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Estado de Minas

Mistério no regime da Coreia do Norte

Analistas veem na execução do tio do ditador Kim Jong-un uma manobra sem precedentes para consolidação do poder


postado em 14/12/2013 00:12 / atualizado em 14/12/2013 08:56

A execução sumária de Jang Song-thaek, tio do ditador norte-coreano, Kim Jong-un, surpreendeu analistas, provocou pesadas críticas dos Estados Unidos e lançou mais dúvidas em torno do enigmático regime comunista. Especialistas em Pyongyang divergem sobre os impactos da punição a Jang no âmbito da política interna. A agência de notícias sul-coreana Yonhap divulgou fotos nas quais o tio de Kim aparece com as mãos amarradas, em um tribunal militar especial, pouco antes de ser morto.


Casado com a irmã de Kim Jong-il, pai do atual mandatário norte-coreano, Jang ocupava a Vice-Presidência da Comissão de Defesa Nacional, a instância mais poderosa do país. Segundo a agência local KCNA, ele tentou “minar o Estado com todo tipo de intriga e métodos depreciáveis, e (mostrou) uma ambição selvagem por tomar o poder supremo do nosso partido (dos Trabalhadores) e do Estado”. A morte de Jang poderia indicar a consolidação de Kim Jong-un como déspota, reforçando seu controle absoluto, ou denunciar um governo instável, o que abriria espaço para dissidências e conspirações.


Washington reagiu com preocupação. “Se for confirmada (a execução de Jang Song-thaek), é outro exemplo da brutalidade extrema do regime da Coreia do Norte”, afirmou a porta-voz do Departamento de Estado Marie Harf. Na segunda-feira, quando Kim demitiu o tio, a presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye, referiu-se ao regime do país vizinho como um “reinado do terror”. “A Coreia do Norte está envolvida num reinado do terror, realizando uma limpeza em larga escala, a fim de fortalecer o poder de Kim Jong-un. As relações entre o Sul e o Norte podem se tornar mais instáveis”, advertiu. Enquanto Tóquio teme a radicalização de Pyongyang, Pequim adota o silêncio: os chineses consideram a execução um “tema doméstico”. Jang mantinha altos contatos com a China.


A KCNA assegurou que a corte militar examinou os crimes de Jang, que “foram provados no decorrer da audiência e admitidos” pelo réu. “É uma obrigação elementar do ser humano retribuir a confiança com senso de obrigação e benevolência com lealdade. No entanto, a desprezível escória humana Jang, que foi pior do que um cão, praticou atos de traição”, comentou o governo. Diretor do Centro para Estudos Coreanos da Columbia University (em Nova York), Charles K. Armstrong afirmou que a intenção de Pyongyang foi indicar que Kim Jong-un segue no controle absoluto do país. “É provável que Kim tenha pensado que o tio acumulava poder demais por conta própria e, por isso, precisava ser detido”, explica. “Talvez Kim temesse que Jang ficasse forte o bastante para usar o sobrinho como fantoche. E tentou impedir que isso ocorresse, removendo-o e substituindo-o por partidários.”


Michael Madden, editor do site NK Leadership Watch, lembra que, mesmo depois de ser demitido, no domingo, o tio de Kim continuava sendo uma ameaça à autoridade do ditador. “Jang era um dos poucos membros da liderança do país que poderiam perseguir um golpe bem-sucedido. A execução dele envia uma mensagem de alerta às elites norte-coreanas sobre o risco de desafiar Kim. Mas ainda é preciso apurar se essa medida significa força ou fraqueza”, comentou, em entrevista por e-mail. Para o especialista, a China foi pega desprevenida com a demissão e execução de Jang. “Existe a possibilidade de que membros da cúpula de Pequim tenham apoiado Jang em confrontar Kim”, disse.


Segundo o britânico-coreano Sokeel Park, diretor de pesquisa da ONG Liberty in North Korea (Link), a execução transformada em propaganda não tem precedentes na história da Coreia do Norte. “A mensagem pública foi desenhada para mostrar que o poder absoluto de Kim não pode ser desafiado. Nas entrelinhas, ela revelou fraqueza e divisão no mais alto nível do regime. Um indicador de que o ditador tem sido ineficiente em gerenciar a competição interna e a política de facções”, disse.

 

A palavra-chave

O acerto de contas a ponta de sabre na Coreia do Norte apenas acrescenta variáveis no cenário instável de uma área especialmente crítica. A execução do tio de Kim Jong-un, com enredo um tanto shakespereano, se sobrepõe às tensões diplomático-militares entre China, Japão e Coreia do Sul, que mobilizam forças em torno de um punhado de ilhas e uma rocha submersa – um litígio entre muitos nas águas revoltas do Pacífico. Instabilidade, por sinal, é a palavra-chave para descrever não apenas a reclusa semimonarquia comunista, ainda aos solavancos na transição para a terceira geração da dinastia Kim. O jovem Jong-un é ainda uma incógnita para os vizinhos e demais interessados, como Estados Unidos e Rússia. O futuro de um Estado militarizado até a medula e dotado de arsenal nuclear inquieta de imediato a outra metade da Península Coreana, onde a primeira mulher a chefiar o governo apenas começa a exercitar sua liderança. Também a China emite sinais de que a ascensão de Xi Jingping é algo mais que uma troca de nomes. E a demonstração ostensiva de poderio aéreo e naval não se confina à zona de defesa recém-proclamada por Pequim: a mensagem é de que uma nova potência está em campo. Sobram variáveis em uma equação que desafia os cálculos dos estrategistas. (Silvio Queiroz)

 

 

 


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