Homens, máquinas e ferramentas começam a concretizar, a partir de segunda-feira, um velho sonho dos moradores do Bairro Santa Tereza, Região Leste de Belo Horizonte. Contemplado pelo Orçamento Participativo de 2001/02, quando a população votou pela revitalização, o Cine Santa Tereza assistirá ao início das obras de restauração da sua fachada e readequação do espaço interno para se transformar em centro cultural. As obras vão durar nove meses e custar R$ 2 milhões, informou ontem o presidente da Fundação Municipal de Cultura, Leônidas Oliveira. Entusiasmado, ele lembra que o imóvel inaugurado em 1944, com projeto do arquiteto italiano Rafaello Berti, responsável por outros prédios importantes da cidade, como a prefeitura e o Palácio Episcopal, é um sobrevivente entre os antigos cinemas de rua, pois se mantém de pé, embora descaracterizado, e terá ocupação ligada às artes, entretenimento e lazer.
Localizado na Praça Duque de Caxias, a principal do tradicional bairro, o futuro Centro Cultural Santa Tereza, dividido em dois pavimentos, terá no primeiro, sala multimeios com palco e 186 lugares, cafeteria voltada para a rua, biblioteca e quatro banheiros. No segundo, ao qual se chegará por elevador, escada ou rampa, haverá sala de cinema, com 146 lugares, cabine de projeção, casa de máquinas e quatro banheiros. De propriedade da prefeitura e indicado para tombamento municipal, o que significa proteção, o prédio terá de volta a fachada original, seguindo o modelo localizado no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte e fundamental para o projeto a cargo da arquiteta Marisa Hardy.
Houve muitas mudanças durante as quase sete décadas do prédio, explica Leônidas, que tem mestrado em restauração e doutorado em história da arte. De olho na planta primitiva e numa foto atual do imóvel, ele mostra as alterações: “Antes, eram três portas e duas janelas laterais, que acabam virando cinco portas. Os frisos da cobertura também foram modificados, restando apenas um. Também foi instalado um relógio, bem no alto, que não existia”, conta o presidente da FMC, instituição que será responsável pela gestão do centro cultural. Ele lembra que esquadrias de madeira, guarda-corpo e peitoril de mármore branco das janelas será recuperados. O projeto foi desenvolvido pela Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap). O antigo cinema se tornou uma das principais salas de exibição da capital até fechar as portas, na década de 1980. Após permanecer fechado por alguns anos, o espaço passou a abrigar festivais e mostras de cinema. Em dezembro de 2011, foi palco da abertura do 6º Festival de Arte Negra (FAN).
Diversificação
O anúncio do restauro do cinema anima os moradores do bairro famoso pela vida boêmia, endereços gastronômicos e celeiro de artistas. “Sou nascida e criada em Santa Tereza e tenho muita saudade do cinema. Era bem novinha quando vi e me apaixonei pelo filme Romeu e Julieta. Depois, nos anos 1980, fui a shows do Roupa Nova e Paralamas do Sucesso. Namorava o meu futuro marido e íamos sempre lá dançar”, conta Márcia Moreira Seixas Bicalho, mãe de dois filhos e proprietária de um bar e mercadinho na praça. Já o promotor de vendas Daniel de Brito Mota, de 29, considera a iniciativa “muito boa”, pois vai diversificar a vida da região. “Aqui tem muitos bares e restaurantes, será muito importante termos atividades culturais”, afirma o jovem também nascido e criado no bairro.
A assistente social Alda Maria Peixoto, mãe de quatro filhos, aguarda com ansiedade o início do funcionamento do centro cultural, previsto para julho de 2013. “Não só os moradores vão ganhar com a reabertura do espaço, o turismo de BH também”, acredita ela, residente há 20 anos nas proximidades do cinema.
Estilo art déco
O arquiteto italiano Rafaello Berti, falecido em Belo Horizonte em 1972, foi responsável pelo projeto de muitos prédios importantes da capital, alguns já varridos do mapa, como o Cine Metrópole, na Rua Bahia, no Centro. Além do Cine Santa Tereza, em estilo art déco, saíram da sua prancheta o Cine Floresta (1948), a sede social do Minas Tênis (1940), prefeitura (1935), o Palácio Episcopal (1937), a Escola Estadual Marconi (1938), a Santa Casa de Misericórdia (1941 a 1946) e o Hospital Odilon Behrens (1941), entre outros.