Jornal Estado de Minas

ANNA MARINA

Queda e coice existem mesmo: depois que caí, não posso mais dirigir


 
Leitores habituais da coluna já devem saber de cor como caí na rua e quebrei a coluna, que teve que ser operada com um parafuso de cimento para melhorar meu estado geral. Consegui, ao longo deste mais de um ano,  um bom retorno ao normal, mas continuo com o equilíbrio meio detonado. E com a recomendação médica de não guiar.




 
Deixar o carro de lado, logo eu que faço do carro meu servidor mais próximo. Nossa relação começou quando eu, sem carro, resolvi aprender a dirigir. As escolas de direção da época ensinavam usando um jipe para lá de detonado, a mudança da marcha ficava numa peça de lado, vinda do chão. Era um terror só, e o local de treinamento era na Praça da Assembleia, totalmente vazia, nem a igreja existia. Chegar lá era um tormento, mas eu ia firme e forte – queria aprender. Mesmo sem ter carro.
 
Um belo dia saí de férias e, quando voltei, tive uma boa surpresa: podia comprar um carro em módicas prestações, que eram financiadas pelo Banco Nacional. Acontece que Moacir Carvalho de Oliveira era diretor da Volks na cidade e tinha resolvido abrir um financiamento do carro para jornalistas. Eu estava fora, mas naquele tempo a redação do jornal era como uma família: todos se conheciam, se frequentavam e meu nome foi colocado na lista dos que queriam ter um carro.
 
E para ter o carro, era preciso ter carteira de trânsito. Eu mal e mal sabia dirigir, mas fui fazer meu exame com um amigo, Hermógenes Ladeira, que na época trabalhava no Detran. É claro que passei, peguei o carro, um Volks azul, e fiquei feliz da vida. Ia para tudo quanto é lado e, como na época trabalhava também na criação do PIC, ia para a Avenida Afonso Pena de carro, que estacionava entre as árvores, que ainda existiam. Parava o carro numa boa. Mas como conseguir sair da vaga dando marcha a ré? Sempre encontrava um motorista gentil, que retirava o carro para mim.




 
Assim fui levando, até que mudei de carro, do Volks para um maior, Parati. Peguei a novidade na distribuidora e fui firme para o trabalho. Devia parar no caminho para comprar alguma coisa. Estacionei o carro novo e como é que conseguia sair? O carro não era automático e o sistema motor, ainda pouco conhecido, não pegava nem a pau. É claro que apareceu logo um senhor bondoso que me ensinou a colocar a ré no carro. Saí feliz e mantive o carro, grande e confortável, por muitos anos.
 
Até que um dia resolvi trocá-lo por um Fiat. Fiz a troca e passei muito tempo penando com um problema que existia com a água do motor, que não funcionava, nem sei bem a razão. O resultado disso é que antes de ligar o carro tinha que balançar um pouco para o sistema funcionar. Penei muito tempo, contei o problema aqui e alguém me ajudou, não me lembro mais quem.
 
De tanto penar com o sistema motor do carro, resolvi partir para um automático – e comprei um francês Citroën, que chegava por aqui importado. Foi a minha salvação e, de carro em carro, cheguei a um Audi, que era o céu. Mas todos os transtornos em direção tinham um resultado mais do que prático – nunca dei uma trombada, até um dia que calculei mal a distância e o para-choque da frente ficou preso em um caminhão parado. O estrago foi mínimo e não significava muito para quem já dirigia há mais de 60 anos.
 
Agora, estou a pé de todo. Não quis contratar motorista, porque tenho a maior aflição de ter uma pessoa me esperando, sem fazer nada. Ando de táxi, e é claro que as surpresas são quase diárias. Mas quando preciso fazer alguma coisa fora de casa, penso logo no carro que está na garagem. Como fui proibida de dirigir, a aflição é dobrada. Não consigo entender como não posso mais dirigir. Mas viver muito traz esses problemas...