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Estado de Minas

Vila de Cocais recebe encontro mineiro de falcoaria

Vila de Cocais, no interior de Minas, recebe encontro de falcoeiros de todo o país, que trocam experiências sobre cuidados com aves de rapina, como corujas, falcões, águias e gaviões


postado em 21/04/2014 06:00 / atualizado em 21/04/2014 08:47

Guydo gosta das aves desde criança e hoje cria Thor, um gavião-asa-de-telha de 5 anos.
Guydo gosta das aves desde criança e hoje cria Thor, um gavião-asa-de-telha de 5 anos. "Para mim, primeiro vêm as aves", diz (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)


Gaviões, águias, falcões e corujas tomaram o céu da pequena Vila de Cocais, a cerca de 100 quilômetros de BH, na Região Central de Minas. Atentos a qualquer sinal, as aves, de repente, mergulham em direção ao chão. Em vez de caçar presas, vão em busca de refúgio no braço de seus donos. Apesar de terem liberdade para voar bem longe, quando escutam o apito e avistam a recompensa, um pedaço de carne, elas retornam para o lado de seus companheiros, que lhes dão casa, comida e, se houvesse necessidade, até roupa lavada. Entre os falcoeiros, cachorros e gatos não têm vez, e quem ocupa o posto de amigo fiel são as aves de rapina. Ao longo do feriado, esses aficionados pelos animais silvestres estão reunidos na Vila de Cocais, onde ocorre o 3º Encontro Mineiro de Falcoaria, na Pousada das Cores.


A propósito, é tamanha a intimidade que as aves dormem junto dos criadores, nos poleiros dentro dos quartos, e recebem tratamento VIP, com carne de pombo abatido na hora, campos de voo, sombra e água fresca. Só não é recomendável que as aves voem juntas, pois podem atacar umas às outras. Aliás, algumas usam capuz, para ficar mais tranquilas. O evento termina hoje e conta também com a presença de participantes de outros estados. Minas é referência na arte da falcoaria, técnica de adestramento e criação de aves de rapina.

O estado abriga o primeiro clube de falcoaria do Brasil, o BH Hawking, e também a primeira entidade voltada para a preservação e conservação desses animais, a SOS Falconiformes. “Dos três criadores no Brasil credenciados pelo Ibama, um está em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, e outro em Patrocínio, no Alto Paranaíba. O relevo de Minas ajuda muito também. A vinte minutos de Belo Horizonte, sempre podemos encontrar um campo para levar as aves para voar”, conta João Paulo Diogo dos Santos, um dos organizadores do encontro e diretor técnico da BH Hawking.

Participam do evento 22 praticantes da falcoaria, dispostos a trocar ideias e experiências sobre o cuidado com os animais. Junto deles, estão 19 aves, entre corujas, falcões, águias e gaviões. “Aves de rapina são todas aquelas com bicos curvados e longos, garras pontiagudas, que se alimentam de carne e capturam suas presas”, explica João Paulo, dono de Átila, uma imponente águia chilena, e de mais dois gaviões-asa-de-telha e um falcão.

Todos vivem com ele, numa casa em Contagem, na região metropolitana, onde mantém uma parte do freezer lotada de carne de codorna e pombo. “Os vizinhos já acostumaram, e as crianças adoram quando vou alimentá-los”, diz. Os animais ficam em uma espécie de poleiro, sem gaiola, para não correr o risco de machucar as asas. Diariamente, João Paulo leva os animais para voar em campos abertos distantes da rede elétrica. “É hábito da ave de rapina ficar a maior parte do tempo parada, economizando energia”, explica.

Marcus e Nani se casam no Rio de Janeiro, em junho, e o gavião Kioto será o pajem(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Marcus e Nani se casam no Rio de Janeiro, em junho, e o gavião Kioto será o pajem (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
ORIGEM O surgimento da falcoaria é incerto, mas remete à Ásia como berço mais provável. Sua prática se disseminou na Europa, onde estava associada à subsistência e à caça. As aves caçavam e dividiam suas presas com os donos. O armamento levou a atividade ao declínio, e ela se converteu em um esporte. Mais recentemente, a atividade também se tornou aliada da aviação, com trabalho de controle da fauna em aeroportos, voltado para redução do risco de colisão entre aves e aeronaves. Também é empregada no controle de pragas em galpões e lavouras. Outra aplicação comum é em trabalhos de educação ambiental e na reabilitação de aves à vida silvestre.

No Brasil, a iniciativa pioneira na aviação ocorreu no aeroporto da Pampulha. Quem comanda o serviço por lá é o biólogo Guydo Horta, um dos participantes do encontro. Ele conta que, em 2007, o aeroporto registrava 60 colisões anuais e, hoje, esse número reduziu para 10, afastando riscos de acidentes e perdas econômicas. “A intenção é que as aves de rapina capturem as aves menores e ganhem carne como recompensa. Os animais vivos são soltos em outro ambiente”, conta Guydo.

Aos 25 anos, Guydo se diz um amante das aves desde criança. Seu xodó é o Thor, um gavião-asa-de-telha de 5 anos, que o acompanha na maior parte do dia. Num campo aberto em Cocais, mesmo fora da guia, Thor, que trabalha no aeroporto da Pampulha, parece não perder o dono de vista. “O bicho vai caçar, e a impressão é que estamos caçando junto”, conta o biólogo, que já teve problemas com namoradas por causa dos animais. “Para mim, primeiro vêm as aves.”

Gavião leva aliança em casamento


No dia 12 de junho, Marcus e Nani Estevan, de 25 e 23 anos, se casam. Num castelo em Itaipava, no Rio de Janeiro, eles trocarão juras de amor eterno e selarão a união iniciada há quatro anos. Até aí, estaríamos em um casamento comum, não fosse o fato de que o pajem, responsável por levar as alianças até o casal, será Kioto, o gavião-asa-de-telha de Marcus. A ave de rapina entrará voando, com os anéis presos às garras. “Ele é como um filho, onde vou, vai comigo”, conta Marcus. A guarda de honra do casamento será feita pelos amigos falcoeiros. Cada um estará com uma ave de rapina em punho na hora da entrada da noiva e ao longo de toda a cerimônia.

Cariocas, os dois participam do Encontro Mineiro de Falcoaria, que termina hoje, em Vila de Cocais, na Região Central. A falcoaria faz parte da vida do casal desde o início do relacionamento. “Ia para um retiro da Igreja Batista e, como não tinha com quem deixar o Kioto, levei o gavião junto. Acabei conhecendo a Nani lá”, lembra Marcus. A moça estranhou a companhia, mas acabou caindo “nas garras” dos dois. “Me apaixonei pelo Marcus e pelo Kioto”, conta Nani, que hoje é dona de três corujas e trabalha com Marcus no controle de fauna. Um de seus clientes é o Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, no Rio de Janeiro.

Além da águia, João Paulo cria dois gaviões-asa-de-telha e um falcão, em Contagem(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Além da águia, João Paulo cria dois gaviões-asa-de-telha e um falcão, em Contagem (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)


ESTILO DE VIDA
O falcoeiro Wellington Luiz, diretor do BH Hawking, clube de falcoaria da capital mineira, explica que, mais que uma arte ou esporte, a atividade é um estilo de vida. Há 12 anos no meio, os animais silvestres estão totalmente integrados ao cotidiano de Wellington. No fim de semana, o programa de praxe é levar os animais para voar em campos mais distantes. Ao encontrar com os amigos no bar, as aves vão junto. O biólogo e ornitólogo também leva suas corujas, gaviões e falcões para a sala de aula, num trabalho de educação ambiental. “As aves de rapina nos ensinam a ter dedicação e paciência, pois quem dita o tempo são elas, além de humildade para aprender com os erros e escutar correções e conselhos”, diz.

 

SAIBA MAIS: criação legal

Só é possível ter aves de rapina no Brasil com a compra de criadouros legalizados. Os animais saem com anilha e nota fiscal. O preço varia de R$ 3 mil a R$ 20 mil. O treinamento das aves de rapina começa com a fase de amansamento. Nela, o animal aprende a se acostumar com a presença do falcoeiro. O treinador mantém a ave no punho, leva para ambientes dentro de casa, próximo a carros. Quando a relação de confiança aumenta, os animais começam a treinar os voos, inicialmente com guias e, depois, soltas. Elas retornam ao punho dos treinadores quando escutam um apito e avistam a recompensa, normalmente um pedaço de carne. As aves ficam sempre com um sino preso próximo às garras, para que o falcoeiro a escute quando estiver voando. O tempo de treinamento varia de acordo com o animal e o treinador, podendo variar de dias a meses.


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