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Estado de Minas

No Ártico canadense, cultura Inuit está ameaçada pelo aquecimento


postado em 09/10/2015 20:31

Em Umiujaq já não existem mais longas temporadas de caça e pesca no gelo. Nos povos isolados do Grande Norte do Canadá, o desajuste climático é sentido dramaticamente, o que complica ainda mais a vida das comunidades inuit que lutam para preservar suas últimas tradições.

"Adoro a pesca no gelo e as ovas de pescado. Mas a pesca só é possível durante algumas semanas porque rapidamente torna-se perigosa", lamenta Nellie Tookalook, que vive nesta região do fim do mundo, situada na costa oriental da baía de Hudson, numa região subártica que torna-se duas vezes mais quente do que o restante do planeta.

O inverno, que antes chegava em outubro ou novembro, agora "é mais tarde, a neve derrete mais rápido, as renas desapareceram...Em muitos aspectos o aquecimento global tem um impacto negativo", conta essa mãe de família que dá aulas em inuktitut, a língua local, na escola do povoado.

No início do outono, os raros visitantes de Umiujaq são recebidos por um pelotão de escavadeiras. A estrada do pequeno aeroporto entrou em colapso devido ao derretimento do permafrost, a camada do solo permanentemente congelada nas regiões polares.

As obras são vitais. Esta comunidade de 400 habitantes, situado a quatro horas de voo de Montreal, só está conectada com o restante do mundo por avião.

Perto do aeroporto, várias dezenas de casas de madeira colorida formam esta aldeia nascida há menos de 30 anos. A delegacia de polícia, uma dispensa, duas lojas, duas igrejas, uma torre de telecomunicações, uma estação de rádio comunitária e vários lixões a céu aberto.

O rápido crescimento demográfico requer uma construção constante de novas casas.

"Por causa do permafrost, são lançadas as bases e depois é preciso esperar um ano antes de construir", explica Noah Inukpuk, funcionário da prefeitura.

Em Umiujaq, as paredes estão rachadas. Em Salluit, mais ao norte, o quartel de bombeiros desmoronou.

Os primeiros danos apareceram no início dos anos 2000, explicam na Transports Québec, onde são controlados os revestimentos dos aeroportos que salvam do isolamento os 11.000 habitantes desta região sem estradas.

Os solos mas também as espécies, a vegetação, os regimes hídricos, o manto de neve...tudo mudou.

O limite das árvores remonta implacavelmente para o norte. Em torno de Umiujaq, no interior, alguns pinheiros substituem pouco a pouco musgos e líquens. E com eles chegam também aves, marmotas e até sapos.

A região descobre as ondas de calor e os mais velhos já não conseguem prever o tempo. "Ano passado fez 30°C", explica Anita Inukpuk, de 22 anos. "É demais para mim".

Lucassie Cookie, um pescador de 47 anos, explica que "quando faz calor, os peixes ficam no fundo. E depois chegam os mosquitos e as moscas pretas", muito agressivas.

- Turismo e mirtilos -

Mas para os inuit, cuja língua tem mais de 20 palavras para neve, o mais cruel é o retrocesso do inverno, que perdeu quase dois meses.

Logo o banco de gelo voltará a formar-se na baía de Hudson, para uma estação provavelmente ainda um pouco mais curta.

O gelo chega cada ano mais tarde, perde espessura, rompe antes. Recentemente, um caçador caiu num buraco enquanto andava com sua snowmobile.

Os inuit terão mais dificuldades para encontrar focas, vítimas também do declive da capa de gelo, ou algumas baleias ameaçadas pela aparição de predadores como a orca na baía, segundo os especialistas.

"Minha avó me dizia que um dia não haveria mais neve. Hoje acredito nela", explica Lucassie Tooktoo, de 50 anos, que ensina cultura local às crianças da escola.

Isso poderia acabar com a cultura inuit, já afetada por 50 anos de transformações, sedentarismo, perda de pontos de referência, problemas de emprego e alcoolismo?

"Sim, poderia desaparecer gradualmente", teme Lucassie Tooktoo. "E não apenas pelo clima. Foram permitidas tantas coisas...mas o clima não podemos controlar".

O idoso Charlie Tooktoon está enojado: "Se temos que mudar mudaremos, mas as coisas vão tão rápido!".

Enquanto isso, as comunidades tentam vislumbrar algumas oportunidades, como o turismo, que agora é praticamente zero em Umiujaq - onde nos últimos meses um parque natural foi estabelecido.

"Mas é necessário que os lucros as beneficiem [as comunidades, ndlr], e não as companhias" marítimas, alerta Louis Fortier, diretor da Arcticnet, uma rede científica que intervém nestas regiões.

Outra saída pode ser a exploração de mirtilos e cogumelos, facilitada pelo aumento das temperaturas.

A condição de que "as comunidades as aproveitem", diz o pesquisador, acrescentando que esta região poderia ser rica em lições para os países do sul, também afetados pelas múltiplas consequências do aquecimento global.


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