A crise na economia brasileira esvaziou as salas de aula das escolas particulares em Belo Horizonte. Tradicionalmente, no mês de janeiro, essas instituições já estavam com suas grades de ensino montadas e era difícil conseguir cadeiras para novos alunos. Mas, este ano, 85% das escolas privadas em Minas Gerais estão com vagas ociosas e, na esperança de preenchê-las, prolongaram a matrícula para o mês de março. Na outra ponta, cresce o número de estudantes na rede pública. O credenciamento de alunos no ensino gratuito superou, e muito, as expectativas da Secretaria de Estado de Edução de Minas Gerais (SEE). O órgão estimava 150 mil inscrições na rede, porém, foram 166.399 inscritos para o ano de 2016.
No fim do ano passado, as escolas anunciaram aos pais os novos reajustes que, em média, ficaram em 15% para os preços das mensalidades. Somando aí a inflação e o desemprego, o resultado este ano é de uma diminuição de 7% de alunos dentro das salas de aula do ensino privado, conforme dados do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep MG). “Além disso, muitas escolas infantis, geralmente pequenas, fecharam as portas por não terem clientes. Na maioria das vezes, os pais de alunos das classes C, D e E, hoje com o orçamento mais apertado, estão voltando com seus filhos para a rede pública”, comenta o presidente do sindicato, Emiro Barbini. Segundo ele, a situação é também notada no ensino superior, principalmente, no turno da noite.
A estimativa do sindicato é de que 83 mil pessoas migrem da rede particular de ensino para a pública. Com isso, a previsão é de 10% dos professores da rede particular percam seus empregos, o que atingiria 8 mil profissionais, conforme já noticiou o Estado de Minas, em dezembro do ano passado. Emiro comenta que a grande maioria das escolas com vagas ociosas cobra mensalidade entre R$ 250 a R$ 550. “Aquelas mais caras e famosas na cidade continuam tendo filas para ingressar. Mas isso porque, neste momento, a crise financeira afetou mais as classes mais baixas. Aqueles com mais condições financeiras cortaram nas viagens e nos supérfluos”, justifica.
Emiro recorda que, nos últimos cinco anos, a rede privada de ensino crescia em média 7,5% ao ano. “Em janeiro, normalmente, as salas de aulas estavam montadas, e com o preenchimento no quadro de alunos. Hoje, as instituições estão prolongando as matrículas”, compara. Na Escola Canto Verde, no Bairro Betânia, ainda há em torno de 40 vagas à espera de estudantes. “Este ano, está devagar. Talvez seja por causa das incertezas na economia e também por causa do carnaval. Apostamos que muitos pais vão esperar para ingressar o filho na escola depois do feriado”, palpita um dos coordenadores da Canto Verde, Karl Marcholl.
A escola pertence a ele, e suas irmãs, Cristine e Mônica. Foi criada há 34 anos e já contou com 275 alunos. “Há uns dois anos, vem diminuindo e estamos com uma média de 210 estudantes. Este ano, perdemos 15 alunos para a rede pública”, afirma Karl, acrescentando que, por outro lado, com as mensalidades a R$ 487 para o ensino infantil e R$ 527 para o fundamental, houve também a migração de estudantes de escolas mais caras para a Canto Verde. “Mas ainda não suprimos o total de evasão”, afirma.
ORÇAMENTO APERTADO
Para a professora de pilates Lívia de Assis Godoi, de 28 anos, a solução foi a retirada dos filhos do Colégio Batista, no Bairro Floresta, na Região Leste. Mesmo ex-aluna de lá e apaixonada pelo ensino do colégio, ela conta que a alta na mensalidade e a crise econômica foram fatores que pesaram para a decisão. “Para cada um dos meninos, que estão na educação infantil, o valor da mensalidade era mais de R$ 800. Já tinha um desconto e tentei mais, porém, não consegui. Vi que o colégio tem também muito bolsista, o que acaba não sendo fácil para a instituição se manter”, avalia.
O marido de Lívia é músico e dá aulas de música, porém, no ano passado e este ano, diminui o seu número de clientes. O mesmo ocorreu com Lívia, como professora de pilates. “Temos como prioridade lançar o CD do marido, por isso, com o orçamento mais apertado, tivemos que optar em retirar as crianças da escola e apostar no ensino dentro de casa”, diz. Ela conta que vai esperar as coisas melhorarem neste semestre, para então, voltar com os meninos para o colégio que admira.
PROCURA MAIOR NO ESTADO
De acordo com informações da Secretaria de Estado de Educação, o cadastramento escolar é voltado para crianças de 6 anos ou que vão completar essa idade até 30 de junho de 2016, para os estudantes vindos de outras localidades ou transferidos de escolas particulares e ainda adolescentes que desejavam retornar aos estudos no Ensino Fundamental na rede pública. Em 2015, o cadastro para 2016 foi feito entre 15 e 26 de junho. Nesse período, foram cadastrados 166.399 estudantes, número que superou a expectativa da SEE, que era de 150 mil inscrições. Em 2014, foram 162.012 estudantes cadastrados, para ingressar em 2015.
O órgão ainda não tem o detalhamento de quantos são os estudantes que migraram da rede privada para a pública este ano. Mas, segundo a SEE, dos 734.784 alunos matriculados na rede privada em todos os níveis de ensino (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação de jovens e adultos e educação profissional) em Minas Gerais em 2013, 79.667 migraram para a rede pública em 2014. Desses, 35.557 foram para as escolas estaduais, 2,1 mil foram para as escolas federais e 42 mil foram para as escolas municipais, segundo os últimos dados disponíveis.
“Isso ocorre devido a vários fatores, sendo que um deles é a saída da rede privada dos alunos da educação infantil e a ida para a rede pública quando se inicia o ensino fundamental. No entanto, os dados mostram que mesmo com essa migração, houve um aumento de alunos na rede privada em 2014. Outro exemplo são os alunos da rede privada que ingressam em ensino técnico da rede federal”, diz nota da SEE.