Quase 40 anos depois de pesquisadores terem descoberto o crânio de Luzia, o fóssil humano mais antigo encontrado nas três Américas, com cerca de 11,5 mil anos, um grupo de arqueólogos retornou esta semana à região conhecida como “a Minas da Pedra Lascada” para escavar o solo da Gruta Lapa do Santo, em Matozinhos, a 47 quilômetros de Belo Horizotne, onde já foram encontrados, na década passada, os restos mortais de 28 homens e mulheres do período holoceno (últimos 10 mil anos). Agora, o principal objetivo de 35 profissionais é localizar e exumar ossadas de contemporâneos de Luzia, cujo achado revolucionou a literatura da pré-história no continente – uma das teses que era descartada até aquela época foi a de que habitantes da região teriam convivido com a chamada megafauna, como preguiças gigantes e tigres-dente-de-sabre.
O sítio arqueológico em que os profissionais concentram suas atividades fica a poucos quilômetros da Gruta Lapa Vermelha, onde os restos mortais de Luzia foram desenterrados. Ontem, eles começaram a exumar o 29º corpo na Lapa do Santo. O trabalho deve ser concluído em duas ou três semanas. A grande esperança dos arqueólogos, porém, é descobrir ossadas bem mais antigas. “Nosso objetivo é encontrar sepultamentos da época do povo de Luzia”, disse André Strauss, coordenador do projeto. O trabalho, financiado pelo instituto alemão Max Plack, conta com arqueólogos, geógrafos, historiadores e biólogos da própria entidade europeia, da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Museu Nacional do Rio de Janeiro.
Eles vão permanecer no local até o fim da primeira semana de agosto. Até lá, esperam retirar do solo fósseis e objetos que ajudem a revelar segredos e curiosidades de quem habitou a Minas da Pedra Lascada, formada por áreas de Lagoa Santa, Pedro Leopoldo, Confins e Matozinhos. “Bem aqui, onde estou pisando,” recorda André, “foi localizado o caso de decapitação mais antigo da América. Era um homem que teria vivido na região há cerca de 8,6 mil anos, segundo o método de carbono 14”. A descoberta a que ele se refere foi feita na década passada por um grupo comandado pelo arqueólogo Renato Kipnis e pelo bioantropólogo da USP Walter Neves, orientador do mestrado de Strauss e responsável por localizar o crânio de Luzia.
Aliás, o bioantropólogo “batizou” Luzia em alusão à Lucy, como foi chamado o fóssil de Australopithecus afarensis, um ancestral do ser humano atual, encontrado na Etiópia, em 1974, e que teria vivido no continente africano há cerca de 3,5 milhões de anos. A região da Minas da Pedra Lascada também tem muitos segredos que despertam a atenção dos arqueólogos. Um deles é o fato de crânios de adultos, por exemplo, serem enterrados com esqueletos de crianças e vice-versa. Strauss, porém, acredita que dificilmente os especialistas vão conseguir desvendar esse tipo de mistério.