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Estado de Minas

Conheça as muitas esquinas que Fernando Brant percorreu e encantou em BH

Da Travessia da Praça da Liberdade, cuja alameda imortalizou seu talento, passando por Santa Tereza e por esquinas menos famosas, como as do Bairro Cachoeirinha, o roteiro que o poeta fez pela cidade incluía pontos da boemia que ficaram um pouco mais tristes com sua partida


postado em 21/06/2015 06:00 / atualizado em 21/06/2015 09:27

A travessia da Liberdade, batizada em homenagem a música homônima, e o poeta no coreto da praça: identidade(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press.)
A travessia da Liberdade, batizada em homenagem a música homônima, e o poeta no coreto da praça: identidade (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press.)

Fernando Brant, o filho do Moacyr e da Yolanda, fez poesia das pessoas e dos bichos. Como poucos, o compositor que partiu na semana passada deu sentimento às coisas e aos lugares, em versos que vencem o tempo. Por onde passou, o mineiro de Caldas, no Sul de Minas, escreveu paisagens e assentou janela no coração e na alma das gentes. Depois de crescer moleque em Diamantina, aos 9 anos, o menino observador partiu com a família para Belo Horizonte. Da capital, Fernando fez quintal mundo adentro para suas travessuras. Em homenagem ao artista, o Estado de Minas percorreu um pedaço da BH de Brant, e esteve em muitas das esquinas do poeta. A mais famosa, seguramente a das ruas Divinópolis e Paraisópolis, no Bairro Santa Tereza, que batizou o movimento musical imortalizado por Brant e por amigos como Milton Nascimento, Lô e Márcio Borges, Beto Guedes e Toninho Horta. Mas há outras. Muitas outras cidade afora, que ajudam a contar a trajetória inesquecível de Fernando. Nelas, amigos, vizinhos, prestadores de serviços, familiares e fãs falam de um homem simples, de amor e fé em toda e qualquer alegria de viver.


''Já fiz vários serviços como bombeiro na casa dele e o considerava um amigo. Fiquei muito triste com a morte dele'' - José Nelson, o 'Zé Vermeio', vizinho de Fernando na Cachoeirinha (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )
''Já fiz vários serviços como bombeiro na casa dele e o considerava um amigo. Fiquei muito triste com a morte dele'' - José Nelson, o 'Zé Vermeio', vizinho de Fernando na Cachoeirinha (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )
Na Rua Grão Pará, um dos 22 endereços do Museu Clube da Esquina, o “Bar Brant” foi ponto de encontro às sextas-feiras, no Bairro Funcionários, na Região Centro-Sul. Moacyr Brant, um dos 10 irmãos do escritor, conta que Fernando era dos primeiros a chegar. “Era onde se falava de tudo um pouco, especialmente de política. O Fernando sempre se posicionou e participou ativamente em momentos importantes da história de Minas”, comenta. Moacyr, também torcedor do América, conta os dias de paixão pelo futebol ao lado do irmão no Estádio Independência. E relembra ainda, emocionado, o “Eustáquio” – fusquinha 66, vermelho, presente do irmão.


Das lições deixadas pelo irmão poeta, Ana Brant destaca o valor da família, “do chão e da origem”. “Ele amava muito a terra dele. Preocupava-se sempre em valorizar as pessoas. Conhecemos Belo Horizonte por meio do olhar dele, que sempre trouxe os amigos para dentro da nossa casa. Os amigos dele eram nossos amigos também”, diz a jornalista. Moacyr considera que de “tão belo-horizontino”, o irmão não deu conta de morar no Rio de Janeiro. “Ele pediu transferência na Faculdade de Direito e no trabalho como jornalista na revista O Cruzeiro. O Milton (Nascimento) já estava morando lá. Mas o Fernando ficou uns três meses apenas e voltou. Ele conseguiu ser do mundo morando em Belo Horizonte.”


''Ele amava muito a terra dele. Preocupava-se sempre em valorizar as pessoas. Conhecemos BH por meio do olhar dele, que sempre trouxe os amigos para dentro da nossa casa'' - Ana Brant, irmã (foto: Euler Júnior/EM/D.A PRESS)
''Ele amava muito a terra dele. Preocupava-se sempre em valorizar as pessoas. Conhecemos BH por meio do olhar dele, que sempre trouxe os amigos para dentro da nossa casa'' - Ana Brant, irmã (foto: Euler Júnior/EM/D.A PRESS)
Da janela lateral da casa da família Brant – imortalizada na canção Paisagem da janela – não se veem mais a igreja e os pássaros. Hoje, um paredão de concreto faz passado a poesia. Moacyr e Ana conduzem pelos lugares e as pessoas simples, imortalizados nas letras do irmão. Pouca gente sabe, mas a Diana, da canção de mesmo nome, é uma cachorrinha. E “Manoel, o Audaz” foi um jipe que marcou época pelas ruas e estradinhas de Belo Horizonte e região metropolitana. Os irmãos revivem também as Marias que passaram pela vida da família, homenageadas na escrita do poeta. “Tem também o motorneiro do bonde; o seu Francisco, responsável pelo cafezinho do fórum. O Fernando se inspirava nas pessoas que ele encontrava pelo caminho”, observa Moacyr.


O Bairro Cachoeirinha, na Região Nordeste, é destaque na BH do poeta. No casarão de esquina das ruas Indianópolis e Iribá, versos de amor para além da vida, ao lado da mulher e dos três filhos. Endereço de portas abertas para os amigos de outra paixão de Fernando: o cinema. O poeta participou, entre outros, do longa-metragem Amor perfeito (2006), do cineasta Geraldo Magalhães. Em passagem do filme, ele mesmo, contando histórias do Clube da Esquina. José Nelson, o “Zé Vermeio”, de 78 anos, vizinho de Fernando, diz ser difícil na vida conhecer pessoa tão gentil. “Já fiz vários serviços como bombeiro na casa dele e o considerava um amigo. Fiquei muito triste com a morte dele”, lamenta.

 

Simplicidade e encanto

''É uma perda que a gente nem dá conta de explicar. É o próprio Fernando quem mais vai fazer falta na poesia dele'' - Wallace Silva, Cabeleireiro, fã e amigo(foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )
''É uma perda que a gente nem dá conta de explicar. É o próprio Fernando quem mais vai fazer falta na poesia dele'' - Wallace Silva, Cabeleireiro, fã e amigo (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )
Outra esquina do Bairro Cachoeirinha, nas ruas Simão Tamm e Senhora Brasil, esteve por tempos no roteiro de Fernando. É o Bar do Careca, lugar da traíra sem espinha e a cervejinha de dias comuns. Pelos caminhos do escritor, não muito longe fica o salão do Gil Marciano, no Hotel Ouro Minas, na Avenida Cristiano Machado. No primeiro piso, onde Fernando tomava com gosto café sem açúcar, os profissionais choraram a morte do amigo. “Nunca estava triste. De uma educação e simplicidade de encantar. Não consigo nem falar...”, emociona-se Eliene de Deus, fã do cliente famoso.


Wallace Silva, antes do salão, onde está há 18 anos, já conhecia o compositor de outras passagens pela Quilombo, produtora de Milton Nascimento, nos anos 1980 e 1990. O cabeleireiro, fã e amigo é outro que chama a atenção para a educação e generosidade da família. “É uma perda que a gente nem dá conta de explicar. É o próprio Fernando quem mais vai fazer falta na poesia dele”, diz, com a voz embargada. Gil Marciano era quem cuidava do cabelo do poeta. O empresário já foi inclusive personagem das crônicas de Fernando Brant publicadas no EM.


“Ele cortava o cabelo de pouco em pouco tempo, porque não gostava de ver crescer o topete. Uma vez, mudei o jeito de pentear. Ele demorou a voltar e fiquei preocupado. Quando voltou, perguntei se tinha ficado aborrecido e ele disse: ‘Não acredito que eu passei a vida inteira brigando com o meu topete, penteando para o lado errado. Ficou muito bom’. E sorriu”, conta Gil. “O bom humor e a sensibilidade dele para falar e escrever vão ficar em mim para toda a vida”, pontua.

No Mercado Central, mais uma esquina de tantas amizades.(foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )
No Mercado Central, mais uma esquina de tantas amizades. (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS )

MERCADO

No Mercado Central, no Mané Doido, Fernando arrebatou o coração da família Drumond. A começar pelo Manoel Penido, o próprio Mané, que, emocionado, mal dá conta de falar sobre a partida do amigo. Fôlego retomado, o comerciante aposentado elogia o poeta: “Desconheço defeito no Fernando Brant. Um amigo que me trouxe muita alegria, quando lançou o livro dele no meu bar. Ele fez morada no coração do povo de Belo Horizonte”, diz. Fátima Drumond, filha do Manoel, também se emociona ao falar do compositor. “Fez caso do meu pai, fez caso de mim. O Fernando é poeta que eternizou a amizade com a Canção da América”, diz a professora, que homenageia o compositor em seu mestrado em administração.


Em outro quadrante da Avenida Augusto de Lima, em mais uma das tantas esquinas do poeta, está o Edifício Maletta. Nele, mais um caminho de encontros: a Cantina do Lucas. O advogado Márcio Santiago, de 72, companheiro de torcida e prosa, na mesa de sempre, a 19,  relembra o amigo. “Era um grande americano. Um cinéfilo apaixonado. Achava que o verso, que a poesia, estava acima dele. Tinha um respeito enorme pela palavra. Sabia da força de seus versos. Um refém da poesia. Já bebemos muita cerveja aqui”, diz. Rua da Bahia acima, na Praça da Liberdade, a alameda central tem o nome “Travessia” – homenagem à famosa canção de Fernando e Milton. Ali, no coração de BH, ficou a homenagem ao poeta que tinha BH no coração.

 

 

 


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