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Estado de Minas

Dono do Ah!Bon, Speciali Pizza Bar e Eddie Fine Burgers é alvo de inquérito policial

Empresário de BH é indiciado em inquérito acusado de se aproveitar da fragilidade de um primo em terceiro grau, que morreu com 93 anos, para se apropriar de seus bens


16/04/2011 06:00 - atualizado 16/04/2011 09:26


Uma disputa familiar por uma fortuna de R$ 40 milhões resultou no indiciamento pela Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso do engenheiro e empresário Luiz Fernando Pereira da Silva, de 64 anos, dono das redes de restaurantes Ah!Bon, Speciali Pizza Bar e Eddie Fine Burgers, com unidades instaladas em concorrido quarteirão gastronômico do Bairro de Lourdes, na Região Centro-Sul, em shoppings e outros pontos nobres de Belo Horizonte. Ele é acusado, segundo a polícia, de se aproveitar da fragilidade de seu primo em terceiro grau José João Pereira Bastos, que morreu aos 93 anos em 2007, para convencê-lo a assinar procurações autorizando-o a administrar seus bens.

A mulher de Luiz Fernando – ela morreu no decorrer do inquérito – e dois filhos do casal foram também indiciados, em janeiro deste ano, com base no Estatuto do Idoso. Eles vão responder por quatro crimes, entre eles “apropriar-se ou desviar bens de idoso e induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente”.

De acordo com as investigações, Luiz Fernando teria transferido os imóveis de José João para a empresa Luna Participações e Empreendimentos Imobiliários, que tinha como sócios parentes do empresário. Em 2007, apenas os filhos de Luiz Fernando – ainda menores – apareciam como donos da empresa. A viúva de José João só descobriu que já não tinha mais nada quando deu início ao inventário. Hoje, Rita de Cássia Castro Bastos, de 81 anos, vive em São Paulo com a ajuda de parentes. O caso tramita também na 33ª Vara Cível de BH, numa ação anulatória de atos jurídicos com danos morais e materiais. Em fevereiro deste ano, a juíza Ana Paula Nannetti Caixeta decretou o sequestro dos bens que estão em nome dos filhos do empresário. Os restaurantes estariam em nome de empresas também pertencentes a parentes do acusado.

João José Pereira Bastos assinou procurações passando sua fortuna, e a viúva dele, Rita de Cássia, tenta reavê-la
João José Pereira Bastos assinou procurações passando sua fortuna, e a viúva dele, Rita de Cássia, tenta reavê-la (foto: Arquivo Pessoal)
A relação de parentesco entre o empresário e a vítima era distante: o avô de Luiz Fernando era primo de José João e os dois só passaram a se relacionar com maior frequência a partir de 2004. Para a titular da Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso, Joana Margareth Leite Penha, Luiz Fernando conquistou a confiança de José João. “Ele agiu de má fé e se aproveitou da idade avançada e da saúde debilitada do aposentado para ficar com o dinheiro e outros bens dele. O fato de ele passar tudo para empresas que estão em nome dos filhos, na época menores, demonstra isso”, afirmou a delegada, que já relatou o inquérito. O Ministério Público, que ainda não denunciou os acusados, pediu acareação entre as partes.

Segundo a advogada de Rita de Cássia, Denise Peloso, Luiz Fernando alterou a rotina do idoso, mudou os médicos, trocou os empregados da casa e até o cardápio do almoço era ele quem definia. A advogada afirma que o empresário conseguia as assinaturas com o argumento de que usaria os documentos para fazer as declarações do Imposto de Renda do aposentado. Depois da morte de José João, de acordo com a advogada, Luiz Fernando teria coagido a viúva a assinar outros documentos, trancando-a no banheiro ou levando-a sozinha até a garagem.

“José João não tinha filhos e se sentiu protegido com a companhia e presença daquele a quem considerava um sobrinho, que se ofereceu para administrar os bens. Quando ele morreu, descobrimos que não havia bens a inventariar. Todo o patrimônio tinha sido desviado. Luiz Fernando tinha acesso livre à casa e às contas. Ele conseguiu, inclusive, que José João abandonasse os remédios que tomava para o câncer e passasse a fazer tratamento com terapia de argila. As procurações são legais, mas ele usou de má-fé e coação para conseguir as assinaturas. Não havia consentimento real de José João para acabar com o patrimônio da viúva, que foi pulverizado entre as empresas de familiares do Luiz Fernando”, afirmou a advogada.

Telefonemas

Quinta-feira, o Estado de Minas tentou contato telefônico com o advogado de Luiz Fernando, Gustavo Capanema de Almeida, mas ele não retornou às ligações. Uma secretária informou, do escritório, que o patrão não a autorizava repassar o número do celular. Ontem, novamente procurado, a mesma funcionária informou, com a autorização da gerente do escritório, Mércia Franco, que Gustavo Capanema “não tinha interesse em falar à imprensa sobre nenhum cliente”.

Luiz Fernando, por telefone, disse que estava fora da cidade e que dará entrevista na semana que vem, acompanhado do advogado. Afirmou que é da família de José João e que as informações passadas por Rita de Cássia e sua advogada “estão incorretas”. Segundo o empresário, José João se casou com mais de 80 anos, em separação total de bens, e “poderia fazer o que quisesse com o seu patrimônio”. “Não me apossei de nada. Foi tudo feito à luz da lei”, afirmou.

Passo a Passo


Luiz Fernando se aproximou de José João, seu primo em terceiro grau, em 2004 e passou a administrar uma fortuna avaliada em R$ 40 milhões do aposentado, que assinava procurações em nome do “sobrinho de consideração”.

Segundo a defesa de Rita de Cássia, viúva de José João, seu marido e Luiz Fernando criaram a empresa JJPB, em setembro de 2005, com objetivo de administrar bens e recursos próprios.

Em julho e 2006, ocorreria a primeira alteração contratual, na qual a JJPB cede à Luna Participações e Empreendimentos Imobiliários quase R$ 4 milhões para integrá-la ao seu quadro societário. Na época, a Luna pertencia a Luiz Fernando e família. Em maio de 2007, Luiz Fernando teria deixado a sociedade, repassando suas cotas à Luna, que passou a ter maior parte do capital social da JJPB.

Em outubro de 2007 houve outra alteração no contrato, com a cisão parcial da empresa. O valor remanescente teria sido transferido à Luna, que tem como donos os filhos do empresário: Luiz Eduardo, hoje com 18 anos, e Maria Fernanda de Faria Silva, que completou 20. Naquele ano, eles eram menores.

José João se retira da sociedade da JJPB, em dezembro de 2007, e cede 50% de sua parte à mulher e o restante à Luna. Dias depois da morte do marido, Rita de Cássia repassa à recém-criada RCC toda a sua parte na JJPB. A filha de Luiz Fernando também figura como sócia dessa empresa.

Em janeiro de 2008, Maria Fernanda deixa a RCC e cede sua cota à JJPB, da qual também era sócia. Na data, ocorre, segundo a advogada Denise Peloso, a extinção da JJPB.

Em 2009, a Promotoria do Idoso do MP determina abertura de inquérito. Luiz Fernando e a família são indiciados em janeiro deste ano.

Na herança, 6 prédios

O aposentado José João Pereira Bastos, um dos engenheiros da época da construção de Brasília, tinha pelo menos seis prédios comerciais, casarões e apartamentos luxuosos na Savassi. Conforme o inquérito policial, as fazendas em Perdões, cidade natal, no Oeste do estado, também foram transferidas para empresas administradas por parentes de Luiz Fernando. As aplicações de R$ 2 milhões foram desfeitas e ações no mercado financeiro avaliadas em pelo menos R$ 1 milhão, vendidas. Viúva de José João, Rita de Cássia Castro Bastos afirma que assinou documentos sob ameaça.

A advogada Denise Peloso tenta anular na Justiça as procurações, alegando que José João foi enganado. Segundo ela, quando o idoso foi internado, em 28 de dezembro de 2007, ele assinou um último documento. José João morreu no dia seguinte.“Luiz Fernando exercia uma grande influência sobre meu marido, dava ordens para a gente de como movimentar o dinheiro. Ele trocou os médicos e meu marido foi piorando. Trocou os empregados, passou a mandar na minha casa. Até as panelas ele trocou. Chamou o Zé para morar na casa dele e queria nos separar. Me vigiava, me tirava de casa em viagens para o Rio e eu tinha medo, porque ele me coagia, ameaçava. Ele disse que eu ficaria sem nada se não assinasse aqueles papéis, que ia tirar tudo da gente. E aconteceu”, lamentou a idosa, que hoje mora com parentes.

As investigações da Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso começaram em meados de 2008, quando a defesa de Rita de Cássia fez denúncia à Promotoria do Idoso, resultando em inquérito. Em depoimento à polícia, Luiz Fernando negou pressão ao casal. Ele disse que Rita lia os documentos ou que ele mesmo fazia a leitura para ela. O acusado também confirmou que José João assinou procurações, mas diz que não lembra a data nem a finalidade. E que não se recorda de tê-las usado em bancos.

Luiz Fernando alega que José João fez doações aos filhos dele e que trocou o cardiologista porque “o médico o intoxicava”. O empresário disse que administrava as empresas com conhecimento de Rita e que desconhece o suposto rombo de quase R$ 4 milhões na JJPB. Ele sustentou que as movimentações financeiras constam no processo movido por Rita de Cássia e que prestou contas. Segundo Luiz Fernando, o tio confiava nele e tinha receio de que as pessoas que cercavam a esposa a deixassem sem dinheiro.

O filho do empresário, Luiz Eduardo, disse não ser sócio de nenhuma empresa, mas confirmou que assinou documentos a pedido do pai. À polícia, o rapaz, que tinha 13 anos quando passou a ser sócio da empresa JJPB, falou que considerava o casal José João e Rita como avós. Ele afirmou que não tinha curiosidade em saber do que tratavam os documentos apresentados por Luiz Fernando e que também não sabia se havia bens da família em seu nome.

Criminalmente, Luiz Fernando, Luiz Eduardo e Maria Fernanda também respondem pelos artigos 107 e 108 do Estatuto do Idoso, que significam coagir o idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração sem discernimento de seus atos e sem representação legal. As penas somadas podem chegar a 17 anos.


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