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Estado de Minas ENTREVISTA

Ministro Osmar Terra afirma que "Bolsa-Família foi politizado", mas programas sociais estão garantidos

Em entrevista exclusiva ao Estado de Minas/Correio Braziliense, chefe da pasta de Desenvolvimento Social e Agrário questiona o efeito prático do programa na redução da pobreza nacional


postado em 13/11/2016 07:30 / atualizado em 13/11/2016 07:54

"Estamos em uma arca de Noé. Se afundar a arca, todos afundam juntos. Se o governo do Michel fracassar, o que é um problema muito grave, acabou" (foto: Antônio Cunha/CB/D.A Press)
Brasília – Comandando uma das áreas mais sensíveis do governo e a principal bandeira da era petista no Planalto, o ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra, afirma, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas/Correio Braziliense, que o governo anterior fez uso político do Bolsa-Família. E questiona o efeito prático do programa na redução da pobreza nacional. “Foi um programa que tinha 6 milhões de famílias em 2005 e agora, em 2014, antes de a crise se agravar, já tinha 14 milhões. Aumentou em um período que tinha mais emprego, que a situação econômica não estava tão ruim. A qual a conclusão a gente chega? A questão da redução da pobreza no Brasil não é o que se dizia”. Longe de questionar a validade do programa, Terra afirma que ele se junta a outras medidas efetivas, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a aposentadoria do trabalhador rural. O governo vai prosseguir no pente-fino no Bolsa-Família, para garantir que ele chegue a quem precisa de fato. O ministro confirmou que um novo reajuste será concedido em 2017, apesar da PEC do Teto de gastos. Mas adianta que o Brasil precisa retomar o crescimento econômico.


Vocês identificaram uso político no Bolsa-Família?
O que se sabe é que não havia um controle mais detalhado do programa. O que nós fizemos foi ampliar a base de dados para ter um controle maior. Nós chegamos a seis informações diárias distintas para cruzar esses dados e, a partir daí, vimos que tinha um número significativo, em torno de 8,1%, de famílias que não fechavam. Aliás, é maior o número, pode chegar a quase 20% do total de incoerências nas respostas e informações que a gente tinha, mas que certamente foram comprovadas são 8,1%.

Isso corresponde a quanto?
Isso corresponde a 1,1 milhão e mais 1,4 milhão que vão ter que se recadastrar agora em janeiro. Esse 1,1 milhão está dividido em dois grupos: um grupo que cancelamos, de pessoas que detectamos com uma renda acima do mínimo do cadastro único, mais de meio salário mínimo per capita, cruzando informações. Nesse bloco, havia 469 mil pessoas, mais ou menos. Em um segundo grupo, dentro desse 1,1 milhão, tinha as pessoas que nós bloqueamos o repasse do recurso para a família, que terá que explicar melhor os dados que havia passado.

Vai ter mudança nessa checagem de dados?
O que nós vamos fazer agora é um pente-fino no cadastro. Quando a pessoa se cadastra, já passa pelo pente-fino antes de receber o recurso. Não é para prejudicar quem precisa. Pessoas que precisam vão continuar recebendo. Este ano mesmo, nós demos 12,5% de reajuste, um esforço muito grande em um ano de crise, de orçamento limitado. Pretendemos dar um novo reajuste no ano que vem.

A PEC do Teto de gastos não vai atrapalhar?
O teto de gastos vai obedecer aos recursos que já estão previstos no orçamento, mais a inflação. Nós temos um orçamento para o ano que vem que é maior que o deste ano. Vai ser um orçamento em torno de R$ 90 bilhões, 10% maior do que o deste ano.

Uma das críticas que se fazia ao programa era não conseguir criar mecanismos de saída.
Fiquei muito preocupado com algumas declarações que via alguns anos atrás, de que o programa não era para sair ninguém, era para entrar, para ajudar quem precisa. Eu acho que isso, de alguma maneira, permeou a prática política. Foi um programa que tinha 6 milhões de famílias em 2005 e agora, em 2014, antes de a crise se agravar, já tinha 14 milhões. Aumentou em um período que tinha mais emprego, que a situação econômica não estava tão ruim. A qual conclusão a gente chega? A questão da redução da pobreza no Brasil não é o que se dizia. O programa acabou tendo uma utilização política. O governo federal fazia o discurso, em todas as eleições, que “se nós perdermos as eleições vocês vão perder o Bolsa-Família. Eles vão tirar o Bolsa-Família de vocês”.

Isso prejudicava a ascensão das pessoas?
As pessoas tinham medo de perder o benefício se tivessem emprego com carteira assinada. Isso valia tanto para empregada doméstica quanto para tratorista, na área rural. Nós temos um pacote que vai contemplar todas essas coisas, para resolver o problema.

Mas o governo anterior não criou o Pronatec Bolsa-Família?
O Pronatec é um programa interessante, só que é feito de cima para baixo. Metade das famílias do Bolsa-Família que faziam o Pronatec desistiram antes de terminar porque não tinha utilidade prática nenhuma no lugar onde viviam. Dos 50% que faziam o curso até o fim, 90% não conseguiam emprego e renda. O Pronatec estava descolado da realidade de cada região.

O que o senhor acha do projeto do senador Aécio Neves (PSDB-MG) de incluir o Bolsa-Família na Lei Orgânica da Assistência Social (Loas)?
O Bolsa-Família veio para ficar. É um programa que começou lá atrás, com o Bolsa-Escola e o Vale-gás. Houve um esforço na década de 90, portanto antes de o Lula ser presidente, de se trabalhar contra a desigualdade de renda para diminuir a miséria. Para mim, o maior programa de combate à pobreza do Brasil não é o Bolsa-Família, é a aposentadoria do trabalhador rural. Ela custa, hoje, em termos de transferência de renda, três vezes o Bolsa-Família, ela é mais de R$ 100 bilhões. O Bolsa-Família, com o reajuste que a gente fez, está em torno de R$ 30 bilhões. Outro programa criado, já no governo FHC, em 1996, foi o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Isso dá R$ 50 bilhões, quase o dobro, uns 60% a mais que o Bolsa-Família.

Não foi o Bolsa-Família que reduziu a pobreza?
Ele não tira ninguém da miséria, mantém as pessoas com condição de comer. Os programas de transferência de renda, somados, dão R$ 180 bilhões. O Bolsa-Família é a sexta parte disso.

Mas a aposentadoria dos trabalhadores rurais não é uma das causas do déficit da Previdência?
Eu sou contra acabar com a aposentadoria do trabalhador rural. Vai ser uma tragédia econômica e social para o país. O que eu acho é que pode-se trabalhar mais a questão da contribuição, ampliar um pouco a contribuição, criar uma forma de contribuição efetiva para ter aquele benefício depois.

Como o senhor vê esse debate da reforma da Previdência?
É uma discussão que precisa ser feita. A idade é uma questão que tem que ser pensada, porque nós temos hoje a população vivendo muito mais. Cuba, 10 anos atrás, aumentou a idade para mulher com 60 e homem com 65 anos. E não teremos futuro nenhum, nem com a PEC do Teto de gastos ou sem a PEC, se o país não crescer rápido.

O senhor acha que tem gente que quer antecipar esse debate eleitoral de 2018?
Política tem uma coisa chamada ansiedade, algo extraordinário. Iniciam-se pesquisas e várias outras coisas. Isso não interessa para o governo. O governo quer ter a base unida, e isso é fator desunião da base.

Tem gente defendendo que o PMDB faça uma aliança com o PSDB daqui a dois anos.
Tudo evolui muito, o PMDB não está muito acostumado a ter candidato ao Planalto.

O PMDB tem algum nome forte que possa concorrer à Presidência?
O nome que o PMDB tem mais forte é o Michel, e ele disse que não será candidato.

Alguma chance de o Temer rever essa decisão?
Estamos em uma arca de Noé. Se afundar a arca, todos afundam juntos. Se o governo do Michel fracassar, que é um problema muito grave, acabou. Para mim ele disse que não será candidato em hipótese nenhuma. Então estou acreditando nele.

A Lava-jato ainda vai fazer muitos estragos dentro do governo?
Acho que ela tem que ir até o fim. A única chance que temos de renovar a política brasileira, ter credibilidade. Se abortarem a Lava-Jato, vai ficar um clima insuportável do ponto de vista político. Ela tem que ir até o fim, ver quem é quem.


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