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Estado de Minas

Bagaço da cana limpa efluentes

Pesquisadores da Universidade Federal de Ouro Preto criam tecnologia usando resto da planta como alternativa para minimizar poluição ambiental gerada por processos industriais. Celulose e serragem também se mostraram viáveis


postado em 27/04/2013 00:12 / atualizado em 27/04/2013 08:09

(foto: Paulinho Miranda / DA Press)
(foto: Paulinho Miranda / DA Press)

São muitas as formas de se usar o bagaço de cana-de-açúcar. Pensando em dar novo reaproveitamento ao resíduo, o grupo de pesquisadores em química orgânica e ambiental do Departamento de Química da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) desenvolveu uma pesquisa usando o bagaço da cana, dando origem a um filtro de metais pesados gerados na indústria. Um dos focos do estudo era testar a fórmula e para isso os pesquisadores usaram o bagaço para tratar o efluente gerado por uma indústria de galvanoplastia (revestimento de um metal por outro mais nobre, como uma zincagem). O resíduo gerado nesse tipo de processo é rico em metais, principalmente o zinco.


“Para devolver esse efluente líquido à natureza é preciso tratá-lo, até que esteja dentro dos limites estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente”, explica o pesquisador Leandro Vinícius Alves Gurgel, membro do Grupo de Química Orgânica e Ambiental da Ufop. Para filtrar esse e outros elementos, Leandro e os pesquisadores Tânia Márcia Sacramento Melo e Laurent Frédéric Gil desenvolveram um material capaz de reter os metais em um suporte sólido, no caso o bagaço de cana quimicamente modificado, usando o princípio das cargas opostas que se atraem.


 No laboratório, o bagaço de cana-de-açúcar foi lavado para retirar impurezas (como algum açúcar residual) e secado. Depois, ele foi triturado até virar um pó. Esse pó, por sua vez, foi quimicamente modificado, ganhando carga positiva ou negativa, de acordo com o material que se desejava reter. Dessa forma, o bagaço se transformou em um suporte sólido, indissolúvel em água e capaz de captar metais e outras substâncias presentes num efluente. Tânia Márcia explica que a experiência pode ser feita tanto em um recipiente sob agitação, o que exigiria uma filtragem para separá-los posteriormente, quanto em uma coluna recheada com o bagaço modificado, por onde o fluxo do efluente líquido passaria continuamente.

VANTAGENS

(foto: Paulinho Miranda / DA Press)
(foto: Paulinho Miranda / DA Press)
Em relação aos métodos convencionais, o custo do bagaço da cana é maior, porém ele soma vantagens que compensam sua utilização. A possibilidade de fazer uma dessorção, processo em que o poluente é removido do bagaço, permite que a indústria recupere e reaproveite o material filtrado. Isso permite também que o bagaço modificado quimicamente seja reutilizado no processo de descontaminação várias vezes. “A grande vantagem é essa possibilidade de recuperar tanto o material filtrado seletivamente, quanto o bagaço, que poderá ser reutilizado diversas vezes”, conta Leandro.

Depois da experiência de aplicar o tratamento do efluente de uma indústria de galvanoplastia, a mesma ideia vem sendo usada em outros ramos que geram descartes nocivos ao meio ambiente. É o caso da indústria têxtil, considerada altamente poluente. O bagaço de cana processado quimicamente é capaz de reter o corante presente no efluente da produção de tecidos. O processo também foi usado na mineração, no tratamento do efluente da drenagem ácida, quando a água da chuva se junta aos resíduos de mineração e carreia os metais oriundos do processo em um fluxo ácido. Esse efluente, se não tratado, acaba contaminando as águas de uma lagoa ou um lençol freático. Essa tecnologia pode ser aplicada também na indústria de produção de cachaças artesanais, visando reduzir a quantidade de cobre presente na bebida (presente devido à utilização de alambiques de cobre).

OUTROS MATERIAIS
Além do bagaço de cana-de-açúcar, os pesquisadores da Ufop usaram a celulose e a serragem de madeira quimicamente modificadas para as mesmas aplicações. A principal diferença entre os materiais é o custo. “Enquanto a tonelada do bagaço de cana custa cerca de R$ 100, a tonelada da celulose pura custa cerca de US$ 700 (R$ 1,4 mil). Uma opção um pouco mais barata é usar a celulose sem branqueamento, que pode custar até 30% menos”, avalia Leandro Gurgel. Porém, além do preço, cada um desses materiais tem uma capacidade diferente de absorver impurezas. Naturalmente a celulose pura, depois de tratada, é capaz de filtrar uma maior quantidade de poluente. “O bagaço de cana pode filtrar de 50% a 80% do que a celulose filtra, porém a diferença abismal entre seus preços, aliado ao fato do reuso de um material que poderia ser descartado, torna o bagaço um material ainda mais interessante”, informa o pesquisador, que, mesmo com essa diferença nos preços, avalia que a celulose não é considerada um material caro.


O bagaço de cana tem ainda um apelo ecológico, já que o material pode substituir vários outros destinados ao mesmo fim que são derivados do petróleo. O processo desenvolvido na Federal de Ouro Preto está sendo patenteado, e não há problemas em ser reproduzido em larga escala. Caso haja interesse de setores industriais, o material pode ter a sua tecnologia transferida para a iniciativa privada para uma futura comercialização, já que existe uma vasta gama de aplicações.

 

 

palavra de especialista

Euclides Honório de Araújo
engenheiro químico, professor titular na Universidade Federal de Uberlândia

 

“O bagaço de cana tem sido usado para diferentes aplicações, inclusive após o tratamento térmico e enzimático na fermentação alcoólica, mas a principal aplicação tem sido na produção de energia, seja na queima nas fornalhas ou na geração de energia elétrica, ambas para suprir as próprias usinas ou, como no segundo caso, vendendo o excedente. A iniciativa dos professores da Ufop vem ao encontro da valorização desse subproduto da fabricação do etanol, assim como da diminuição dos investimentos despendidos pelas indústrias, que trabalham com metais e assemelhados, para o tratamento das suas águas residuárias. Do ponto de vista da engenharia química, começo a imaginar a ideia sendo aplicada na indústria, levando em conta suas dimensões, e a forma de processamento. Como exemplo, penso no efluente sendo filtrado em estruturas fixas, como pallets, recheados de pó de bagaço de cana quimicamente tratados. Após a filtragem, um contrafluxo poderia fazer a retirada dos poluentes absorvidos na filtragem.”


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