouvido dele que não mais a amava, mesmo depois de ele ter demonstrado com fatos que não voltaria, mesmo já tendo passado uns três meses, ela não queria deixar de amá-lo.
Uma coisa é não conseguir, outra coisa é não querer. Quando uma pessoa diz: não consigo esquecer, não consigo deixar de amar, normalmente, esconde com isso o fato de não querer. O medo de cair no vazio, na insegurança, pode nos levar a apegar em imagens de pessoas ou coisas que já acabaram. Ainda que o preço a pagar seja um sofrimento sem fim, uma acomodação vital e um atraso no crescimento. Quando queremos deixar de amar alguém, mesmo um pouco a contragosto, nos esforçamos em ações que nos ajudarão nesse propósito: visitar os amigos, sair para nos divertir, desenvolver exercícios físicos, entrar em contato com novas pessoas, viajar em grupo, etc.
Não podemos negar o luto das nossas perdas, mas também não podemos permanecer muito tempo no luto. Como diria uma amiga minha: "Sair do luto para a luta".