O engavetamento de sete veículos que causou a morte de cinco pessoas carbonizadas na Rodovia Fernão Dias foi consequência da combinação de vários fatores, desde a invasão de duas pistas por manifestantes não identificados para queimar pneus e forçar motoristas a parar, passando pela falta de atenção de outros condutores para o congestionamento até a falta de estrutura e efetivo da Polícia Rodoviária Federal para fiscalizar e sinalizar. Como agravante, está a ação rápida e inesperada de manifestantes durante a noite, quando a visibilidade é menor. A tragédia na BR-381 e outros problemas gerados pelos protestos nas rodovias preocupam a polícia e especialistas.
O impacto da batida destruiu um Fiesta e uma Kombi da Secretaria Municipal de Saúde de Poços de Caldas, no Sul de Minas, além de outros quatro veículos. Como o tanque de combustível e o motor da Kombi ficam na parte de trás, houve explosão e incêndio. Quatro pessoas que estavam na Kombi e o motorista do Fiesta morreram carbonizados. O condutor da carreta conseguiu escapar, mas o cavalo mecânico ficou completamente destruído pelas chamas.
Segundo o chefe de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), inspetor Aristides Júnior, a corporação recebeu a informação do bloqueio e se deslocou até o km 569, onde havia barreiras de pneus e fogo nas pistas da direita nos dois sentidos da rodovia. “Quando nossos agentes chegaram, não havia nenhum manifestante. No momento da retirada dos pneus, ocorreu o acidente no fim da fila”, informou Júnior.
O inspetor afirmou que quando a PRF tem condições faz acompanhamento no ponto final do congestionamento para orientar quem chega a reduzir a velocidade. Mas a prioridade é desobstruir a pista e no caso não havia efetivo para dar conta dos dois locais. Diante do aumento de manifestações, a corporação estuda um meio legal para impedir que moradores fechem as estradas. “Estamos em contato com o departamento jurídico, mas não há nada certo, porque não é tão simples”, afirma Júnior.
A forma como os protestos se disseminaram nas últimas semanas pegou de surpresa também o Batalhão de Polícia Militar Rodoviária (BPMRv), responsável pelas rodovias estaduais da Grande BH, que tem enfrentado dificuldades para garantir a segurança em tantos trechos ao mesmo tempo. Em alguns dias, o volume de manifestações nas rodovias estaduais foi tão grande que foi necessário deslocar agentes de funções administrativas para auxiliar no controle do tráfego. “Sempre tentamos deixar alguém no fim da estrada, mas falta efetivo suficiente”, afirmou o major Agnaldo Lima de Barros, subcomandante do batalhão.
Como complicador, ele lembra que os agentes ainda têm de se preocupar com o risco de incêndios. “Quando há queima de pneus, o perigo é ainda maior. Sempre tem aquele motorista mais afoito que quer passar antes da liberação da pista e o fogo pode atingir a mangueira de combustível e provocar uma explosão”, alerta.
Tragédia anunciada
Para o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em tráfego Ronaldo Guimarães, a quantidade de protestos é um complicador, mas o maior problema é a falta de efetivo para controlar a circulação de veículos durante as manifestações. “O que está acontecendo nos últimos dias mostra a insuficiência das polícias para dar suporte no trânsito. Faltam veículos e agentes nos pontos limites dos congestionamentos. Se houvesse sinalização, os acidentes seriam evitados”, acredita.
Na avaliação do especialista em trânsito Frederico Rodrigues, já era previsível que as interdições nas estradas terminassem em tragédia. “É um clássico problema de vias de alta velocidade, onde qualquer obstrução representa risco”, avalia. Ele afirma que as manifestações têm acontecido de forma intempestiva, sem aviso prévio, o que torna difícil o trabalho da polícia. “Se determinassem dias e horários para os protestos, seria possível sinalizar a via. Mas, como está ocorrendo, os motoristas são pegos de surpresa e não têm tempo nem distância suficiente para frear quando encontram uma retenção”, explica.