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Estado de Minas

Em crise financeira, UFMG prepara restrição às aulas de campo

Depois de cortar material de limpeza, segurança e reduzir água, cortes chegam às classes da área de ciências biológicas ministradas fora. Meta é evitar novas horas extras


postado em 17/03/2015 06:00 / atualizado em 17/03/2015 07:19

Em reação às restrições, que obrigam funcionários e estudantes a levar até papel higiênico, alunos promoveram protesto ontem com aula aberta diante do prédio da reitoria(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)
Em reação às restrições, que obrigam funcionários e estudantes a levar até papel higiênico, alunos promoveram protesto ontem com aula aberta diante do prédio da reitoria (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)

Falta de tudo um pouco: de produtos de higiene a aulas práticas. Alunos e professores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) têm sentido na pele os efeitos do corte orçamentário que atingiu em cheio a educação no país. Ontem, houve protesto no Pampulha. E estudantes organizam outra manifestação, na quinta, contra a redução de R$ 30 milhões nas verbas previstas para a instituição. Agravados pela diminuição de repasses mensais por parte da União, os relatos são de problemas de manutenção e de aquisição de material de consumo em vários departamentos, prejudicando ensino, pesquisa e extensão. A esperança para equacionar o problema, realidade também nas instituições públicas de ensino superior do interior do estado, é a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015, parada no Congresso Nacional.

Professor do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), Evanguedes Kalapothakis, um dos organizadores da mobilização de ontem, diz que documento recente da universidade informa sobre dificuldades adicionais, agora com aulas de campo. Elas serão reduzidas ou cortadas, para evitar pagamento de hora extra a motoristas. Ele ressalta ainda que problemas já existentes de infraestrutura terão chance remota de serem solucionados. Segundo Kalapothakis, transtornos constantes na rede elétrica têm causado perdas significativas de equipamentos caros (de cerca de R$ 1 milhão) no setor em que atua: “Picos de energia têm queimado aparelhos valiosos, de forma muito prejudicial”. Outra preocupação é com a demissão de funcionários terceirizados da segurança e limpeza. “O câmpus é escuro e muito grande e isso gera insegurança”, diz.

Essa tem sido dor de cabeça, principalmente, dos alunos, de acordo com um pesquisador da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich), que pediu para que não fosse identificado. “O alerta está geral, com orientação de ir embora quando começar a escurecer”, conta. Ele relata ainda que não há papel higiênico nos banheiros da faculdade, obrigando professores e alunos a carregar rolos na bolsa. Bebedouros estão sendo instalados em substituição aos galões de água que havia nos departamentos. Copo descartável se tornou artigo de luxo. “Algumas secretarias estão pedindo aos professores que levem copos e já adiantaram que não sabem até quando haverá café.”

A sujeira é outro item que incomoda – houve redução drástica no pessoal de limpeza –, além do mau cheiro vindo da população de gatos que ocupa a Fafich. “Os banheiros estão ficando imundos, e não jogam mais detergente ou desinfetante para acabar com o odor dos animais”, afirma. Os estudantes temem ainda corte de luz a qualquer momento. No início do mês, a UFMG informou que está com contas de água e energia em atraso. A iluminação do prédio também já está comprometida, por causa da retirada de lâmpadas das escadas e das salas de aula. “O comentário geral é de que nem na época da Ditadura as universidades passaram por situação tão difícil.”

REDUÇÃO

A crise na UFMG começou no fim do ano passado, quando a instituição sofreu um corte de R$ 30 milhões nos recursos previstos para os últimos meses de 2014, resultando na suspensão do pagamento de contas de água e luz e na demissão de funcionários terceirizados de segurança, portaria e limpeza. Para agravar a situação, a exemplo das demais instituições federais, foi surpreendida no início deste ano com novo contingenciamento, imposto pelo Decreto 8.389: em vez de receber a cada mês a décima segunda parte da verba inicialmente prevista para o ano de 2015, cada órgão terá direito mensalmente, até a sanção da Lei de Diretrizes Orçamentária, a 1/18 do total anual, uma redução de 33% dos valores que seriam repassados. Na semana passada, o Ministério da Educação (MEC) informou que pagará, a partir deste mês, 1/12 para que as instituições equacionem as dívidas.

Evanguedes Kalapothakis revela que um grupo de professores – ele frisa que eles não têm ligação com partidos políticos – está discutindo os próximos passos para que a sociedade perceba as consequências do corte na verba da universidade. Entre as medidas, eles esperam contato com pesquisadores que tenham acesso ao alto escalão do governo, além de estabelecer diálogo com os estudantes sobre os problemas, na esperança de sensibilizar a sociedade. “Essa redução nos preocupa muito, porque se a instituição nunca esteve num nível ótimo, qualquer corte, por menor que seja, tende a piorar nossa situação”, avalia o professor. “A universidade alcançou patamar de excelência significativo que leva à formação de profissionais. Qualquer medida que implique em redução da qualidade do nosso trabalho tem reflexos diretos na sociedade e problemas não percebidos de forma mediata. Acreditamos que os políticos têm consciência disso, só não entendemos por que continuam não dando para a educação o valor que ela merece.”

A UFMG foi procurada, mas não se pronunciou sobre os problemas.

 

Saiba mais

O que diz o decreto

Editado pela Presidência da República em 7 de janeiro, o Decreto 8.389 dispõe sobre a execução orçamentária dos órgãos, dos fundos e das entidades do Poder Executivo federal até a publicação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015. O texto determina as dotações que poderão ser empenhadas – o que, no caso das universidades, se traduz em recursos como os das bolsas de estudos, importação de bens destinados à pesquisa científica e tecnológica e concessão de financiamento a estudantes. O texto prevê ainda que, em vez de receber a cada mês a décima segunda parte dos recursos inicialmente previstos para 2015 , cada órgão terá direito mensal, até a sanção da lei orçamentária, a 1/18 do total anual – uma redução de um terço em relação aos valores que seriam repassados.

Entenda o caso

No fim do ano passado, a UFMG teve um corte de R$ 30 milhões nos recursos previstos para os últimos meses de 2014, resultando na suspensão do pagamento de contas de água e luz e na demissão de funcionários terceirizados de segurança, portaria e limpeza. No início do mês, a instituição assumiu oficialmente que a crise entrou no câmpus e deu sinais de que suas unidades, alunos e servidores vão sofrer com nova redução de verba da União neste início de ano. Segundo funcionários, dos 120 seguranças, 40 já foram dispensados e 20 cumprem aviso prévio. Na limpeza, as referências são de pelo menos 200 cortes e mais 100 devem ocorrer em breve.


Para agravar a situação, as instituições federais foram surpreendidas no começo do ano com novo contingenciamento, imposto pelo Decreto 8.389. O texto dispõe sobre a execução financeira dos órgãos, fundos e entidades do Poder Executivo até a publicação da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2015, ainda não votada pelo Congresso. Na prática, a universidade terá que lidar com um corte mensal de 33% nos valores anteriormente previstos.


Em fevereiro, funcionários fizeram manifestação no Hospital das Clínicas, afetado pela falta de medicamentos(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press 6/2/15)
Em fevereiro, funcionários fizeram manifestação no Hospital das Clínicas, afetado pela falta de medicamentos (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press 6/2/15)

Sem soro, gaze e antibióticos


 A crise na educação tem reflexos em outro setor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG): a saúde. Um dos cursos mais afetados pelo contingenciamento de verbas é o de medicina, totalmente dependente de recursos financeiros e insumos. “Com a promessa de que a Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares) viria para resolver nossos problemas, hoje amargamos falta de soro, gaze, dipirona e antibióticos. São insumos básicos e o desdobramento disso é o complexo Hospital das Clínicas, que não consegue mais oferecer excelência ampla”, afirma o estudante Erickson Ferreira Gontijo, de 27 anos, aluno do 6º ano.

A Ebserh, vinculada ao MEC, foi criada pelo governo federal para contratar funcionários nos hospitais universitários. Por meio do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (Rehuf), instituído por decreto em 2010, foram empreendidas ações para garantir a reestruturação física e tecnológica, além de solucionar questões relacionadas a recursos humanos. As consultas no ambulatório estão, em grande parte, suspensas, e cirurgias foram cancelas. Segundo ele, faltam recursos, mas sobra boa vontade de alunos e professores, que têm tentado driblar a crise com recursos do próprio bolso, seja comprando um ou outro material, seja por meio de horas extras que não são pagas. “Enfrentamos um verdadeiro caos, sem perspectiva de melhoras. Alunos da graduação e da residência sofrem com tal impotência, mas os que mais sofrem são os pacientes e toda a população.”

INTERIOR

Afetadas pelo Decreto 8.389, as instituições de ensino em Minas Gerais amargam, nos três primeiros meses de 2015, déficit de pelo menos R$ 40 milhões. De redução de bolsas da assistência estudantil a demissão de funcionários terceirizados, elas apertam o cinto para driblar a verba a menos no caixa. Uma dos maiores cortes é na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), no Triângulo Mineiro, que no primeiro trimestre do ano acumula déficit da ordem de R$ 12 milhões. As unidades do Centro de Educação Federal Tecnológica (Cefet-MG) estão com diversas faturas de água, luz e telefone em atraso.


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