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Estado de Minas

Droga simula saciedade para evitar o diabetes

Substância engana o organismo de quem tem dificuldade de dormir e comer na hora certa. Assim, preserva o relógio biológico, que interfere na produção de glicose


postado em 06/08/2012 09:41 / atualizado em 06/08/2012 11:35

Substância engana o organismo de quem tem dificuldade de dormir e comer na hora certa. Assim, preserva o relógio biológico, que interfere na produçãodeglicose(foto: Anderson Araújo/CB/D.A Press)
Substância engana o organismo de quem tem dificuldade de dormir e comer na hora certa. Assim, preserva o relógio biológico, que interfere na produçãodeglicose (foto: Anderson Araújo/CB/D.A Press)
Para manter a saúde, não basta comer e dormir bem. É necessário fazê-los dentro do horário. Quem pula refeições ou atrasa a hora de ir para a cama força o corpo a mudar o ritmo circadiano, conhecido como relógio biológico. Nem todos, porém, podem se dar ao luxo de manter uma rotina consistente, e o corpo acaba pagando o preço por isso. Para resolver esse problema, pesquisadores da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, encontraram um químico que pode ser usado para acertar os ponteiros de quem não consegue manter um ritmo saudável todos os dias. O composto, afirmam os responsáveis pela descoberta, pode resultar em um medicamento que regule a produção de glicose e previna o diabetes tipo 2.

A pesquisa, publicada na revista Science, explica como o químico KL001 engana o corpo e cria a sensação de saciedade ao interagir com a criptocromo, uma proteína fundamental para o relógio biológico de animais, insetos e plantas. Quando uma pessoa está ativa e comendo, essa é a proteína que avisa ao organismo que ele está satisfeito. No entanto, no horário de descansar, a criptocromo é descartada por meio do proteassoma, um complexo que degrada proteínas, abrindo espaço para a enzima que estimula a produção de açúcar pelo fígado. Esse processo de transformação de gordura e proteína em glicose é chamado gluconeogênese.

O problema ocorre quando o corpo não sabe mais qual é a hora de comer e quando precisa dormir. Desorientado, o organismo passa a produzir glicose demais, o que geralmente resulta em obesidade. O KL001 funcionaria como uma engrenagem, projetada para atrasar o relógio biológico apressado. Ele impede que a criptocromo seja destruída, evitando a produção das enzimas que dão início à gluconeogênese.

A descoberta não foi feita por acaso. Há cerca de cinco anos, os pesquisadores da Universidade de San Diego entenderam a relação entre o metabolismo, a criptocromo e o nível de glicose no sangue. Com esse conhecimento em mãos, vasculharam mais de 60 mil compostos à procura de uma substância capaz de controlar esse processo. Para encontrar o químico, eles combinaram células humanas com o gene de luminescência do vaga-lume. Quando o relógio biológico de uma delas fosse ativado, eles saberiam pela luz.

Ao finalmente encontrar um composto que se comportasse como queriam, os cientistas construíram um modelo matemático que mostrasse como a criptocromo se comporta no ciclo circadiano. O esquema teórico apontou que, caso fosse combinada com o KL001, a proteína teria os níveis aumentados, e inibiria a produção do hormômio glucagon, que estimula a gluconeogênese. A teoria foi confirmada em laboratório num modelo de células de rato. “Analisamos o efeito do KL001 no ciclo circadiano do tecido cerebral e em células de pele. Como foi previsto no modelo matemático, o tratamento prolongou o período do relógio nas células”, explicou o pesquisador Tsuyoshi Hirota, biólogo da Universidade de San Diego.

O próximo passo, de acordo com os pesquisadores, é realizar testes em cobaias vivas para descobrir como o composto afeta outros processos metabólicos, além da produção de glicose. “Ainda não usamos o fígado para testar o modelo matemático. Ainda não sabemos o que o KL001 faria a um organismo, mas sabemos que a criptocromo, onde age o KL001, é conhecida por afetar a hipertensão causada pelo consumo de sal e a produção de citocina proinflamatória. Seria interessante ver se ele funcionaria em outros tratamentos”, conclui Hirota.

Há dois anos, a mesma equipe de pesquisadores havia encontrado um composto que também tinha um forte efeito no ciclo circadiano. Batizado de longdaysin (o nome sugere, em inglês, que torna o dia mais longo), o químico age na proteína criada pelo gene e por um período que varia no organismo de acordo com um ciclo de 24 horas. Em testes de laboratório, o composto conseguiu adiar o relógio das células em 10 horas. No entanto, ainda são necessários mais estudos para definir os benefícios do longdaysin.

Efeito preventivo

De acordo com especialistas, já há remédios para o diabetes que têm relação com o ciclo circadiano, como o cortisol. “À medida que entendemos melhor como funcionam as coisas a nível molecular, surgem possibilidades de outras medicações que vão ajudar no tratamento dessa doença”, avalia Airton Golbert, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Para Airton, iniciativas como essa têm grande valor na prevenção do diabetes, doença que muitas vezes não é diagnosticada a tempo. “Se houver a possibilidade de uma droga que previna, estaremos economizando muito em termos de saúde no mundo inteiro. Mas isso é uma coisa muito especulativa neste momento”,

Se passada despercebida, a doença pode causar doenças cardiovasculares, derrames e diversos outros problemas de saúde. Drogas preventivas poderiam ser usadas em pessoas com mais chances de desenvolver o diabetes, como obesos, mulheres com síndrome do ovário policístico e pacientes com histórico familiar da doença.

Mas, mesmo sem a ajuda de remédios que atuem diretamente no ciclo circadiano, faz parte do tratamento do diabetes procurar regular o relógio biológico do paciente. “O médico leva em conta essas condições quando usa medicamentos que estimulam a secreção de insulina ou a própria administração de insulina em determinados horários do dia, em sincronia com a ingestão alimentar”, compara Cláudio Kater, médico do Laboratório de Endocrinologia Molecular e Translacional da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Essa área de pesquisa, a cronobiologia, é ainda relativamente incipiente, mas certamente promissora”, ressalta Kater.

No entanto, completa o médico, mesmo que drogas como o KL001 ou o longdaysin se provem ser eficientes na regulação do relógio biológico, é essencial seguir os hábitos recomendados para manter o corpo no ritmo correto. “Nesse cenário, a participação do relógio biológico seria apenas mais um personagem contracenando com inúmeros outros já conhecidos, entre eles os hábitos alimentares, cada vez menos saudáveis, e a falta da prática de atividade física regular”, alerta.

Problemas com a insulina
O diabetes é causado pelo alto nível de glicose no sangue, que pode ser gerado pela baixa produção ou pela ineficiência da insulina. A doença crônica está dividida em duas categorias: a do tipo 1, quando a pessoa não tem insulina suficiente no sangue para que as células processem a glicose. Isso corre porque o sistema imune destrói as células que produzem a substância. Nesse caso, o paciente precisa de um tratamento que supra a necessidade de insulina. Na do tipo 2, o corpo desenvolve resistência à substância, intolerância geralmente causada pela obesidade. O organismo acaba produzindo mais insulina, o que pode causar hiperglicemia.

 


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