Rumo ao confronto
Símbolo da luta palestina contra a ocupação, os assentamentos e, em especial, contra o muro de separação erguido por Israel na Cisjordânia, Bil'in ficou conhecida mundialmente por causa do filme 5 câmeras quebradas (5 broken cameras, em inglês), uma coprodução palestino-israelense premiada em festivais internacionais e indicada ao Oscar de melhor documentário em 2013.
Ao som de tambores, a marcha se inicia saindo da vila em direção aos campos de oliveiras e ao muro que contorna o assentamento israelense vizinho, confiscando, em seu percurso, boa parte da terra cultivável da vila árabe. Sob o argumento de se proteger contra atentados, o governo de Israel iniciou a construção da barreira em 2002, no auge da Segunda Intifada, revolta palestina contra a ocupação. O trecho em Bil'in começou a ser erguido em 2005. Segundo o B'Tselem, Centro de Informações Israelense para Direitos Humanos nos Territórios Ocupados, apesar de a “fronteira” entre Israel e a Cisjordânia, a chamada linha verde de 1967, ter uma extensão de 320 quilômetros, a barreira de separação se estende por mais que o dobro, totalizando 680 quilômetros construídos.
Em sua maior parte, a barreira é feita de cercas eletrificadas de 2 metros, acrescida de valas e arame farpado. Em zonas industriais, áreas de maior densidade populacional ou em áreas de assentamento, porém, foi erguido um muro de concreto de 8 metros. A um custo de construção de mais de US$ 2,5 bilhões, somados a mais de US$ 250 milhões anuais de manutenção, 85% da barreira de separação está construída em áreas da Cisjordânia, anexando terras palestinas de maneira a incluir colônias israelenses em seu traçado.
Ao se aproximar do muro, a manifestação é recebida pela polícia de fronteira israelense, que, com tropas em solo e veículos blindados, lança um grande volume de gás lacrimogêneo. Na lei militar israelense, protestos em áreas palestinas com 10 ou mais pessoas são ilegais e passíveis de uso de força para sua dispersão. Com os mais jovens liderando a aproximação, a manifestação se transforma numa batalha campal. Soldados equipados disparam gás e balas de borracha, enquanto vários dos manifestantes se valem de fundas para lançar pedras. Por vezes, os ativistas correm aos gritos de “tutu”, do inglês “two two”, se referindo a disparos de munição real calibre 22. Em cerca de uma hora e meia de confrontos, o saldo é de três feridos, levados por ambulâncias, e quatro ativistas detidos, um palestino e três israelenses, que serão soltos horas depois.
Palestino, meio brasileiro
No filme 5 câmeras quebradas, são várias as referências ao Brasil. Marcando presença na vila, filmando os protestos com a sexta câmera em mãos, Emad Burnat, o diretor palestino, fala português o suficiente. “Sou meio brasileiro, tenho documento”, afirma ele, que é casado com a palestina e gaúcha Soraya, que também aparece no documentário. Segundo ele, muitas pessoas da região de Bil'in imigraram para o Brasil, inclusive um avô. “Tenho dois tios no Rio Grande do Sul”, completa. Seu filho mais novo, Gibreel, um dos personagens principais do filme, fala português e “é palmeirense, já foi ao campo em São Paulo”. Sobre os 10 anos de protestos em Bil'in, ele conta que a situação ainda é difícil. “Não adianta apenas uma vila protestar. É preciso que muitas cidades façam isso e não apenas por um dia, mas todos os dias, em todos os lugares.” Mostrando ser um homem de paz, em seu escritório, numa estante ao lado das cinco câmeras quebradas que deram nome ao filme (a terceira câmera ainda com um adesivo com a bandeira do Brasil), ele guarda uma caneca do Grêmio, ao lado de outra, do rival Internacional. “Torço para todos”, conclui sorrindo.