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Estado de Minas

Defesa do goleiro Bruno assume tática de risco

Goleiro admite pela primeira vez morte de Eliza, incrimina suposto executor, mas manobra para culpar Macarrão pela trama. Promotor diz que estratégia expõe réu a pena máxima


postado em 07/03/2013 06:00 / atualizado em 07/03/2013 07:16

Paula Sarapu, Landercy Hemerson, Tiago de Holanda e Carolina Lenoir

Se restava alguma dúvida de que o destino de Eliza Samudio foi selado no sítio do goleiro Bruno Fernandes de Souza, em Esmeraldas, Grande BH, em junho de 2010, ela foi completamente dissipada ontem. Eliza está morta. Seu corpo foi destruído e os restos mortais, consumidos. Bruno, o principal réu no caso, sabia disso durante todo o tempo, embora tenha negado o fato por mais de dois anos. Mas o ex-jogador e seus advogados escolheram uma aposta arriscada para admitir o crime: ontem, durante o depoimento mais aguardado do processo, o atleta, que é julgado no fórum de Contagem, disse que não comandou a execução, mas confessou que soube dela e que se beneficiou da morte, cujo planejamento atribuiu exclusivamente ao ex-braço direito Luiz Henrique Romão, o Macarrão, já condenado a 15 anos de cadeia.


O movimento arquitetado pela defesa pretende que o cliente se beneficie de redução de pena por supostamente ter confessado, e que responda por homicídio simples, mas a promotoria entende que o acusado escolheu o pior meio para isso, empurrando toda a culpa para o ex-amigo. “Não houve confissão nenhuma”, disse o promotor Henry Wagner Vasconcelos, ao anunciar que pedirá pena máxima para Bruno, que pode pegar cerca de 40 anos de detenção.

Depois de um depoimento marcado por contradições, em que afirmou não ser o mandante da morte, Bruno se manteve calado, por orientação do advogado Lúcio Adolfo, diante das mais de 30 perguntas do promotor. Eram 57, mas o representante do MP reduziu a lista, concentrando-se em pontos divergentes entre o testemunho do réu e as provas do processo. Pouco antes, em um deslize, Bruno havia dito à juíza Marixa Fabiane Lopes Rodrigues que Macarrão admitiu ter contratado Marcos Aparecido dos Santos, conhecido como Neném ou Bola, para assassinar a vítima. Pela primeira vez o homem temido por todos os envolvidos no processo aparecia efetivamente como executor da vítima, conforme apontam as investigações policiais. A revelação causou burburinho no tribunal e surpreendeu até Tiago Lenoir, o outro advogado de Bruno.

Para o jurista e professor Luiz Flávio Gomes, juridicamente a fala de Bruno não pode ser considerada uma confissão, ainda que o depoimento tenha tido pontos importantes, como a confirmação da morte de Eliza e o fato de o nome de Bola ter aparecido pela primeira vez no júri. “Ele negou a autoria do crime, mas disse que se sentia de certa forma culpado, o que pode ser interpretado de forma negativa pelos jurados, que reconhecem ou não as qualificadoras de um crime”, explica Gomes. Para o especialista, ficou claro que o discurso foi uma tentativa de diminuição da pena, a exemplo do que ocorreu com Macarrão. “Mas são situações distintas. Enquanto Macarrão admitiu a culpa e delatou outros envolvidos, Bruno negou a participação na execução e incriminou Jorge, que era menor à época e já cumpriu medida socioeducativa, e o próprio Macarrão, já condenado.”

A procuradora de Justiça de São Paulo Luiza Eluf, especialista na área criminal, também avalia que não cabe, no caso de Bruno, o benefício da diminuição da pena por confissão, ainda que parcial. “Ele não colaborou com a Justiça, nem mostrou verdadeiro arrependimento. Da forma como ele falou, soou como uma confissão de quem quer se isentar da culpa, ainda todos saibam que o principal interessado era ele. Não é um tipo de confissão em que a lei prevê diminuição da pena.” Para a procuradora, o discurso do réu foi de quem sabia que não adiantava mais negar o crime, o que só serviria para antipatizá-lo perante o júri. Da mesma forma, ela avalia que a decisão do goleiro de permanecer em silêncio durante as perguntas da promotoria foi uma estratégia para não se complicar. “Em geral, quando o réu mente, entra em contradição quando responde às perguntas do promotor. O que parece é que Bruno não tinha o que dizer a seu favor e ficou calado para não piorar a sua situação.”

O ASSASSINATO

 

Ao responder questionamentos da juíza Marixa Fabiane, Bruno disse ter sido surpreendido quando seu primo Jorge e o amigo Macarrão voltaram ao sítio de Esmeraldas, de onde haviam saído com Eliza e bruninho, trazendo apenas o bebê. Jorge teria então relatado a morte, afirmando, inclusive, que Macarrão ajudou a executar a vítima. “O rapaz pediu que Macarrão amarrasse as mãos dela para frente e deu uma gravata, enforcando-a. O Jorge disse que o Macarrão ainda deu chutes no corpo e que o rapaz (Bola) tinha esquartejado o corpo dela e jogado para os cachorros.” O goleiro nitidamente se esforçava para reproduzir no depoimento apenas a versão dada por seu primo à polícia, sem se comprometer com a realidade do relato.

“Fiquei desesperado e chorei muito. Macarrão falou que Eliza estava incomodando demais e respondi que não precisava disso. No fundo, no fundo, eu já sabia que alguma coisa tinha acontecido”, afirmou. A magistrada questionou por quanto tempo durou o desespero do réu e perguntou sobre as festas que Bruno frequentou horas depois do crime. O goleiro disse que chorou por uma hora e meia, mas que naquela madrugada viajou com o time 100%, que patrocinava, para o Rio de Janeiro. Confirmou ter pedido à ex-mulher, Dayanne, que cuidasse do bebê e que foi ao aniversário do jogador Vágner Love no dia seguinte. Mais tarde, disse, eles viajaram para Angra dos Reis, onde haveria um jogo do 100%. O grupo ficou hospedado em casa alugada, onde houve duas festas, organizadas por Fernanda. O goleiro também confirmou que a mala de Eliza foi queimada pouco antes da viagem ao Rio.

ENQUANTO ISSO...
...REVÉS NO TJMG

Enquanto no fórum de Contagem Bruno e seus defensores viam a situação do principal réu no processo se complicar, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais não vinham notícias melhores. Os desembargadores da 4ª Câmara Criminal negaram ontem o pedido de habeas corpus para que o goleiro tivesse alterado o regime de prisão cautelar. A defesa do jogador apostava que uma proposta de contrato do Boa Esporte Clube o livrasse da cadeia para poder trabalhar. O julgamento teve início às 13h30 e foi rapidamente concluído, pois tinha caráter de urgência.


JOGO DE EMPURRA

Macarrão (Depoimento em 22/11/2012)

"Eles (Jorge e Bruno) falavam que eu era o maior bundão, mas não nasci para isso, não. Estava apavorado. Nunca tinha lidado antes com essa situação. Não sou esse monstro que todo mundo está falando"

"Bruno me mandou levar Eliza Samudio a um lugar, em frente a Toca da Raposa, pois teria uma pessoa esperando ela. eu estava pressentindo que iria levar a Eliza para ser executada"

"Se tem alguém aqui que acabou com a vida, foi ele (Bruno) que acabou com a minha vida"



Bruno (Depoimento 06/03/2013)


"Como mandante, dos fatos, não, eu nego. Mas de certa forma, me sinto culpado"

"Perguntei para eles (Macarrão e Jorge): ‘Poxa, cadê a Eliza? Pelo amor de Deus, o que vocês fizeram com ela?’ Nesse momento, Macarrão falou assim: 'Ó, eu resolvi o problema, o problema que tanto te atormentava'."

"Eu disse (ao Macarrão): ‘O que é que você fez cara, o que é que você fez com a minha vida?’"

 

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