A história da estudante, que preferiu se manter no anonimato, está acontecendo com milhares de pessoas no país. O aperto no orçamento por meio do salário está se tornando comum no Brasil, uma vez que a diferença no salário dos trabalhadores desligados em relação ao dos admitidos cresceu. Segundo levantamento do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), feito para o Estado de Minas, os salários de admissão ficaram menores no primeiro semestre de 2015, na comparação com o mesmo período do ano passado. Segundo o levantamento, em Minas Gerais, o salário de admissão caiu, na média, 2,8%, passando de R$ 1.147,71 para R$ 1.116,35. Na média do país, a queda é menor, 1,65%, passando de R$ 1.271,10 para R$ 1.250,39. Os dados já estão deflacionados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
Segundo especialistas, esse é o reflexo de um mercado de trabalho desaquecido, com queda na geração de postos de trabalho e aumento do desemprego, além da recessão econômica, com juros e inflação mais altos. Segundo o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Sabóia, é comum essa diminuição do salário num cenário econômico como o que o Brasil passa. “Inflação e desaceleração da economia é uma combinação terrível para o mercado de trabalho”, explica.
Ainda de acordo com Sabóia, o fato de o salário de admissão ter caído está dentro das expectativas do mercado econômico e os números podem ser considerados baixos, perto do cenário atual. “Estamos em um ano complicado e não sabemos até quando a recessão vai durar. Se pensarmos no percentual que a inflação já atingiu, veremos que a perda no salário admissional ainda é pouca”, relata.
Concentração
Para o diretor comercial do Grupo Selpe Hegel Botinha, especialista em recolocação de mercado, Minas perde mais do que o Brasil por ser polo de mineração, setor que vem sofrendo com preços baixos no mercado nacional e internacional, além de concentrar inúmeras indústrias automotivas que também sofrem com a redução do consumo no país e amargam queda nas vendas. “Minas possui uma concentração de setores que sofrem diretamente os impactos do momento econômico atual, o que explica, em parte, a queda”, reforça Flávia. Segundo o levantamento do MTE, os setores que tiveram queda mais acentuada na média do salário de admissão foram o de extrativa mineral (-4,1), serviços (-3,5%), indústria de transformação (-2,5%), comércio (-2,2%) e construção civil (-1,8). No estado, os únicos setores que apresentaram média de salário maior foram os serviços industriais de utilidade pública, passando de R$ 1.138,52 para R$ 1.434,09, ganho de 26%, e o da administração pública que antes era de R$ 1.634,53 e passou para R$ 1.689,83, alta de 3,3%.
No Brasil, os números caem menos que em Minas. Na indústria extrativa mineral, por exemplo, a queda no país foi menos da metade da registrada no estado, -1,35%. No setor de serviços, o país teve queda de 1,96%, seguido pela construção civil, 1,68%, a indústria da transformação, com 1,02%, e o comércio, com queda de 0,95%. Apenas os setores de administração pública e agropecuária, extração vegetal, caça e pesca apresentaram alta na comparação entre o primeiro semestre de 2015 com o mesmo período de 2014. Na administração pública, a média dos salários passou de R$ 1.747,89 para R$ 1.829,75, alta de 4,07% e a da agropecuária passou de R$ 1.039,97 para R$ 1.043,17, alta de 0,3%.
A assistente administrativa R.R.O. que preferiu não ser identificada, também sofreu os impactos da crise. Depois de ficar quatro meses desempregada, se viu obrigada a aceitar proposta de trabalho com salário três vezes menor que o que recebia na antiga empresa. “O cargo era o mesmo, as funções eram as mesmas, mas o salário era menor e não vi alternativa a não ser aceitar”, afirma. “Depois de um tempo, meu chefe criou um novo cargo, valorizou meu trabalho e hoje eu ganho até mais do que eu ganhava no antigo trabalho”, comemora
Acordo próximo
Um acordo entre a General Motors e o Sindicato dos Metalúrgicos deve adiar as 798 demissões anunciadas pela montadora na fábrica de São José dos Campos. Pela proposta, esse grupo de trabalhadores deve ficar em layoff (suspensão temporária dos contratros de trabalho) durante cinco meses antes do desligamento. O acordo foi feito em uma audiência de conciliação no Tribunal Regional do Trabalho, em Campinas, na tarde de sexta-feira. Os trabalhadores devem votar a proposta em assembleia amanhã. A aprovação irá pôr fim à greve de cerca de 5 mil funcionários na unidade de São José, que já dura duas semanas.