Game mineiro conquista Imagine Cup

Jogo criado por estudantes da PUC Minas sobre o Vale do Jequitinhonha e com pegada social ganha o terceiro lugar em campeonato mundial de inovação da Microsoft, em Seattle


Cristina Horta/EM/DA Press
A competição é acirrada. São 35 equipes e apenas três dias para conquistar público e jurados e ter o decreto de qual é o melhor projeto. Na 14ª Imagine Cup, o maior campeonato de estudantes de tecnologia do mundo, promovido pela Microsoft, as apresentações são de rápida duração e é preciso gogó, jogo de cintura e desenvoltura para cativar votos em três categorias: games, inovação e cidadania. Nos estandes, o trabalho também é frenético. A equipe Tower Up, composta por alunos do curso de jogos digitais da PUC Minas, de Belo Horizonte, que representa o Brasil na categoria “games”, conquistou o terceiro lugar, com o jogo Sonho de Jequi, inspirado na vida e personagens do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Eles foram premiados com US$ 5 mil.

Jequi e seu irmão Joel, moradores do Vale, se entristeceram ao saber pela mãe, Jandira, que, naquele dia, não haveria almoço, porque não tinha água nem para cozinhar. Os personagens são virtuais, mas a história, infelizmente, é realidade para milhares de pessoas da região. O menino resolveu sair em busca do líquido precioso e, na companhia do amigo Calanguinho, bicho típico daquelas bandas, corre, pula e não mede esforços para dar fim ao tormento da seca. Essa corrida é o mote do Sonho de Jequi, disponível gratuitamente para ser baixado em celulares e tablets.

Idealizado e produzido pelos alunos Ramon Coelho de Souza, de 34 anos, Diogo Rigo de Brito Guimarães, de 31, Alessandra Faria de Castro, de 45, Álvaro Augusto Rocha, de 27, Érico Grasso, de 26, Daniel Sanábria, de 33,

Rômulo Santos Silva, de 23, e Jadson Fernandes Resende, de 22, o jogo concorreu com outros nove games do mundo. Criada dentro da Microsoft Innovation Center da PUC Minas, um dos oito centros de Inovação da Microsoft no Brasil, a equipe Tower Up, desbancou mais de 1,6 mil estudantes de todo o país na fase nacional de classificação da competição. A ideia do Sonho de Jequi nasceu como um trabalho de conclusão de curso e está ganhando o mundo. Adequado a gente de todas as idades, foi pensado em conversa entre amigos para decidir qual tema pesquisariam. A proposta veio de Ramon, natural de Araçuaí, uma das 38 cidades do Vale. “A decisão veio com base na dor do pessoal e na beleza da região. Foi um desafio artístico”, conta ele, de 34 anos, e um dos quatro integrantes da equipe que representou Minas e o Brasil na final do campeonato, nos Estados Unidos.

No grupo de oito alunos, todos recém-formados, orientados por vários professores, tarefas foram divididas entre aqueles mais dedicados à programação e quem tinha a veia artística, importantíssima na construção do material. E foi essa parte que deu um toque especial ao trabalho: fiéis às características da cultura do Jequitinhonha, os estudantes desenharam e pintaram em aquarela, para só depois levar para os formatos digital e 3D. A trilha sonora é de Rubinho do Vale, que cedeu os direitos autorais. “É um jogo viciante. Tem apelo social forte e um design de tirar o chapéu”, ressalta o professor Sandro Jerônimo de Almeida, mentor do grupo.

“Participamos com dois jogos na 13ª edição e faturamos o segundo e o terceiro lugares na etapa nacional. Viemos, desde então, tentando entender como é o perfil da competição e, este ano, juntamos os dois grupos para fazer o projeto”, explica o aluno da PUC Minas Diogo Rigo de Brito Guimarães, de 31 anos. Mas, independentemente de títulos, a expectativa é que a empresa invista no Sonho de Jequi, fazendo com que ele se expanda e ganhe escala mundial. “Ele entra na categoria serious games (jogos sérios), ou seja, não é jogar por jogar. Tem um propósito”, ressalta Ramon de Souza.

STARTUP O gerente de programas acadêmicos e centros de inovação da Microsoft Brasil, Rodrigo Dias, acredita que o projeto se tornará uma startup e será acelerada. Ele conta que a empresa está de olho em inovação e em profissionais com perfil empreendedor. “Essa é a pegada da Imagine Cup nos últimos dois anos. Queremos fomentar novas startups e novos projetos”, afirma.

A competição, segundo Dias, é, na realidade, ferramenta de conhecimentos disponibilizada aos estudantes para aliarem uma jornada empreendedora com a educação. “Às vezes, o projeto pode não ter tecnologia, mas ter uma solução de negócios, que é a chave das propostas”, acrescenta. Para manter acesa essa jornada empreendedora, é promovida uma série de eventos de agosto a abril, como workshops e competições on-line em paralelo. Pelo histórico nas competições, Brasil, Alemanha e Reino Unido têm vaga garantida na final.

No ano passado, o país não só faturou o melhor da categoria na qual disputava, como ganhou a condecoração máxima: o melhor entre os três vencedores de cada categoria. O feito foi do time E-FitFashion, da Universidade de São Paulo (USP), com o software Clothes for me, que tem o objetivo de simplificar o processo de compra on-line de roupas sob medida. Mais de 200 mil brasileiros já participaram do campeonato e, em nove das 14 edições, equipes nacionais foram reconhecidas.

Seguindo a dica do empreendedorismo, os alunos da PUC Minas não perderam tempo e criaram a empresa Tower Up Studios. O jogo Game Wells, que ficou, no ano passado, em segundo lugar na seletiva nacional da Imagine Cup, ganhou em votação popular o SB Games, a maior competição da América Latina. O jogo será lançado este ano pela Microsoft para o Xbox 1 e, depois, para Play Station e computador.

JOGO COM ALTRUÍSMO 
O Sonho de Jequi tem um ranking que permite aos jogadores ver on-line quem ajudou o garotinho a coletar mais água. E um item que é o grande diferencial: a possibilidade de doar US$ 0,99 (cerca de R$ 3,40) para a construção de poços artesianos nos municípios da região. O dinheiro arrecadado será encaminhado para o projeto, que é executado pela Karitas Diocesana de Araçuaí. Doações de valor maior podem ser feitas no início do game. Já foram construídas mais de 600 mil cisternas (uma para cada família) e o objetivo é chegar a 1 milhão. Cada poço de 16 mil litros d'água servirá para suprir as necessidades com alimentação pelo período de oito meses. “O objetivo é transformar a vida das pessoas e realizar o sonho de Jequi, que é o de levar água. É um jogo divertido, que propicia ao jogador a oportunidade de conhecer um pouco da cultura do Jequitinhonha. E é altruísta”, diz Ramon Coelho de Souza.

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