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Pandemia fere o governo e desnuda a austeridade fiscal que sangra o país e mantém privilégios

A conta que mais importa aos gestores da combalida saúde no país é quando se alcançará o pico de pacientes necessitados de UTI


postado em 22/03/2020 06:00 / atualizado em 22/03/2020 12:19

(foto: Rodrigo Buendia/AFP)
(foto: Rodrigo Buendia/AFP)

A pandemia da COVID-19 já está disseminada no Brasil e a conta que mais importa a esta altura aos gestores da combalida saúde no país é quando se alcançará o pico de pacientes necessitados de UTI e se haverá leitos suficientes para recebê-los – condição para a taxa de sobrevivência, que, por sua vez, corresponde à eficácia e extensão das ações de isolamento social, seja voluntário ou compulsório.

A taxa de sobreviventes entre enfermos graves foi alta na China, onde o surto começou oficialmente no fim do ano passado e aparenta estar em regressão, mantém-se elevada em Taiwan e Singapura, onde não há registro de morte devido à contaminação do vírus até agora, mas continua baixíssima na Itália, assim como na Espanha e França, e não há ideia sobre como será nos EUA. Aqui, apesar do otimismo de vitrine dos governantes, teme-se pelo que poderá vir a ser.

A questão chave, por mais grave que seja o impacto sobre as contas públicas e a atividade empresarial, é a quarentena pelo tempo que ela se faça necessária a fim de retardar o ritmo da infestação e permitir o atendimento em UTIs sem colapsar a rede hospitalar, em especial a do SUS, e os convênios com hospitais privados.

Ao longo desse tempo, espera-se que aumente a parcela da população assintomática ao vírus, a faixa vulnerável seja atendida como deve e, eventualmente, surja uma medicação exitosa (várias já estão em protocolo de pesquisas nos EUA, Inglaterra, China, Israel, mesmo aqui). O sucesso, se é que se pode usar a palavra, depende de uma forte coordenação de governo e coesão social e empresarial. Mas...

Tal como na Itália, as autoridades brasileiras de saúde demoraram a agir e o presidente Jair Bolsonaro relutou em admitir a gravidade da pandemia, tratando-a como “histerismo da imprensa mundial” e, ao gosto de seus apoiadores extremados das redes sociais, falando de nebulosas conspirações contra seu governo, repetindo reação inicial de Donald Trump, que concorre à reeleição em novembro.

Trump mudou a sua versão ao sacar que seria tragado por um evento maior do que a saúde dos EUA, como a de qualquer país rico e pobre está preparada para enfrentar. Era a senha para Bolsonaro abraçar a emergência e assumir a liderança da ação, mas preferiu abraçar seus apoiadores no domingo passado numa manifestação de inconsequentes.Prioridade é salvar vidas  Recém-chegado de uma viagem à Flórida para se encontrar com Trump, Bolsonaro trouxe na comitiva que o acompanhou mais de duas dezenas de contaminados no voo de volta. Brasília é hoje a região do país com maior incidência de coronavírus por 100 mil habitantes, medido pelo número de dias a partir do primeiro caso comprovado.

Era para ele ter dado prioridade absoluta aos eventos já acionados pelo ministro Luiz Henrique Mandetta. Titubeou, alternando anúncios de medidas com ataques à imprensa e críticas aos governadores que, a seu ver, vão deprimir a economia ao decretar suspensão de atividades nas empresas, escolas, bares, restaurantes, restringir transportes urbanos, tudo visando o isolamento por ora ainda não compulsório.

São medidas fortes, adotadas em várias partes do mundo e que estão sendo seguidas nos EUA, sem ainda chancela federal, pelos governos de estados como Califórnia e Nova York. E o que não se deve ignorar como ainda se ignora no governo: medidas excepcionais exigem ações também excepcionais. Não cabe preocupação com meta de resultado fiscal e teto de gasto. Cabe, apenas, salvar vidas.Políticas sem parcimônia

A salvação de vidas e de empresas e empregos é a prioridade que se impõe com munição de grosso calibre. O Fed dobrou seu balanço para quase US$ 40 trilhões de liquidez potencial em 10 dias, numa ação articulada com seus pares da Europa, Inglaterra, Suíça, Canadá e Japão, e abriu a bancos centrais dos emergentes, entre eles o nosso BC, linhas de crédito ilimitadas. Tudo para manter o oxigênio das tesourarias nacionais e dos mercados de moedas.

Foi isso, mais que as intervenções diárias do BC brasileiro, que deu fôlego ao real, a moeda mais desvalorizada do mundo este ano, e esfriou por ora a fabulosa queima de ativos negociados em bolsa, como ações, títulos de dívida e commodities, sobretudo o petróleo (vítima de uma disputa entre a Arábia Saudita e Rússia em torno da estratégia para fixar preço, que adicionou instabilidade).

No campo das relações empresariais e trabalhistas, também não tem havido parcimônia. Governos da França, Alemanha e EUA garantiram a renda de trabalhadores autônomos e parte ou toda a folha de salário de empregadores privados. Como fica a situação fiscal, segundo tais governos, é assunto para depois. Esse depois merece atenção.Austeridade do ancien régime

Antes da pandemia já ia longe a discussão nos EUA e Europa sobre os fundamentos da macroeconomia ancorados em austeridade fiscal num mundo sem juros e sem inflação. Este debate entrou no Brasil pelo economista André Lara Resende e tem sido frequente neste espaço.

A macroeconomia que tende a emergir depois da pandemia seguramente será outra. Mas aqui antes tem de haver acordo sobre o que se quer com teto de gasto público e lei de responsabilidade fiscal: ou só cortar gasto, em geral dos dinheiros aos mais pobres, ou acabar com privilégios de nosso ancien régime – os funcionários de elite do Executivo, do Judiciário e do Congresso (além de seus equivalentes nos governos regionais). É com eles, mais desonerações de impostos e investimentos em obras mal concebidas, que se faz o desperdício.

Rever esse cipoal de gastos ociosos e ineptos é o sentido que se deve dar ao conceito de austeridade fiscal, que nada tem a ver com operação combinada de emissão monetária e de dívida entre o BC e o Tesouro. Isso é o que se fez na década de 1930 nos EUA, fez-se na grande crise de 2008 e continua se fazendo. Aqui, a teoria é outra – não atende as prioridades e desvia a atenção do popular.

>>E-mail para esta coluna: machado@cidadebiz.com.br
 

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