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Estado de Minas

Pesquisadores testam vacina contra doença causada por fungo


postado em 16/10/2012 08:58

Agência FAPESP – Pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) têm testado uma nova estratégia de vacinação contra uma doença pouco conhecida, mas potencialmente incapacitante: a paracoccidioidomicose.

Causada pelo fungo Paracoccidiodes brasiliensis, comum em áreas rurais, a doença causa um processo inflamatório crônico que leva à formação de fibrose nos tecidos afetados.

Como a principal forma de contágio é a inalatória, a sequela mais comum é a doença pulmonar obstrutiva crônica. Mas o fungo também pode afetar pele, boca, laringe, baço e fígado, além de se infiltrar nos ossos, nas articulações e no sistema nervoso central.

“Os tratamentos existentes são demorados, muitas vezes requerem a internação do paciente e causam efeitos colaterais importantes. Por isso, apostamos em uma vacina terapêutica, capaz de estimular o sistema imunológico a combater a doença. Mas também estamos testando a vacina em um protocolo profilático, para ver se ela é capaz de prevenir a infecção”, disse Suelen Silvana dos Santos, cujo estudo de doutorado é orientado pelo professor da FCF-USP Sandro Rogério de Almeida, com apoio de Bolsa da FAPESP.

Estima-se que existam 10 milhões de infectados pelo Paracoccidiodes brasiliensis na América Latina – concentrados no Brasil, na Argentina, na Venezuela e na Colômbia. Desses, apenas 2% desenvolvem a doença, fato geralmente associado a carência alimentar, alcoolismo, tabagismo ou doenças preexistentes.

Quando a micose se manifesta, no entanto, torna-se um problema de saúde pública, pois a mortalidade é alta e quem sobrevive fica, muitas vezes, incapacitado para o trabalho.

“Pesquisas têm apontado uma incidência de três casos para cada 100 mil habitantes. Mas acredito que o número é subestimado, pois a notificação não é obrigatória”, disse a pesquisadora.

Segundo Santos, 90% dos casos correspondem à forma crônica de paracoccidioidomicose, que leva anos para se desenvolver e provocar sintomas clínicos. Mas a doença também pode se manifestar de forma aguda, que é mais mais agressiva e afeta principalmente os jovens.

A principal droga usada hoje na fase mais grave da doença é a anfotericina B, que é altamente tóxica e requer longo período de hospitalização. Após a alta, o paciente precisa de acompanhamento para avaliar a função hepática e renal, além de tratamentos adicionais para evitar recaídas.

“Por esse motivo apostamos na vacina terapêutica. A estratégia é direcionar um antígeno do fungo às células dendríticas, capazes de desencadear no organismo uma resposta imunológica específica contra o Paracoccidiodes brasiliensis”, explicou Santos.

Resposta direcionada

As células dendríticas são peças-chave do sistema imunológico. Após fagocitarem os antígenos, elas migram para os órgãos linfoides e apresentam os invasores para as chamadas células T, responsáveis pela resposta imunológica adaptativa – específica para cada doença.

Quando o antígeno é apresentado às células T, cria-se uma memória imunológica que, uma vez debelada a doença, impede uma nova infecção.

“Se conseguirmos enviar o antígeno diretamente às células dendríticas, evitamos desencadear uma resposta imunológica exacerbada e não direcionada, o que poderia destruir as células dos tecidos afetados pelo fungo”, afirmou Santos.

Para isso, os pesquisadores desenvolveram um anticorpo batizado de anti-DEC205, capaz de se ligar somente aos receptores das células dendríticas. A esse anticorpo foi fusionado um peptídeo do fungo conhecido como P10.

“O P10 é uma sequência de aminoácidos retirada da principal glicoproteína do fungo, a gp43. Ele funciona como um antígeno, ou seja, induz uma resposta imunológica específica contra o fungo”, explicou Santos.

Tanto a gp43 como o P10 foram descobertos em uma série de pesquisas realizadas desde a década de 1980, sob coordenação de Luiz Rodolpho Travassos, professor aposentado da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e com financiamento da FAPESP.

Ainda em seu doutorado, o professor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP Carlos Pelleschi Taborda – colaborador do estudo de Santos – chegou a testar o poder de imunização do P10 em camundongos com resultados animadores.

Para o desenvolvimento do anti-DEC205 fusionado ao P10, Santos contou com a colaboração de Silvia Beatriz Boscardin, também do ICB-USP.

Boscardin, que trouxe para o Brasil a tecnologia de produzir o anticorpo fusionado a antígenos, testa a mesma estratégia para desenvolver vacina contra malária e outras doenças infecciosas.

“Em um protocolo de dez dias de imunização, comparamos a resposta imunológica induzida pelo P10 isolado, pelo anti-DEC205/P10 e por um anticorpo controle, incapaz de se ligar aos receptores das células dendríticas por causa de uma mutação”, contou Santos.

O objetivo era acionar as células T produtoras de interferon-gama (IFN-γ), uma citocina pró-inflamatória importante para o combate ao fungo. A resposta utilizando a estratégia de direcionamento foi duas vezes maior que quando o antígeno foi administrado sozinho. A administração do anticorpo controle teve produções basais como esperado.

“No anti-DEC 205 foi usada uma quantidade 200 vezes menor do peptídio que no P10 isolado e, ainda assim, a resposta imunológica foi maior. Isso mostra que a estratégia de imunização é promissora”, disse Santos.

No entanto, conta a pesquisadora, foi necessário adicionar ao anti-DEC205/P10 uma substância para estimular a maturação das células dendríticas. “Quando o direcionamento é feito na ausência desse estímulo, as células dencdríticas levam a tolerância. Normalmente a maturação é estimulada pelo processo inflamatório da doença, mas, no caso da vacina, foi necessário fazer essa estimulação”, explicou.

Os dados foram apresentados no 18º Congresso da International Society for Human and Animal Mycology (ISHAM), realizado em junho, na Alemanha. O pôster foi premiado na sessão “Basic Mycology”.

“Ainda não temos os resultados do protocolo terapêutico. Os animais já foram infectados, mas, como a doença se desenvolve lentamente, o trabalho levará mais tempo para ser concluído”, disse Santos.

O trabalho contou ainda com a colaboração de Karen Spadari Ferreira, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e da mestranda Eline Rampazo do ICB-USP.


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