"Gostaria que o senhor falasse um pouco sobre a necessidade atual que as pessoas têm de buscar cada vez mais bens materiais, de chegar sempre ao posto mais alto da empresa, de ter ido aos lugares mais interessantes do mundo, de frequentar somente restaurantes caros, de ter o carro mais novo do mercado..." - Andréa, de Belo Horizonte
Todo sofrimento psicológico é fruto de um conflito interno. Lados opostos brigando dentro de nós e criando desequilíbrios emocionais. Gostamos de dividir o mundo, as coisas e as pessoas em categorias que se opõem: bom e mau, certo ou errado, vida pessoal ou vida profissional, materialista ou espiritualista. Estamos sempre optando entre uma coisa e outra, o que nos traz muita ansiedade e angústia. A procura da inteireza, da conciliação entre os opostos, da ausência de luta interna é a mesma procura da paz, do amor e da felicidade. Os antigos místicos diziam que a virtude está no meio, indicando que o esforço do homem tem de se concentrar no equilíbrio.
Todo excesso prejudica, seja para um lado ou para outro. Esse dilema proposto de sermos OU materialista OU espiritualista é falso.
Voltando à questão levantada pela leitora.
Aspirar aos bens materiais, ao conforto de um bom carro, às promoções profissionais, a passeios pelo mundo é uma forma de testemunharmos o desenvolvimento do nosso lado material e social.
O importante é que esse esforço de ascensão social esteja também ligado ao desenvolvimento de outros valores que dizem a respeito a outras dimensões de vida humana, como o desenvolvimento psicológico, espiritual, do amor, da solidariedade, da alegria etc. A figura do rio talvez seja uma boa metáfora para ilustrar essa unidade dos vários aspectos de vida. As margens são o lado material e a água é o lado espiritual. Um não existe sem o outro.
Por outro lado, a leitora não deixa de ter razão em um aspecto. Nosso sistema social e econômico sempre privilegiou a quantidade em detrimento da qualidade. Isso gerou em nós uma procura excessiva pela posse dos bens materiais, como se isso garantisse necessariamente a felicidade. A raiz de nossos sofrimentos é o apego. E o apego é fruto da mentalidade possessiva, de acumulação e de ganância. É, sobretudo, o medo de perder. Quando agarramos demais surge o pavor de perder aquilo que temos.
O desapego, por outro lado, não é não possuir. É apenas saber que tudo é transitório.
Alcançar esse equilíbrio é nosso grande desafio. Aqui corremos dois perigos: o primeiro é desenvolver a ganância, fazendo com que o dinheiro nos possua e nos escravize, querendo sempre mais e mais e provocando intensos sofrimentos emocionais, através da ansiedade, na medida em que nunca nos satisfazemos e tentamos preencher nossos vazios interiores com as posses materiais.
O outro perigo é, em nome da espiritualidade, esquecer nosso crescimento material, incluindo aqui o cuidado com o corpo, com o desenvolvimento social e profissional, criando também ansiedades e acomodação. A palavra-chave é o equilíbrio. Temos a obrigação de batalhar tanto o sucesso pessoal (paz interior, esperança e harmonia) quanto o sucesso social. O casamento das duas dimensões é que favorece uma vida rica em todos os sentidos.
O que é, porém, equilíbrio? Equilíbrio, em todos os aspectos da nossa vida, é como caminhar numa corda bamba.