Quando o furacão Catarina atingiu o Sul do Brasil em março de 2004, deixando três mortos e 100 mil casas destruídas, ficou claro para os especialistas em climatologia que a meteorologia brasileira não estava preparada para prever esse tipo de fenômeno, que requer conhecimento das condições do mar, onde o furacão se forma, e da temperatura média de uma camada de água situada entre 100m e 200m de profundidade.
O fenômeno de consequências trágicas motivou uma equipe de pesquisadores do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO/USP) a pensar em novas estratégias para munir o país de uma tecnologia própria capaz de realizar estudos em águas profundas. A solução, uma boia meteoceanográfica, será lançada ao mar ainda este ano. O equipamento é uma réplica autorizada de uma similar norte-americana, mas foi construído com várias inovações e soluções locais.
“Em 2004, todas as previsões falharam e não se previu que aquele ciclone se tornaria um furacão. Agora, estamos prestes a ter um sistema de informação que vai nos ajudar na previsão de tempestades no litoral sul e sudeste, além de medir ondas e ressacas”, afirma o professor Edmo Campos, do Departamento de Oceanografia Física, Química e Geológica do IO.
A Atlas-B, como foi denominada a boia, é o primeiro equipamento do tipo construído no Brasil, em parceria com a empresa carioca Ambidados. “Temos dois objetivos principais: ampliar nossas condições para realizar a previsão do tempo e fazer um estudo a longo prazo que nos permita entender as mudanças no clima ao passar dos anos”, explica Campos. Para o segundo objetivo, o professor diz ser necessário manter a boia no oceano, ininterruptamente, por um período de 10 anos. Por isso, foram desenvolvidas duas boias idênticas, que serão usadas de maneira alternada. Enquanto uma fica em manutenção, a outra permanece no mar coletando os dados.
Segundo o pesquisador, a ideia inicial era comprar boias iguais às usadas no Projeto Pirata, programa de monitoramento do Atlântico Tropical desenvolvido em conjunto por Estados Unidos, Brasil e França. As 16 boias do programa são fabricadas pelos norte-americanos para a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (Noaa, em inglês). Entretanto, em vez de vender os equipamentos, os americanos sugeriram que os pesquisadores brasileiros fabricassem um modelo próprio. “A Atlas B é uma nacionalização das boias americanas, com a parte eletrônica realizada por nós. Assim, a manutenção pode ser feita aqui mesmo no Brasil”, afirma Marcelo Rocha Toffoli, diretor técnico da Ambidados.
Petrobras Além do projeto em conjunto com a USP, a empresa carioca foi responsável pelo desenvolvimento de outro modelo, a pedido do Centro de Pesquisas Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), da Petrobras. A boia meteoceanográfica (BMO) começou a ser produzida em 2010 e sua grande diferença em relação ao mecanismo da USP está no objetivo principal. “Enquanto a Atlas-B visa à medição de parâmetros meteorológicos e oceanográficos, a boia da Petrobras quer medir também os parâmetros de ondas”, esclarece Marcelo Perantoni, engenheiro elétrico da Ambidados.
Para realizar muitos dos procedimentos executados nas plataformas de petróleo, é necessário conhecimento prévio da situação das correntes marinhas no momento. Ondas grandes, por exemplo, podem comprometer a segurança dos trabalhadores e inviabilizar a missão. Daí a importância de um mecanismo capaz de mensurar e interpretar as condições locais.
Tofolli acrescenta que toda a concepção da BMO é brasileira, que tem como principais diferenciais técnicos o formato cilíndrico e sensores internos capazes de medir o movimento das ondas, inexistentes na Atlas B. Entretanto, as duas boias compartilham outros 10 sensores ao longo da estrutura, que servem, por exemplo, para medir a salinidade e a temperatura da água, as radiações solares, a quantidade de dióxido de carbono, entre outros fatores.