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Estado de Minas

Mulheres já são um terço dos usuários de crack no Distrito Federal


postado em 06/03/2012 09:51 / atualizado em 06/03/2012 10:35

Na política, as mulheres conquistaram voz há 80 anos, quando o Código Eleitoral as incluiu, por meio do voto, no processo democrático. A Constituição de 1988 igualou direitos e deveres entre gêneros. Mas, muito antes, elas se destacavam nas artes, nas ciências. Em 1885, Chiquinha Gonzaga regeu uma orquestra. Dois anos depois, Rita Lobato Velho foi a primeira mulher a formar-se médica. Há quase dois séculos, a imperatriz do Brasil, Maria Leopoldina Josefa Carolina, casada com Dom Pedro I, criticou o próprio marido e teve forte influência na proclamação da independência. Há dois anos, os brasileiros aprenderam a chamar uma mulher de presidenta.

Na próxima quinta-feira, Dia Internacional da Mulher, quando milhares delas prestarão homenagem às 129 operárias que morreram em 1857 (Nova York) porque brigavam pela redução da jornada de trabalho e pelo direito à licença-maternidade, algumas não terão vitórias a festejar ou conquistas a planejar. Elas são mães, mas não cuidam dos filhos. Muitas são donas de casa, mas moram na rua. O alimento dos seus sonhos cabe em um cachimbo. É uma combinação de cocaína com bicarbonato de sódio, amônia, água destilada e, às vezes, solução de bateria. Suas fantasias duram 10 segundos. Os pesadelos são persistentes.

O caminho das mulheres de pedra passa inevitavelmente pelo submundo do crime. O consumo do crack arrebenta as usuárias e se torna um problema social porque é combustível para a violência. Na fissura pela manutenção do próprio vício, elas se envolvem em furtos, roubos, tráfico e prostituição. Muitas vezes, passam a figurar também nas estatísticas de homicídios. E, o pior, mergulham cada vez mais cedo na criminalidade.

Levantamento realizado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT)nos últimos três anos mostra que a presença de adolescentes envolvidos em tráfico de drogas não para de aumentar. Há dois anos, 317 jovens foram flagrados vendendo entorpecentes, o que gerou a abertura de processos na Justiça. No ano passado, o número saltou para 795. A proporção de meninas nesse universo é de cerca de 5%, segundo o promotor Renato Barão Varalda, da Promotoria de Justiça da Defesa da Infância e da Juventude. Os dados foram reunidos nas varas da Infância e da Juventude de Brasília e de Samambaia.

Os exemplos desse ambiente de criminalidade entre crianças e adolescentes se espalham pelas ruas da capital. Na noite da última quinta-feira, carros faziam fila para percorrer uma via mal iluminada na QNN 3, Conjunto M, em Ceilândia Norte. O motivo do trânsito lento circulava entre os veículos: pelo menos duas adolescentes com menos de 15 anos carregavam pacotinhos. Despreocupadas, rapidamente elas se aproximavam da janela do veículo, entregavam a encomenda e pegavam o dinheiro. Na esquina, um homem recebia as notas e repassava mais material para abastecer os viciados em busca da pedra.

Normalmente, as meninas servem de avião (responsável pelo repasse de pequenas quantidades de droga) em troca da própria substância. Os traficantes usam as adolescentes nessa atividade e, em geral, envolvem-se sexualmente com elas. O promotor Renato Varalda confirma a realidade. “A maioria das meninas que pratica o ato infracional relacionado com drogas está envolvida emocionalmente. Se está usando, é porque o namorado consome. Se está traficando, é por influência do companheiro”, diz.

Atendimentos
Os casos que param nas estatísticas judiciais muitas vezes são acompanhados de perto pelas instituições e entidades ligadas à questão das drogas entre crianças e adolescentes no DF. O órgão oficial que faz essa assistência é o Centro de Pesquisa, Capacitação e Atenção ao Adolescente e Família (Adolescentro). É responsável por fazer o acolhimento e avaliar as necessidades de usuários, oferecendo terapias e fazendo acompanhamento clínico, psiquiátrico e psicológico.

A maior parte das cem entradas mensais tem relação com a maconha. O crack é minoria (5% a 6%), mas causa preocupação. “Quando chega aqui um usuário de crack é porque a situação já é complicada. Afinal, os seus efeitos no adolescente são mais rápidos e drásticos”, explica a gerente do Adolescentro, a psicóloga Michele Falcão.

As meninas representam um terço dos atendimentos da unidade e, no caso das usuárias da pedra, a reincidência é alta, ficando acima dos 50%. Elas são mais frágeis do que os meninos e dificilmente conseguem deixar o vício. “Mas isso não quer dizer que elas são irrecuperáveis. A taxa de recaída é grande, mas a abstinência total também é um processo. É muito importante o envolvimento da família. Além disso, é preciso trabalhar em conjunto com a escola, a sociedade e o Estado. O crack é um problema muito complexo”, avalia.

O Adolescentro registrou um recorde no atendimento de menores de 18 anos na unidade: uma menina de 9 viciada em crack. Ela deu entrada há seis meses e ainda está em acompanhamento. “É uma idade frágil e ela corre sérios riscos. Precisa ser acompanhada de perto por uma equipe multidisciplinar. É muito preocupante a relação de crianças tão novas com uma droga tão perigosa como o crack”, explica Michele.


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