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Estado de Minas

Estímulos elétricos para quem sofre do coração

Pesquisadores criam método para tentar melhorar capacidade física de pessoas com insuficiência cardíaca


postado em 04/12/2011 08:02

 

Os últimos três anos têm sido difíceis para Arnaldo da Silveira, de 69 anos. Depois de uma sequência de problemas cardíacos, que começaram com uma angina, mas se multiplicaram ao longo do tempo, o baiano teve sua função cardíaca afetada. Tarefas simples do cotidiano deixaram de ser algo fácil para ele. “Tenho dificuldade de fazer qualquer tipo de exercício. Caminhar e até subir escadas eu só consigo se for bem devagar”, lamenta o aposentado, que, no início do ano, teve um novo susto: um princípio de infarto – felizmente, controlado pelos médicos.

Hoje, mesmo com uma vida mais regrada, evitando fortes emoções e cuidando da alimentação, Arnaldo não consegue voltar a ter a mesma disposição. “Mesmo tomando cinco comprimidos todos os dias, tenho que levar uma vida mais calma, sem muitas agitações e sem estresse, caso contrário o coração dá problema de novo”, conta. Atualmente, ele mantém um acompanhamento rigoroso com um cardiologista, mas, por conta da complexidade de seus problemas, não pode se submeter a uma cirurgia corretiva do coração.

Uma pesquisa que está sendo desenvolvida por especialistas do Hospital Universitário de Brasília (HUB) e pelo Instituto de Cardiologia do Distrito Federal (IC-DF) pode representar uma nova esperança a pacientes como Arnaldo, que, com medicamentos, conseguem controlar o avanço dos problemas cardíacos, mas têm a qualidade de vida afetada pelo mau funcionamento do coração. Os especialistas descobriram que o estímulo elétrico em uma região central do corpo pode ajudar a aumentar a capacidade física dessas pessoas, que se sentem exaustas após tarefas tão corriqueiras quanto tomar banho ou andar da sala para a cozinha.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores utilizaram um aparelho de estimulação elétrica neuromolecular transcutânea, o TNS. “Ele é amplamente utilizado na área esportiva, como para o tratamento da dor”, conta o líder do estudo, o médico Gerson Cipriano Júnior. Só que, em vez de utilizá-lo nos braços e pernas, como ocorre com os esportistas, os pesquisadores testaram ligar os eletrodos em uma região superior das costas, bem próxima ao pescoço. “Por essa região ser central, os pulsos elétricos conseguem agir em todo o sistema circulatório, e não apenas na região onde eles são aplicados”, explica o especialista.

Embora os dados finais ainda estejam sendo tabulados, os pesquisadores afirmam que a melhora da condição física foi visível e notada pelos próprios pacientes. “Eles próprios perceberam que, mesmo com apenas uma aplicação, houve um aumento da capacidade física. Alguns pacientes, após uma única aplicação, conseguiram se exercitar três minutos a mais do que antes”, comemora o médico. Pode parecer algo ínfimo para as pessoas saudáveis, mas, para quem mal consegue caminhar, qualquer capacidade a mais é uma conquista importante, garantem os especialistas.

Eles, no entanto, não sabem exatamente como o efeito é alcançado. “Uma das hipóteses é de que os impulsos estimulem uma glândula torácica responsável pela transmissão de estímulos entre o sistema nervoso parassimpático (SNP) e o sistema nervoso simpático (SNS).” Essas duas vertentes do sistema nervoso são responsáveis pelo controle das atividades vitais do organismo, como os batimentos cardíacos. Quando o SNS está muito ativo, ocorre um enrijecimento dos vasos sanguíneos, o que atrapalha a circulação. A ativação da glândula causaria então uma depressão do sistema nervoso simpático. “Assim os vasos se tornam mais relaxados, facilitando a circulação do sangue em todo o corpo”, completa.

Método

A médica e pesquisadora do IC-DF Alexandra Sánchez explica que a pesquisa foi feita com pacientes com dois problemas no coração muito distintos. “Um terço dos voluntários possuía insuficiência cardíaca isquêmica, ou seja, resultante de um infarto. A escolha é por esse ser o tipo de insuficiência cardíaca mais recorrente mundialmente”, conta a cardiologista. Outro terço dos pacientes possuía insuficiência cardíaca em função do mal de Chagas. “Apesar de, no mundo, essa não ser uma doença frequente, nós a escolhemos por ser um problema muito comum na região Centro-Oeste, assim como em outros lugares do interior do Brasil”, completa. O terceiro grupo era de pacientes saudáveis, que serviram de parâmetro de comparação para a pesquisa.

Os dois males, tão diferentes, foram escolhidos para testar amplitude da eficácia da nova ferramenta. “Como a estimulação elétrica em pacientes com problemas resultantes de causas tão distintas teve os mesmos resultados, essa é uma das razões que nos levam a crer que pacientes outros tipos de insuficiências cardíacas, como a causada pelo uso de álcool e drogas, também podem ser beneficiados por esse tipo de tratamento”, completa a médica, que também é aluna da pós-graduação em Ciências da Saúde da UnB. “Assim, além de melhorar a condição física dos pacientes, o tratamento faz com que eles voltem a ter a capacidade de se exercitar. Esse exercício ajuda a aumentar a capacidade de circulação, o que também melhora a saúde dos pacientes.”

 

Segundo os pesquisadores, o próximo passo da pesquisa será testar os efeitos da estimulação elétrica a longo prazo. “Queremos saber como os pacientes reagem ao serem submetidos a sessões frequentes durante três meses”, conta a médica. “É aí que começa a fase mais difícil da pesquisa. Agora precisamos que os pacientes venham ao hospital várias vezes na semana, e não existe muito apoio para esse tipo de pesquisa”, completa o colega Gerson Cipriano Júnior.

Apoio e queixas

Para fazer a primeira parte das análises, os pesquisadores contaram com o apoio da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp). “Eles nos emprestaram um aparelho que mede a pressão arterial central, isto é, nas zonas próximas ao coração, e não nas extremidades do corpo, como ocorre na aferição tradicional. Precisamos utilizá-lo no fim de semana”, conta o pesquisador. Ele lamenta que, devido à frequência dos novos testes, não seja possível utilizar novamente o equipamento mais preciso que os tradicionais.

Os médicos também reclamam que outras formas ainda mais simples de estímulo à pesquisa não estão disponíveis. “Por questões internas, a liberação de recurso das fundações de apoio às pesquisas está suspensa há meses”, comenta Cipriano Júnior. “A lei que garantiria gratuidade a esses voluntários na ida ao hospital para fazer os testes está parada há anos. Já é difícil conseguir quem se proponha a participar das pesquisas, já que muita gente acha que será algum tipo de ‘cobaia’, e a falta de incentivo dificulta ainda mais a situação”, emenda Alexandra.


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