Desenterrar o passado é um trabalho fascinante e, ao mesmo tempo, árduo. A imagem de “caçadores de fósseis”, retratada em filmes, pode passar a falsa impressão de que paleontólogos são aventureiros que viajam pelo mundo esbarrando em dinossauros e hominídeos. Nada mais falso. É preciso muita informação, técnica, sorte e paciência para trazer à luz uma história escondida por diversas camadas geológicas.
Um profissional pode passar a vida inteira sem achar algo muito significativo ou, em casos raríssimos, como o do primeiro esqueleto de neandertal descoberto, ser “encontrado” pelo fóssil, completamente por acaso. O mais usual, porém, é seguir um protocolo que começa com a pergunta: “O que quero encontrar?”.
A tecnologia tem ajudado bastante nessa etapa. Imagens por satélite indicam onde encontrar rochas sedimentárias, aquelas que preservam fósseis. Além disso, revelam locais sem vegetação próxima – o solo e a mata cobrem as rochas, impedindo a observação dos sítios. Na descoberta do Pampaphoneus biccai, por exemplo, a equipe de Cisneros se guiou pelo programa Google Earth. O software mostrou que em uma fazenda no município de São Gabriel (RS) havia uma formação rochosa promissora do Período Permiano, quando a Terra era um só continente. A dica do satélite foi preciosa, e os pesquisadores encontraram uma espécie até então completamente desconhecida.
Nem sempre a primeira viagem a campo é tão frutífera. “Fizemos uma expedição na Bacia do Parnaíba em 2011 e tivemos resultados modestos. Um ano depois, voltamos e os resultados foram muito bons”, conta Cisneros, que pretende publicar, em 2013, um artigo sobre a descoberta – anfíbios paleozoicos encontrados perto de Teresina (PI). De acordo com o especialista, saber olhar os fósseis é essencial. “Pode acontecer de você selecionar bem, ir aos locais corretos, mas seus olhos ainda não aprenderam a ver o tipo de fóssil”, diz.
Às vezes, um golpe de sorte torna o trabalho bem mais fácil. Foi o que ocorreu com o geólogo Iyad Zalmout, da Universidade de Michigan. Há três anos, ele encontrou o fóssil de um primata no segundo dia de uma expedição à formação de Harrat Ul Ujayfa, na Arábia Saudita. Zalmout estava escalando um platô quando viu algo parecido com um dente. “Me ajoelhei e me aproximei. Então, gritei em árabe: ‘É um primata, é um macaco!’”, recorda. No dia seguinte, achou mais ossos, incluindo um crânio. O geólogo havia descoberto o Saadanius hijazensis, primata de 29 milhões de anos, uma época em que as linhagens ancestrais de humanos e de macacos ainda não haviam se dividido. O achado rendeu a capa da revista científica Nature e mais um elemento na árvore da vida.
Por mais empolgantes que sejam, essas descobertas podem ser exaustivas. Em campo, faz-se um trabalho braçal, com a ajuda de diversos equipamentos, dependendo do tamanho da área e do tipo de fóssil escavado. Imediatamente, os cientistas protegem seus achados com conservantes, trabalho que será continuado em laboratório. A expedição a céu aberto pode demorar dias ou anos. Juan Carlos Cisneros se recorda de um dinossauro que levou sete anos para ser escavado na África do Sul.
As características anatômicas são comparadas às de outros animais conhecidos e já descritos para tentar encaixar os fósseis em um grupo. Na fase de pesquisa e de interpretação dos resultados, às vezes os paleontólogos viajam a outras partes do mundo, onde foram encontrados fósseis similares. No caso de espécies novas, os especialistas precisam descobrir o parentesco do animal por análise filogenética, o que torna a missão ainda mais árdua. Nada disso, porém, desanima os pesquisadores, que sabem que ainda há muitos mistérios esperando para serem desvendados.