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Estado de Minas

Caçada a pokémons tira jovens de casa e os leva para espaços públicos

Saídas podem incentivar atividades físicas, mas é preciso tirar o olho do celular, dizem especialistas


postado em 07/08/2016 06:00 / atualizado em 07/08/2016 07:25

A família Woldaynsky em passeio-caçada na manhã de ontem na Praça do Papa: sem o jogo, as meninas mais velhas teriam preferido ir a um shopping (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press )
A família Woldaynsky em passeio-caçada na manhã de ontem na Praça do Papa: sem o jogo, as meninas mais velhas teriam preferido ir a um shopping (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press )

Conhecer ou reconhecer parques de Belo Horizonte. Subir serras da capital ou se sentar pela primeira vez na Praça da Savassi. Febre que invadiu o país na última semana, o game Pokémon Go trouxe aos jogadores experiências que vão muito além de caçar “monstrinhos”. Para satisfação de muitos pais, os filhos, que antes viviam trancados dentro de casa “ligados” nos jogos de computador e passavam fins de semana sem olhar a rua, agora são companhia para caminhadas e passeios em família, pois passaram a enxergar o “mundo real” como uma possibilidade de encontrar os bichinhos virtuais. Embora haja riscos como acidentes e o vício na tecnologia, a mudança no comportamento, segundo especialistas, pode ser o primeiro passo para a nova geração deixar o sedentarismo e ampliar seu olhar sobre a cidade.

Lançada há um mês nos Estados Unidos pela desenvolvedora norte-americana Niantic, a nova mania chegou ao Brasil na quarta-feira e, desde então, é rodeada de polêmica. Isso porque, com a caçada aos pokémons no game, que usa uma sobreposição de figuras virtuais com imagens reais captadas pela câmera – a chamada realidade aumentada –, os “monstrinhos” ficam em parques, ruas e casas. E já houve registro de acidentes e roubos de celulares. Por outro lado, o jogo tem lá seus benefícios, destaca o cardiologista Marconi Gomes da Silva, membro diretor da Sociedade Mineira de Medicina do Exercício e do Esporte e membro do Comitê de Cardiologia do Esporte da Sociedade Mineira de Cardiologia. “Para tirar as pessoas de casa, a novidade dá conta de fazer isso muito bem, o que pode ser o primeiro passo para que os jovens descubram as estruturas que a cidade oferece”, afirma.

Entretanto, ainda que os caçadores de pokémons andem mais, para o especialista isso não quer dizer que estejam fazendo uma atividade física. “O jogador não está concentrado no exercício e tampouco consciente sobre ele. Essa caminhada é de baixa intensidade e insuficiente para que se tenham ganhos objetivos em termos de condicionamento físico”, afirma. As crianças e os adolescentes – público-alvo da brincadeira – precisam, segundo ele, de exercícios mais intensos, e sair à caça de pokémons não vai cumprir essa meta. “Mas a grande vantagem é fazer com que eles saiam do estado inativo, de não fazer nada e ficar só no sofá.”

Lado bom que, segundo a empresária Sionara Freire, faz toda a diferença. Ontem, ela e os filhos Gabriela, de 11 anos, e Ruan, de 16, foram juntos para a Praça do Papa, na Zona Sul de BH. A empresária foi fazer sua atividade física e os garotos, caçar pokémons. “Eles não me faziam companhia em atividades assim. Ruan só ficava em casa jogando no computador. Agora, eles querem sair, ir a parques e caminhar”, comemora. Os três, inclusive, tinham planos de subir a Serra do Curral.

Num sábado de manhã, por exemplo, as irmãs Joana Woldaynsky, de 13, e Laura Woldaynsky, de 16, estariam em shoppings caso não existisse o game. “Agora, elas até toparam sair conosco e sugeriram a Praça do Papa”, comemora a madrasta das irmãs, Ana Paula Woldaynsky. Segundo Laura, além de passear mais pela cidade, ela tem feito novas amizades ao caçar pokémons. “Mas tudo tem que ter responsabilidade”, afirma Laura. E a madrasta completa: “Fico preocupada porque estão saindo por causa de uma motivação virtual.”

E esse é um ponto levantando pelo pediatra Paulo Poggialo, ex-presidente da Sociedade Mineira de Pediatria e ex-vice-presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria, além de coordenador do setor de Neonatologia do Hospital Mater Dei. “Vemos com preocupação o fato de as crianças serem induzidas a uma busca incessante, correndo riscos de acidentes”, diz, comentando que o excesso de tablets, celulares e dispositivos eletrônicos priva os jovens de atividades físicas. “A criança precisa sair de casa para brincar e não para ficar presa a um aparelho eletrônico. Trata-se de uma coisa ‘mastigada’, o que não a faz criar.” Ele aponta que a disputa por quem captura mais “monstrinhos” pode não ser tão saudável. “Cria-se uma rivalidade”, alerta.

Embora seja uma novidade, a psicóloga e pedagoga Sheila França reconhece que a saída de casa é um benefício para crianças e adolescentes. Porém, alerta que é necessário fazer dessa brincadeira algo mais saudável. “Pode ser benéfico ir às praças e aos parques. Mas não adianta a criança ir sem interagir com a família, conversar, e ter uma vida social. O jogo não pode ser usado em excesso, como temos visto. As crianças estão o tempo todo usando o celular, na saída e na entrada da escola, e, com isso, ficam mais dispersas e propensas aos riscos”.

DESLIGAR-SE O ideal, de acordo com o cardiologista Marconi Gomes, seria que, ao sair de casa, os jovens pudessem, depois de jogar, descobrir o lugar onde estão por meio de atividades reais. “Quando acabar a bateria do celular e eles estiverem em uma praça, o bom seria se pudessem aproveitar a quadra de futebol, brincar de ‘pega-pega’ dos velhos tempos”, afirma, dizendo que o Pokémon Go pode ser uma engrenagem interessante para a sociedade, mas ir adiante é deixar o aparelho eletrônico de lado e curtir o espaço ao redor.

Na manhã de ontem, as irmãs Raíssa Avelino, de 19, e Aniele, de 13, moradoras de Contagem, conheceram a Savassi, em BH. Elas contam que não saíam de casa e, com o jogo, resolveram acompanhar os pais pela Savassi e, assim, conheceram esse ponto turístico. Sem largar o tablet e o celular, as duas disseram estar mais animadas para a atividade física e pensam até em comprar uma bicicleta para ir a lugares mais distantes e caçar mais “monstrinhos”. “Por isso, é uma engrenagem. Enquanto houver bateria, eles vivem o mundo virtual. Entre uma recarga e outra, é hora de ver a vida no mundo real”, defende Marconi Gomes.


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