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Estado de Minas

PT tenta trazer ex-presidente Mujica para comemoração dos 35 anos do partido

Convidado de honra da celebração dos 35 anos do PT, presidente do Uruguai tem muito a ensinar aos líderes petistas. Austeridade e enfrentamento aberto de questões polêmicas estão na lista


postado em 05/02/2015 06:00 / atualizado em 05/02/2015 07:44

Na festa de 35 anos do PT, a estrela deve ser importada. Um simpático senhor de quase 80 anos sem pompa e protocolo é o convidado de honra. O PT tenta trazer José Alberto Mujica Cordano, o popular Pepe Mujica, presidente do Uruguai, para o evento em Belo Horizonte, nesta sexta-feira (6), às 18h, no Minascentro. O partido já divulgou nota sobre a vinda, mas informou que a presença do presidente uruguaio na capital mineira só será oficialmente confirmada hoje. Se vier, Mujica – que encerra o governo no fim do mês – terá a companhia da presidente Dilma Rousseff e de seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Depois de cinco anos de governo e elogiado por comandar o pequeno país da América do Sul sem fazer concessões às ideias conservadoras, Pepe pode aproveitar a visita para deixar algumas lições ao atual governo brasileiro. Ex-militante tupamaro, Mujica levou seis tiros, ficou preso 15 anos, sendo 11 em uma solitária, e antes de ser presidente foi deputado, senador e ministro da Agricultura. Um dos principais legados que deixa aos políticos brasileiros é o exemplo de austeridade. Ele não mora no palácio Suárez y Reyes, residência oficial e segue vivendo em sua chácara no Bairro Paso de la Arena com a esposa, a senadora Lucía Topolansky, ex-guerrilheira e uma das mais ativas políticas da Frente Ampla (FA), partido do presidente.

Cerca de 90% do salário de Mujica, equivalente a R$ 25 mil, é doado a um programa de moradia. Depois que deixar a presidência, continuará indo para o trabalho no Senado – posto para o qual foi eleito com a maior votação do país – com seu VW Fusca azul de 1978, o único bem que tem em seu nome.

Em março, começa a administração de Tabaré Vásquez. O próximo presidente antecedeu Mujica entre 2005 e 2010 e foi o primeiro a romper com o bipartidarismo entre o Partido Nacional (Partido Blanco) e o Partido Colorado, que se revezavam historicamente no comando. Tanto Tabaré quanto Mujica pertencem à Frente Ampla. O mandato dura cinco anos e não há reeleição. Vázquez terá, assim como Mujica e ele próprio em seu primeiro mandato, a maioria parlamentar. A coalizão de esquerda elegeu 50 dos 99 deputados e 15 dos 30 senadores.

Outra lição de Mujica é o enfrentamento aberto de questões polêmicas, que levou a atos como a legalização do aborto, da maconha e do casamento homossexual. No caso da maconha, a decisão foi tomada mesmo sem apoio da população. Uma pesquisa de dezembro de 2013 aponta que somente 24% da população aprovou a decisão de liberar o cultivo e o consumo da maconha. Mas o presidente uruguaio já declarou que se orgulha mesmo é de ter conseguido reduzir a pobreza. Antes de 2005, quando Vázquez assumiu, 39% da população vivia abaixo da linha de pobreza, e hoje, apenas 11%.

A capacidade de tomar decisões contra posturas conservadoras é outro ensinamento que Mujica pode deixar aos petistas na festa de aniversário de amanhã. “O PT precisa fazer várias coisas diferentes e saber melhor o momento de fazer enfrentamentos”, aponta o professor da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), Guilherme Simões Reis. Porém, Reis destaca que não é apenas uma questão de ser bom de lábia ou simpático: “Há uma série de limitações”.

O professor considera que o PT e a Frente Ampla, partido de Mujica, são muito parecidos. “Inclusive na origem, com a junção de diferentes vertentes de esquerda e combate do conservadorismo”, destaca o professor. As diferenças, entretanto, ajudam a compreender por que os governos são tão distintos. No Uruguai, explica Reis, com o crescimento da Frente Ampla, o sistema político passou a ser de três partidos. “A Frente consegue o voto de metade da população uruguaia e, inclusive, a maioria legislativa. Já o PT precisa formar coalizões com partidos conservadores para conseguir governar”, entende o professor.

Reis, entretanto, considera que não é apenas uma questão externa aos partidos. Ele avalia que, no PT, os setores mais pragmáticos do partido dominam a legenda, enquanto a tendência mais à esquerda está encolhendo, com saída de nomes históricos. “Um partido que está há muito tempo no governo atrai gente de fora e, assim, perde a pureza de esquerda”, avalia.

Já na Frente Ampla, o grupo mais à esquerda, cujo principal símbolo é Mujica, é majoritário da legenda. O próximo presidente, Tabaré Vázquez, pode ser encaixado no centro, segundo Reis, enquanto o futuro vice-presidente, Danilo Astori, representa a ala dos pragmáticos da legenda. “A esquerda disputa e consegue a supremacia”, ressalta o professor.

Vale destacar que o Uruguai tem apenas 3 milhões de habitantes – ante mais de 200 milhões de brasileiros. Além das questões políticas e do estilo de governar, esteve ao lado de Mujica um crescimento econômico médio anual de 6,4% nos últimos sete anos e o menor índice de percepção de corrupção da América Latina, de acordo com a ONG Transparência Internacional.

DIFERENÇAS O professor do Departamento de História da UFMG Rodrigo Patto destaca que, apesar das semelhanças entre o PT e a Frente Ampla, as diferenças dos sistemas políticos dos dois países são fundamentais. “O Mujica contou com uma estrutura partidária sólida. No Uruguai, os cidadãos se identificam com os partidos”, explica Patto. O professor entende que o Uruguai tem uma estrutura política mais semelhante com os países europeus do que da América Latina.

 “Mujica tem um carisma próprio, um personagem peculiar, que anda de Fusca, mora no sítio, foi prisioneiro político, mas está inserido no contexto uruguaio e não faz concessão à direita porque não precisa”, analisa Patto. Para o professor, no Brasil é diferente e na história do país são raros os presidentes que conseguiram governar com tranquilidade em relação ao Congresso. “Se pudéssemos copiar algumas coisas, seria ótimo, principalmente, um sistema partidário mais claro, pois muito da corrupção está ligado à dificuldade de governar por falta de partidos sólidos, já que são usados subterfúgios para conseguir apoio”, avalia.


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