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Estado de Minas

Alimentação com menos carne e mais legumes reduz doenças e combate o aquecimento global


03/12/2014 10:00 - atualizado 03/12/2014 10:08

 

Se a humanidade olhar para o que come e como esse alimento é produzido, chegará à conclusão de que não só está morrendo pela boca, mas também matando. Além de estar por trás da epidemia global de obesidade e as várias doenças associadas ao excesso de peso, a indústria de comidas processadas ataca o meio ambiente, respondendo por 25% das emissões de gases do efeito estufa. E a tendência é que esse percentual aumente, alerta um estudo publicado na revista Nature. Para garantir a saúde do corpo e do planeta, sugerem os autores, a saída é adotar dietas mais saudáveis. Uma medida simples, mas que exige sacrifícios.

David Tilman e Michael Clark, ambos pesquisadores da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, preveem um futuro sombrio: se a população mundial não modificar a alimentação, em 2050 a produção de gases que contribuem para o aquecimento global será 80% maior do que agora. Além disso, haverá mais doentes. Para se ter uma ideia, algumas pesquisas estimam que, até 2034, serão 44,1 milhões de diabéticos no mundo, quase o dobro dos pacientes de hoje.

Tilman e Clark concluíram que a adoção de dietas alternativas pode garantir saúde, sustentabilidade e segurança alimentar para uma população que, em 2050, será 36% maior. A tese foi elaborada após os pesquisadores revisarem os resultados de outras dezenas de estudos.

O levantamento permitiu que eles comparassem o impacto da dieta ocidental com o de outras três: a mediterrânea, a pesceteriana e a vegetariana. Os resultados mostram que a opção por uma das práticas alimentares alternativas pode diminuir a incidência de diabetes tipo 2 entre 16% e 41%; a de câncer entre 7% e 13%, e a mortalidade por doenças do coração em 26%. Esses efeitos ocorreriam porque as três dietas incluem mais frutas, legumes e nozes, e excluem ou diminuem carne e alimentos com pouco valor nutricional.

A tendência, entretanto, está na contramão do recomendado. De acordo com os autores, o aumento de renda que se observa no planeta representará um aumento de 15% de calorias totais e 11% de proteína nas refeições. Tilman e Clark estimam que as pessoas consumirão 61% mais calorias vazias, 26% mais carne de porco e de aves, 31% mais carne de ruminantes, 52% mais ovos e laticínios e 82% mais peixes e frutos do mar. Por ouro lado, as porções de frutas e legumes diminuirão em 18%, e as de proteína vegetal, 2,7%.

Para avaliar como as mudanças na mesa influenciam a saúde do planeta, os pesquisadores analisaram dados de levantamentos sobre gases de efeito estufa emitidos ao longo da cadeia de produção de 82 tipos de alimentos. Com isso, fizeram uma previsão dos impactos ambientais para 2050. A conclusão é que as emissões estão fortemente associadas à carne: em média, cada animal de corte e leiteiro produz 57kg de gás metano. Ovinos e caprinos emitem 5kg, enquanto suínos, um.

Populações específicas

Se a proteína animal não fosse uma prioridade da dieta ocidental, a produção total de gases seria reduzida em até 2,6 gigatoneladas, o que corresponde a 60% das emissões projetadas para daqui a 36 anos. Tilman diz que embora muitas pessoas já tenham adotado alguma das três dietas alternativas, populações específicas necessitam de atenção especial. “Crianças e adultos da China, da Índia, do México, da Nigéria e da Tunísia são alvo do aumento de doenças que, por enquanto, não têm grande incidência nos países pobres”, aponta. “As escolhas alimentares que os indivíduos fazem são influenciados por cultura, conhecimento nutricional, preço, disponibilidade, gosto e conveniência, e tudo isso deve ser considerado se a tendência de ocidentalização da dieta for freada”, completa o autor.

Ana Vládia Bandeira Moreira, coordenadora do Laboratório de Análise de Alimentos da Universidade de Viçosa, em Minas Gerais, explica que o aumento de renda permite que alguns segmentos da população, em especial o mais pobre, satisfaça alguns desejos, como comer fast food. “Paralelamente a isso, o acesso a esses produtos está facilitado porque a produção é em larga escala. A lógica é: muita produção e resultado de grande demanda, o que leva à baixa nos preços e a mais compras”, analisa a professora.

O médico-cirurgião Eduardo Fávero, especialista em cirurgia vascular e endovascular, diz que o alerta de Tilman é importante. Entretanto, não pode ser intepretado com radicalismo. “Pedir que o paciente exclua totalmente a carne é uma medida agressiva e ineficiente, pois ele não seguirá. Se ele substituir apenas uma refeição, observará bons resultados.” O médico reforça que é preciso investir na educação, principalmente das crianças, para vencer tanto o problema de obesidade quanto o de degradação ambiental. “Se os pequenos forem habituados a comer bem, dificilmente serão adultos obesos. Por isso o avanço nas regras para a publicidade infantil e alimentos nas cantinas é importante”, argumenta.

 

Soja mais sustentável
A Moratória da Soja, acordo que visa eliminar o desmatamento da Amazônia causado pela cadeia produtiva de soja, está valendo até maio de 2016. Em vigor desde 2006, a medida tem como principal ação o veto à soja plantada em novas áreas de desmatamento. Para isso, o novo documento passa a utilizar como referência a data definida pelo novo Código Florestal, que anistiou desmatamentos até junho de 2008. Assinaram o documento a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e os coordenadores do Grupo de Trabalho da Soja (GTS) – integrado pela Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) e entidades da sociedade civil, como o GreenPeace.

 

Três perguntas para...

Ivens Domingos, especialista em pecuária sustentável do Programa Cerrado Pantanal da WWF-Brasil

 

Uma das formas de fazer com que a produção de alimentos prejudique menos o ambiente é por meio de projetos como o Carne Sustentável do Pantanal.  Como ele funciona?
Esse projeto segue um protocolo interno com critérios sociais e ambientais rígidos. Ele surgiu há 10 anos com um trabalho nas fazendas pantaneiras de gado de corte. Nessa região, o gado é criado no pasto natural, uma forma de evitar o desmatamento. Essa pecuária existe há mais de 270 anos e, até hoje, é baseada na típica cultura pantaneira. Tanto que é lá que registramos o menor nível de desmatamento, pois ainda há 78% de área original.
Mas, com o aumento da demanda, a tendência não é que ocorram mais áreas desmatadas?
A demanda vai aumentar, isso é claro, e não só a de ruminantes. Frangos e ovos também, por exemplo. Sabendo disso, precisamos encontrar formas de dobrar a eficiência produtiva das criações em áreas já consolidadas. Assim, não haveria necessidade de desmatar. Além disso, é preciso fortalecer o Código Florestal e o Projeto de Desmatamento Zero. Não dá para esquecer de oferecer incentivos aos produtores que fazem mais pela sustentabilidade.

Como aliar consumo de carne, mercado e sustentabilidade?

Defendemos o consumo responsável. A proteína animal tem uma série de benefícios, mas muitas populações a consomem de forma exacerbada. Essa não é uma responsabilidade de um setor único, depende de ações conjuntas dos governos, da sociedade civil e de outros ligados à cadeia bovina. Vale reforçar que a sociedade tem papel crucial em exigir do varejo informações sobre a origem da carne. Hoje, conseguimos fazer o rastreamento do fornecedor direto, aquele que recebe o bezerro, espera ele crescer e depois o abate. O desafio do setor é rastrear os indiretos, aqueles que produzem os filhotes. 

 


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