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Estado de Minas

Galáxias ajudam a entender processo de propagação da luz pelo universo

A observação de uma galáxia próxima à Via Láctea ajuda cientistas a entenderem como ocorreu o processo que permitiu à luz viajar livremente pelo universo, bilhões de anos atrás. Pesquisador do Observatório Nacional do Rio de Janeiro participa da descoberta


postado em 19/10/2014 01:02 / atualizado em 20/10/2014 11:12

Vilhena Soares

Desde que o astrônomo e padre belga Georges Lemaître propôs, em 1948, a teoria de que o universo surgiu a partir da expansão acelerada de uma minúscula porção de massa e energia comprimida — fenômeno depois batizado de big bang —, cientistas trabalham arduamente para entender em detalhes como esse processo aconteceu. Agora, a descoberta de uma galáxia próxima à Via Láctea pode ajudar os astrônomos a entender melhor uma das peças desse quebra-cabeça: a fase em que, quando o universo ainda era um jovem de 400 milhões de anos (hoje, ele tem quase 14 bilhões de anos), a luz começou a se propagar entre as galáxias, dando fim à chamada Era das Trevas.


O estudo, publicado na edição desta semana da revista Science, teve início há 10 anos, quando os autores começaram a analisar um grupo especial de galáxias. “Essas formações têm uma semelhança impressionante com as que existiam quando o universo tinha acabado de se formar. Portanto, elas são consideradas ‘dinossauros vivos’, que podem nos ensinar sobre épocas anteriores”, explica Roderik Overzier, astrofísico holandês do Observatório Nacional do Rio de Janeiro e um dos autores do trabalho, feito em parceria com outros três pesquisadores, da Universidade Johns Hopkins e do Space Telescope Science Institute, ambos nos Estados Unidos.

Durante essa ampla pesquisa, os especialistas notaram uma outra característica inusitada em seus objetos de estudo. “Em 2009, encontramos evidências de que essas galáxias tinham uma outra propriedade especial. Aparentemente, elas estavam vazando fótons (partículas de luz) ultravioleta de alta energia. Esses fótons são produzidos por estrelas jovens e massivas, mas, em condições normais, eles não escapariam das galáxias”, conta Overzier.

A explicação para o fenômeno veio da observação de um desses conjuntos de estrelas — denominado J0921+4509 — e foi feita com a ajuda do Telescópio Espacial Hubble. “Mostramos que, nessa galáxia próxima, estrelas estão sendo formadas em uma intensidade tão grande que o material que normalmente bloqueia os fótons de alta energia é removido por ventos e fortes explosões. É isso que permite que a radiação ultravioleta escape. Isso nunca havia sido observado, e é algo genial”, empolga-se o astrofísico. “Isso é interessante porque sabemos que, logo após o big bang, muitas galáxias devem ter vazado esse tipo de fótons. Antes que o universo tenha atingido a idade de 1 bilhão de anos, esses fótons foram responsáveis pela reionização de todo o gás hidrogênio neutro que preenche o espaço entre as galáxias.”

A reionização à qual Overzier se refere começou quando o Cosmos era muito jovem, posteriormente à Era das Trevas (período que durou até 400 milhões de anos depois do big bang). Depois da luz inicial produzida na origem do universo, tudo foi preenchido por uma névoa de gás hidrogênio neutro, que absorvia a luz, impedindo sua propagação pelo espaço entre as galáxias. Produzidos por estrelas jovens e massivas, fótons ultravioleta de alta energia passaram a ionizar o hidrogênio, modificando as características do gás, que passou a dar passagem para a luz. “Essa época teve grandes consequências para o prosseguimento da evolução do universo desde então. Mas, até agora, não foi entendido como isso poderia ter acontecido, já que os fótons não podem escapar das galáxias”, explica o pesquisador do Observatório Nacional do Rio de Janeiro.

Segundo os responsáveis pelo estudo publicado na Science, a J0921+4509 fornece uma provável explicação sobre o que permitiu o vazamento de fótons bilhões de anos atrás. “Como a galáxia desse estudo é tão semelhante às galáxias da fase inicial do universo, essa descoberta demonstra, pela primeira vez, como o processo de reionização pode ter acontecido. Nossa teoria é que as primeiras gerações de galáxias também produziram ventos fortes e explosões que levaram à fuga dos fótons necessários para a reionização”, completa Overzier.

Mais dados

AJ0921 4509: ventoseexplosões surgemdaprodução intensa de estrelas(foto: Arquivo EM)
AJ0921 4509: ventoseexplosões surgemdaprodução intensa de estrelas (foto: Arquivo EM)
Para Adolfo Stotz, chefe do Grupo de Estudos de Astronomia (GEA) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o trabalho dos pesquisadores é importante, mas precisa de mais dados. “Essa é uma das muitas teorias que existem quanto à criação do universo. Estudos feitos nessa área buscam delinear melhor o que aconteceu no passado, porém muitos outros pontos, que envolvem toda a teoria, devem ser levados em conta”, opina o especialista.

Segundo Stotz, o ponto a ser destacado da pesquisa é o método de investigação. “A metodologia é bastante avançada, como os cálculos utilizados e o uso de aparelhos avançados, o Telescópio Hubble, por exemplo. Porém, os achados ainda precisam crescer para que possamos contar com esse indício como uma comprovação maior de formação do espaço-tempo”, completa o especialista, que não participou do estudo.

 A descoberta ainda é algo inicial, e os cientistas acreditam que muitos estudos devem ser feitos. “Isso ainda precisa ser comprovado observando diretamente galáxias no início do Universo. Vai ser muito difícil, mas nosso estudo tem dado pistas muito importantes sobre como fazê-lo. Por exemplo, se o Brasil se juntar ao ESO (Observatório Europeu do Sul), a organização internacional responsável pela construção e operação dos melhores observatórios astronômicos do mundo, seremos capazes de fazer muitas outras descobertas emocionantes nesse campo nos próximos anos”, acredita Overzier.

 


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