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Estado de Minas

Estátuas de personalidades sofrem com a ação de vândalos na capital

Eles estão imortalizados nas praças de BH por sua importância social ou política, mas a depredação tornou irreconhecível a imagem de figuras notáveis


postado em 09/03/2012 06:00 / atualizado em 09/03/2012 06:39

A imagem de Tancredo Neves, na Praça da Assembleia, teve o rosto desfigurado(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
A imagem de Tancredo Neves, na Praça da Assembleia, teve o rosto desfigurado (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)

 

Pichações e roubo das placas de identificação são símbolos do desrespeito com o patrimônio público (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Pichações e roubo das placas de identificação são símbolos do desrespeito com o patrimônio público (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Nem os mortos estão livres da ação de vândalos e de ladrões de chinelas. Forjadas em bronze, as placas de identificação de estátuas e bustos vêm sendo roubadas em praças e avenidas de Belo Horizonte. Não bastassem os ladrões, o vandalismo envergonha e parece problema sem fim na cidade: as pichações maltratam a história e enfeiam o espaço e o patrimônio público. No Parque Municipal Américo Renné Giannetti, na Região Central, na base de sustentação que até o mês passado amparava o profeta Jeremias – obra que custou R$ 42 mil aos cofres do município –, uma escova de dentes e dois tocos de madeira. O monumento foi derrubado por turista e ficou em pedaços no dia 3. O sujeito, bêbado, foi preso e liberado.

Da mão leve dos ladrões de placas de bronze, nem Carlos Chagas, nas barbas dos deputados mineiros, no Bairro Santo Agostinho, foi poupado. Sem placa de identificação na praça que leva seu nome, a figura sóbria, alinhada, com livro apoiado nos dedos, passa batida para muita gente.

“Acho que é o Flávio Lisboa”, arrisca o vendedor de bilhetes de loteria, de 55 anos, aniversariante do dia. “Ih, roubaram a placa, né!?” Os colegas de trabalho, bem vestidos, fazem hora de almoço sentados em banco próximo à estátua. A mulher desconhece o sujeito e o homem da cabeça prateada faz cara de inteligente antes de sugerir: “É melhor olhar no Google”.

Ulysses, Tancredo e Teotônio carregam as manchas de cola deixada por adesivos(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Ulysses, Tancredo e Teotônio carregam as manchas de cola deixada por adesivos (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)


Perto de Carlos Chagas, o trio ilustre está a salvo. Tacredo Neves, Ulysses Guimarães e Teotônio Vilela, homenageados em 2004 – em comemoração aos 20 anos do movimento Diretas Já! –, estão de pé, firmes e fortes para a posteridade. No entanto, Tancredo tem olho e sombracelha esquerdos depredados. Ulysses e Teotônio têm marcas da sujeira deixada por adesivos pregados em seus paletós. Nas palmas das mãos, erguidas, mais restos de cola de propagandas indevidas. A senhora, prestadora de serviços gerais na Assembleia Legislativa, passa e comenta: “Outro dia pregaram um folheto na testa do Tancredo, coitado”.

Victório Marçolla(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Victório Marçolla (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Parece chorar o busto em bronze no Bairro Funcionários. Uma espécie de tinta preta, já bem seca pelo tempo, escorre pelo olho direito. Para quem passa pelo canteiro central da Avenida Afonso Pena, com a placa de identificação roubada, aquele é mais um ilustre desconhecido. “Não faço a menor ideia de quem seja”, diz a balconista Maria Helena. Nem um palpite? “Afonso Pena?” Não.

 

Deu trabalho identificá-lo, nenhum senhor com mais de 50 anos consultado sabia dizer quem era, vendo a fotografia do busto. Foi preciso recorrer à listagem de monumentos da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para revelar o desconhecido. Trata-se do empreendedor do ramo de beleza e perfumaria nos anos 30, Victório Marçolla.

 

Nem a doutora e a pipoqueira

Hugo Werneck é um anônimo na praça que leva seu nome(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Hugo Werneck é um anônimo na praça que leva seu nome (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)


Os bustos dos médicos Antônio Aleixo, Hugo Werneck e do cientista mineiro Octaviano de Almeida são retratos em bronze do abandono, do roubo e do vandalismo praticado na Região Hospitalar. Os três personagens ilustres bem pouco conhecidos não foram lembrados nem pelos mais velhos. Edson Gonçalves dos Santos, de 75, aguarda o horário da consulta na Santa Casa. Chegou cedo. Está acompanhado da filha Márcia, fisioterapeuta.

“Tá parecendo o Juscelino Kubitscheck”, diz o aposentado. A filha não concorda. Mas não tem nem nome para sugerir. Não reconhece o Dr. Hugo Werneck que dá nome à praça. Ninguém o reconhece na imagem, também com a placa roubada e com sua base completamente pichada. Magna, de 39, e Maiara, de 15, observam a conversa entre pai e filha. Conhecem o moço? “Ih…”, acham graça, cúmplices.

Do outro lado da Avenida Francisco Sales, há anos na região, a ambulante distraída disse não lembrar que havia bustos em três áreas da praça. “Nem sabia que tinha isso aqui, atrás da árvore. Não sei quem é. Nunca vi mais gordo.” A médica de óculos escuros e muita pressa também não sabe. Andando, responde: “Só pode ser o Hugo Werneck”. Não, doutora. É Octaviano de Almeida. Mais à frente. Solitário, despercebido, descansa a memória do professor Antônio Aleixo sob frondosas copas. (JFC)

 

Soldado Anônimo  e desrespeitado


(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Aos pés do soldado desconhecido na Praça Afonso Arinos, uma bucha verde e amarela descorada pelo sol. “O lavador de carro deve ter deixado aí”, diz Rubens Rodrigues, de 63 anos, aposentado, de passagem pela Avenida Álvares Cabral. “É um absurdo o que os marginais fazem na cidade. Aí, cadê a placa? Isso é falta de educação. De cultura. É berço, meu filho”. Não há mais placa em bronze. No lugar, apenas uma inscrição resumida feita à mão por alguém indignado com a falta de respeito à memória lembra a versão original e mantém a homenagem aos ex-combatentes da Força Expedicionária Brasileira: “Sejam os vivos, dignos dos mortos que, tendo a guiá-los a imagem da Pátria distante, lutaram até o fim pela tradição dos nossos antepassados, a honra da nação e o ideal de liberdade.” O monumento representa um pracinha em plena progressão e foi inaugurado em 15 de novembro de 1949, na Praça Rio Branco.


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