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Tortura e repressão: como a ditadura destruiu o projeto da cidade Marina

Morador lembra passagem de Marighella pelo Noroeste de Minas durante a ditadura

Líder da Aliança Libertadora Nacional (ALN) visitou a antiga propriedade no Vale do Urucuia, no Noroeste de Minas, sob o codinome Doutor Duarte

Luiz Ribeiro - Enviado especial , Renan Damasceno - Enviado Especial

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
Arinos – O aposentado Adão Machado, de 78 anos, ex-gerente da Fazenda Menino, afirma que durante a ditadura passaram pelo local pessoas procuradas pelo regime militar, entre elas Carlos Marighella (1911-1969), líder da Ação Libertadora Nacional (ALN) e ex-deputado federal pelo antigo PCB, partido financiado pelo empresário e idealizador de Cidade Marina, Max Hermann.


Adão Machado diz que, entre 1967 e 1968, Marighella visitou a antiga propriedade no Vale do Urucuia, no Noroeste de Minas, sob o codinome Doutor Duarte. “Ele chegou dizendo que era madeireiro, mas não conhecia nenhum nome de madeira. Ele acordava cedo e saía pelos matos. Me admirava como ele caminhava muito rápido. Tinha algum mistério com aquele homem”, relata Adão.


“Depois, quando vieram os federais  – na verdade, integrantes do Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) e do Exército) –, mostraram uma foto e perguntaram se eu tinha visto aquela pessoa. Reconheci ele. Era o Marighella”.


Arquivo O Cruzeiro
Autor da biografia Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo (Companhia das Letras), o jornalista e escritor Mário Magalhães disse ao EM que a história contada pelo ex-gerente da Fazenda Menino tem fundamento. “O testemunho é verossímil. Naquele tempo, Marighella viajava por diversas regiões rurais do Brasil, escolhendo lugares e roteiros por onde passariam as colunas guerrilheiras a serem formadas por militantes da ALN. Sabidamente, ele esteve em Minas”, afirma Magalhães, que inclui no livro um dos roteiros traçados por Marighella, que passava pela região onde seria Cidade Marina.


Para Clara Charf, de 92 anos, viúva de Marighella, o testemunho de Adão também é verossímil. Em entrevista ao EM, ela chama a atenção para um detalhe lembrado pelo ex-gerente, como o fato de seu marido ter o hábito de andar sempre apressado. “Ele usava vários codinomes e, quando voltava da clandestinidade, evitava falar nomes de pessoas e por onde andou”, relatou Clara.

 

LAMARCA

 

Segundo Adão Machado, em 1968, teria passado pela fazenda um homem com o codinome de Rone, o qual ele suspeitou na época ser o ex-capitão do Exército Carlos Lamarca (1937-1971). O professor e escritor Emiliano José, um dos autores de Lamarca, o capitão da guerrilha (Livraria Cultura), afirmou ao EM que não existe indícios de que o guerrilheiro tenha passado por Minas.