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Estado de Minas ESPECIAL RIO+20 REFLEXÕES

Tecnologia, energia e mudança

Desafio é enfrentar contradição entre a urgência de conter as emissões de gases e a necessidade de melhorar a condição de vida da população mundial


postado em 02/07/2012 11:23 / atualizado em 02/07/2012 11:28

Poucos brasileiros conhecem a área de energia tão bem como o físico Luiz Pinguelli Rosa. Ele já foi presidente da Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobrás) e, nos últimos anos, tem enfatizado a importância de o Brasil – que tem uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo – não deixar de lado seus investimentos em fontes alternativas de energia para priorizar a extração do petróleo do pré-sal.

“A pobreza é um problema do presente e a mudança do clima terá efeitos mais graves a longo prazo”

A Rio+20 pode ser vista por pelo menos dois ângulos: o da reunião dos governos sob a égide das Nações Unidas e o das múltiplas reuniões paralelas de representantes dos mais diversos segmentos da sociedade vindos de muitos países. Em relação ao primeiro, há uma crítica geral de que os resultados da conferência oficial foram aquém do desejado, embora tenham ultrapassado o que se esperava às vésperas de sua realização. Pelo segundo ângulo, a Rio+20 foi uma inegável demonstração de que o nível de conscientização evoluiu muito desde a Rio-92. A Cúpula dos Povos evidenciou-se no fim da conferência.

Apesar disso, foram tomadas deliberações importantes, como a criação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, a serem definidos especificamente, em um prazo de três anos, por uma comissão formada por membros indicados por comissões já existentes da ONU, como a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). Foi considerada a inadequação do Produto Interno Bruto (PIB) como única medida de desenvolvimento dos países. Em paralelo, prefeitos de cidades importantes do mundo inteiro, reunidos no Iclei, em Belo Horizonte, decidiram tomar medidas para a redução das suas emissões de gases do efeito estufa, responsável pelo aquecimento global do planeta.

A agenda oficial da Rio+20 foi muito diluída, ainda que incluindo pontos importantes, como a questão do meio ambiente e a erradicação da pobreza no mundo. Este último ponto, ao lado das mudanças climáticas, é, a meu ver, o mais relevante: a pobreza é um problema do presente e a mudança do clima terá efeitos mais graves a longo prazo. Entretanto, a incapacidade da atmosfera de reduzir o acréscimo do dióxido de carbono (CO²) de origem antropogênica (proveniente da atividade humana), o mais importante dos gases que intensificam o efeito estufa, exige políticas destinadas a reduzir sua emissão pelo consumo de combustíveis fósseis – carvão, derivados de petróleo e gás natural – e também pelo desmatamento. A vida média do acréscimo de dióxido de carbono atmosférico é superior a 100 anos. Portanto, mesmo que, hoje, se reduzam drasticamente suas emissões, seus efeitos perduram por muitos anos, de modo que as medidas já tardam.

Infelizmente, o aquecimento global não teve o lugar que merecia na agenda da conferência dos governos. Uma das razões para isso é que esse tema é objeto de uma convenção específica da ONU (a Conferência das Partes – Cop, que é o braço executivo de um acordo internacional, como o do Clima), com reuniões anuais dos governos. Mas a abrangência da Rio+20 era uma oportunidade de poder enfrentar a grande contradição entre a urgência de conter as emissões no consumo de energia e a necessidade de melhorar as condições de vida de grande parte da população mundial. As mudanças climáticas trarão riscos para o futuro da humanidade. A redução das grandes geleiras é um indício.

Os países em desenvolvimento tendem a aumentar suas emissões com o crescimento econômico seguindo os padrões de produção e de consumo dos países desenvolvidos, que são ditados pelas grandes empresas transnacionais. As classes de renda mais alta têm alto consumo de energia per capita, enquanto a população pobre tem consumo de energia muito baixo. Assim, há uma forte desigualdade na emissão de gases do efeito estufa, seguindo a desigualdade na distribuição de renda. Por isso, deve-se resolver o problema das emissões juntamente com o da exclusão: até muito recentemente, no início do programa Luz para todos, cerca de 12 milhões de brasileiros não tinham luz elétrica.

Na Conferência de Copenhague (Cop-15), realizada no fim de 2009, o Brasil assumiu o compromisso de, até 2020, reduzir voluntariamente (pois não está obrigado pela Convenção do Clima) em até 38,9% suas emissões sobre o volume projetado para aquele ano. Ele seria de 2,7 gigatoneladas (Gt) de CO² equivalente (pois inclui outros gases), volume que deverá ser reduzido a 1,7 Gt de CO² equivalente. Em 2005, o Brasil emitiu 2,2 Gt de CO² equivalente; logo, em 2020, deverá emitir 22,7% a menos. A maior parte vem do desmatamento, que tem sido reduzido, embora haja dúvidas neste ano.

São responsáveis por emissões de gases do efeito estufa as fontes fósseis, com exceção da energia nuclear, cuja utilização se dá pela fissão do urânio e não pela combustão, como ocorre com o carvão, o petróleo e o gás natural. As fontes renováveis, como o álcool e a hidreletricidade, não emitem gases do efeito estufa ou emitem pouco em geral. No caso dos biocombustíveis, o dióxido de carbono emitido na sua combustão é reabsorvido da atmosfera no crescimento do vegetal. Entretanto, metade da lenha e do carvão vegetal vêm de desmatamento no Brasil, onde o carvão vegetal é usado na siderurgia.

A emissão líquida, no caso do álcool, se restringe ao consumo de diesel de tratores e caminhões na lavoura da cana. No caso das hidrelétricas, segundo relatório do grupo de pesquisa sobre mudanças climáticas (IPCC), divulgado em 2007, em nível mundial, o crescimento de emissões de gases do efeito estufa foi de 70% entre 1970 e 2004. Entre essas, as emissões de CO² cresceram mais de 80% e representavam 77% das emissões antropogênicas em 2004. Entre 1970 e 2004, o maior crescimento das emissões foi do setor de energia (145%), seguido dos setores de transportes (120%), indústria (65%) e de usos da terra e desmatamento (40%). Os cenários considerados pelo IPCC preveem aumento da temperatura global entre dois e seis graus Celsius até o fim deste século. O Brasil é particularmente vulnerável a essas mudanças. Há maior vulnerabilidade no semiárido do Nordeste, devido à desertificação potencial, bem como nas periferias das grandes cidades, com a intensificação das grandes chuvas.

Um resultado de grande relevância da Rio+20 foi a iniciativa conjunta do governo brasileiro e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) de criar um Centro Mundial para o Desenvolvimento Sustentável Rio+20, a ser localizado no Rio de Janeiro, como um legado da Rio+20. O centro foi anunciado pela ministra de Meio Ambiente do Brasil, Izabela Teixeira, no último dia da conferência. Esse será em centro de estudos e já conta com a participação de diversas instituições. O centro funcionará, inicialmente, em um prédio da Coppe/UFRJ, na Cidade Universitária, que também sedia o Instituto Global para Tecnologia Verde e Emprego (Gigtech), uma cooperação da Coppe/UFRJ com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).

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