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Estado de Minas

Energia cara piora cenário na indústria mineira

Recessão econômica reduz produção nas fábricas, que sofrem com alta de custo da energia em função da escassez de água. Postos de trabalho são ceifados nos ajustes


postado em 03/11/2015 11:00 / atualizado em 03/11/2015 11:16

Usinas de álcool e açúcar, na Região Central de Minas, reduzem uso de líquido nas fábricas, Enquanto nas lavouras a produtividade caiu 50% com a estiagem prolongada(foto: Jair Amaral/EM/D.A/Press -24/6/15)
Usinas de álcool e açúcar, na Região Central de Minas, reduzem uso de líquido nas fábricas, Enquanto nas lavouras a produtividade caiu 50% com a estiagem prolongada (foto: Jair Amaral/EM/D.A/Press -24/6/15)
Pode parecer brincadeira de mau gosto, mas foi a redução da produção da indústria provocada pela crise econômica que salvou o setor, em certa medida, do impacto que a escassez de água poderia ter atingido nas fábricas e nos negócios. As empresas só não contavam com o agravamento da seca e um cenário já entendido como mudança climática permanente pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), combinando períodos longos e intensos de estiagem e chuvas rápidas e impiedosas. O novo desafio das águas levou a Fiemg a recomendar as empresas a trabalharem desde já num ambiente de racionamento, como uma realidade e não mais uma possibilidade.

Para setores como os fabricantes de ferroligas e de tecidos, o maior problema decorrente da escassez de água é o aumento dos preços da energia, que eles consomem intensivamente. Com a baixa dos reservatórios das usinas hidrelétricas, a eletricidade das térmicas foi acionada a preços muito altos para uma produção industrial já sacrificada. A progressão dos custos em Pirapora, Várzea da Palma, Bocaiuva e Capitão Enéas levou as empresas de ferroligas e silício metálico a paralisar cerca de 80% das suas atividades, o que implicou demissão de 3 mil pessoas na região. A indústria têxtil estima que a crise hídrica elevou em até 70% os preços da energia que alimenta as fábricas no país. Para se ajustarem, elas deverão cortar 100 mil postos de trabalho neste ano.

A terceira reportagem da série Crise + Seca mostra o desafio da indústria nesse momento. A ordem na Fiemg é alertar e assessorar as indústrias de todo o estado na elaboração de planos de contingenciamento do insumo e de acesso a fontes alternativas de água. “Se a economia estivesse acelerada, o impacto da crise hídrica seria muito maior. Com a redução natural da produção, devido ao desaquecimento da economia, as empresas puderam se adequar à escassez de água, mas agora esse trabalho não tem mais volta”, observa o gerente de Meio Ambiente da federação, Wagner Soares, responsável pelo programa da instituição para implantar nova cultura de uso racional do insumo.

A estrutura do parque industrial mineiro é motivo suficiente para a campanha. Cerca de 70% das indústrias com até 100 empregados se abastecem de água por meio do sistema público de abastecimento. São 120 mil empresas industriais em Minas, das quais ao redor de apenas 2 mil detêm mais de 100 trabalhadores. As iniciativas para redução das necessidades do insumo nos processos de produção começaram pelos fabricantes de segmentos que dependem fortemente de água – mineração, indústria têxtil e laticínios – e hoje tem de envolver todos os setores, destaca Wagner Soares.

Além da revisão e substituição de equipamentos, a abertura de poços artesianos tornou-se prática comum, de acordo com o especialista. Nas linhas de produção, tecnologia moderna permitiu substituir a lavagem com água corrente por vapor, reduzir o uso de detergente e de água para enxágue. Vazamentos foram estancados, com a troca de encanamentos e registros de pressão.

Exemplo desse trabalho, a indústria do açúcar e do álcool registrou grande avanço na diminuição do uso de água durante o processamento da cana. Entretanto, preocupam as perdas nas lavouras e o financiamento caro dos investimentos no setor produtivo da economia. Nos últimos dois anos, a produtividade nos canaviais caiu até 50% em Bambuí, Pompéu e Lagoa da Prata, na Região Central de Minas, o que exigiu das empresas o esforço de levar a colheita a áreas muito maiores para compensar parte do mau resultado, conta Jadir Silva de Oliveira, gerente de Meio Ambiente da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig).

O setor esperava colher mais de 80 toneladas de cana por hectare em zonas de intensa produção, a exemplo do Triângulo Mineiro. “A tendência é de que a irregularidade do clima passe a impor às empresas a necessidade de trabalhar em áreas irrigadas, mas não se fez muito nesse sentido porque a indústria está saindo de um período longo de crise financeira”, afirma Jadir Oliveira. Nas usinas, metas foram cumpridas no que trata da reposição de água consumida no processamento industrial. Cada tonelada de cana demanda, hoje, menos de 1 metro cúbico de água, ante 5 metros cúbicos necessários há 10 anos. “Em algumas unidades, essa relação está próxima de zero, com média de 70% a 80% de reutilização de água”, segundo o executivo.

RACIONAMENTO A falta de capital e o crédito caro são também obstáculos difíceis de vencer quando os investimentos pressupõem desembolso significativo de recursos para as pequenas empresas do setor de mineração, sobretudo os fabricantes dos chamados minerais não metálicos, aqueles usados na construção civil. Com a perspectiva de racionamento, contudo, não há como o setor deixar de pensar em se adequar, destaca Rinaldo Mancin, diretor de Assuntos Ambientais do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).

“O setor tem na água um ativo forte e que é parte da sobrevivência das empresas. Por outro lado, a lei é muito clara na definição de prioridades para o consumo humano e de animais. Em situações de racionamento, teremos de nos adequar”, afirma Mancin. Nas maiores empresas, o Ibram considera índices elevados de reciclagem e recirculação do insumo, proporcionados pelos chamados circuitos fechados da extração e beneficiamento, alcançando 90% na produção de minério de ferro e 100% na de areia quartzosa industrial.

70%
das indústrias com até 100 empregados em Minas, maioria preponderante do setor, se abastecem de água por meio do sistema público

50%
foi o quanto caiu a produtividade nas áreas de plantio da indústria da
cana-de-açúcar no estado, devido seca prolongada

75%
da água usada nas indústrias de mineração, em média, está sendo reciclada

Vale desenvolve tecnologia para produzir minério de ferro a seco(foto: Mario Castello/Esp. EM/D.A Press - 3 20/9/11 )
Vale desenvolve tecnologia para produzir minério de ferro a seco (foto: Mario Castello/Esp. EM/D.A Press - 3 20/9/11 )
Nuvens de incertezas

Pergunta ainda sem resposta corre pelos corredores das fábricas e das usinas sobre os rumos que a estiagem deve tomar, num momento em que as empresas não têm como fazer previsões sem a chegada de um regime de chuvas mais regulares. A indústria do açúcar e do álcool garantiu várias ampliações no plantio com as últimas águas de 2014, o que favoreceu a safra deste ano, sem, entretanto, deixar pistas de como será o desempenho de 2016, recorda Jadir Oliveira, da Siamig. Na indústria da mineração, a expectativa recai sobre a propagação de processos cada vez menos dependentes de água, seguindo o exemplo da mineração a seco desenvolvida pela Vale em seu megaprojeto de extração de ferro em Carajás (PA), batizado de S11D.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a Vale informou que estima, para o ano que vem, produzir à base da umidade natural, sem uso de água no processo de beneficiamento de minério, 40% da sua oferta total de ferro nas operações do Pará e de Minas Gerais. A previsão está associada às condições de qualidade do bem mineral e à escala de produção permitida pela tecnologia empregada. De 2011 ao ano passado, a companhia desenvolveu mais de 500 projetos voltados à instalação de equipamentos de monitoramento de vazão, dos quais 300 foram adquiridos ou instalados.

A Vale investiu US$ 76 milhões no ano passado em gerenciamento de recursos hídricos, reutilizando 76% da água consumida em seus processos de produção. Rinaldo Mancin, do Ibram, diz, ainda, que as empresas do setor avançaram em Minas neste ano, ao formalizar o compromisso de reduzir em 30% as captações de água no Rio das Velhas, na Região Central do estado. A medida partiu de acordo firmado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas com o Sindicato da Indústria Mineral do Estado de Minas Gerais (Sindiextra).

Para Wagner Soares, da Fiemg, um regime de chuvas marcado, como a instituição imagina, por temporais e períodos intensos de seca requer atenção especial da sociedade e dos investimentos do setor público em obras para reservar água, como medida adicional à prioridade dada ao trabalho de recuperação de áreas degradadas. “Em zonas urbanas, o problema é mais complexo, já que os córregos não estão preparados para reter a água trazida pelas chuvas rápidas e em caudais”, afirma.


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