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Estado de Minas

Brasileiros devem R$ 1,3 tri após anos de políticas voltadas às compras

Total se refere apenas a débitos com instituições financeiras, com taxa média de juros ao consumidor alcançando 43% ao ano


postado em 30/07/2014 06:00 / atualizado em 30/07/2014 07:29

A vendedora Maria das Graças Cardoso está lutando para cortar despesas. O objetivo é quitar a dívida com o cartão de crédito de uma loja (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
A vendedora Maria das Graças Cardoso está lutando para cortar despesas. O objetivo é quitar a dívida com o cartão de crédito de uma loja (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Brasília – A estratégia do governo de incentivar o crédito num momento em que o consumo das famílias já começa a dar sinais claros de esgotamento pode não surtir o efeito esperado. Isso porque, após anos de políticas voltadas à compra de bens, via desoneração de tributos como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a aquisição de veículos, móveis e eletrodomésticos, o espaço no orçamento doméstico para assumir novos débitos encolheu. Até junho, segundo dados do Banco Central (BC), as dívidas dos brasileiros, apenas com instituições financeiras, chegaram ao patamar recorde de R$ 1,324 trilhão.

Nunca antes os consumidores deveram tanto para os bancos no país, e o pior: além de já ter comprometido boa parte da renda com parcelas de financiamentos, o brasileiro também está pagando mais caro para quitar esses empréstimos. Em junho, a taxa média de juros cobrada dos consumidores chegou a 43% ao ano, o maior patamar desde março de 2011, quando o BC começou a fazer esse levantamento.

Ainda mais grave que o número, observa o economista-chefe da Boa Vista Serviços, Flávio Calife, é a rapidez com que os juros têm avançado. “As taxas têm subido muito, motivada pela crescente desconfiança dos banqueiros com o futuro, e, em especial, com a evolução do mercado de trabalho. Então, se ele entende que pode ter problemas para reaver o dinheiro que empresta agora, ele vai cobrar um prêmio de risco maior, e isso se reflete nos juros pagos pelos consumidores”, disse.

É justamente o que tem ocorrido. Em abril de 2013, a taxa média cobrada das famílias chegava a 34,4% ao ano. De lá para cá, essa conta aumentou 8,6 pontos percentuais, acompanhando a escalada da desconfiança de investidores e empresários na economia e o ciclo de aperto nos juros comandado pelo BC no último ano. Mesmo assim, as taxas subiram pelo menos duas vezes mais que a Selic no período, que avançou da mínima histórica, 7,25% ao ano, em abril de 2013, para o patamar atual, 11%, mantido na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na última semana.

Há situações, no entanto, onde o aumento observado supera 10 vezes a alta da Selic. Quem, por exemplo, recorreu ao cheque especial recentemente se assustou com o estrato bancário. Apenas em junho, os juros médios praticados nessa linha chegaram a 171,5% ao ano. Contra maio, houve alta de 3 pontos percentuais, mas, contra abril de 2013, exatamente quando o BC deu início à escalada dos juros, a elevação chega a 34,7 pontos percentuais. Apenas como comparação, a Selic subiu 3,75 pontos no período.

Apesar de apresentar uma taxa tão elevada, o cheque especial tem sido uma das principais linhas de crédito utilizada pelo brasileiro. Nos últimos 12 meses, as dívidas contraídas nessa modalidade cresceram 7,1%, evolução que o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel, classificou como “crescimento significativo”.

Aperto

Maciel lembrou que o patamar atual dos juros, de 171,5% ao ano, ainda é mais baixo do que o observado no início dos anos 1990, quando o país vivia sob uma hiperinflação de quase 1.000% ao ano. “O cheque especial já teve juros maiores. O recorde foi 294% ao ano (em julho de 1994), e hoje está em 171,5%. Ainda assim, é uma modalidade com custo mais elevado, razão pela qual deve ser usada com muita cautela”, aconselhou.

Não foi apenas nessa linha considerada emergencial que os brasileiros tiveram de recorrer para sair do aperto financeiro. Ainda mais elevada foi a procura pelo cartão de crédito. Nos últimos 12 meses, as dívidas contraídas pelas pessoas físicas nessa modalidade avançaram 14,8%. Não por acaso, Maciel pediu moderação das famílias no uso dessas linhas emergenciais.

O Banco Central não divulga os juros praticados no cartão de crédito, mas cálculos feitos por consultorias independentes mostram que a conta de quem recorre a essa linha pode ser bastante salgada. Apenas em junho, a taxa média observada pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças e Contabilidade (Anefac) foi de 238,67%, uma variação de 0,18 ponto sobre maio, segundo informou, há duas semanas, a entidade.

Recomendação

É por isso que, mesmo não sendo a praxe do BC, Maciel aconselhou ao brasileiro evitar ao máximo recorrer a essas linhas. “A recomendação é que se use essas linhas mais elevadas (cheque especial e cartão) o mínimo possível. Além disso, também têm que ser usadas com muita cautela, por um período curto, porque são, de fato, operações com custo bastante elevado”, disse o chefe do Departamento Econômico do BC.

A vendedora Maria das Graças Cardos, de 55 anos, conta que parcelou uma compra de supermercado no cartão de crédito da loja, mas não pagou as prestações que tinham vencimento em março, abril e maio. Ontem, ela tentava renegociar a dívida de R$ 300. “Eu não recebi o boleto e acabei me esquecendo. Então, começaram a ligar para cobrar. Tentei negociar, mas não sei se vou conseguir pagar como eles querem”, afirma. De acordo com Maria das Graças, a loja parcelarou o débito em três vezes, mas cobrarou juros, o que fez com que a dívida ficasse ainda maior, extrapolando seu orçamento. “Estou diminuindo as despesas da casa, como supermercado, consumindo menos produtos, como roupas e sapatos, e cortando gastos com lazer. Mesmo assim está difícil controlar as despesas”, revela. (Colaborou Francelle Marzano)

Consignado demora mais


A melhor opção para o cliente é, em geral, é recorrer a financiamentos mais baratos, como o empréstimo consignado. Nessa modalidade de crédito, as prestações são descontadas diretamente do salário ou benefício pago a aposentados ou pensionistas, no contracheque do mês. É, portanto, uma modalidade com risco baixo para o banco, já que o cliente só não pagará o empréstimo se ficar desempregado. Mesmo assim, os bancos têm retido as concessões nessas linhas.

Gerentes, especialmente de instituições privadas, admitem que o tempo médio de demora para liberar um empréstimo desse tipo mais do que dobrou nos últimos meses. A consequência foi uma queda nas concessões. No último trimestre, até junho, os empréstimos feitos a beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) encolheram 14,5%. Em junho, essa situação se repetiu também entre os servidores públicos e trabalhadores privados. No primeiro caso, a queda nas concessões foi de 0,4%. Já entre clientes da iniciativa privada, o tombo foi bem maior: de 9,9%. Uma explicação é a Copa do Mundo, que afetou o funcionamento de agências, diz a economista-chefe da Rosenberg Associados, Thaís Marzola Zara, com o crédito para aquisição de automóveis, que despencou 10,9% em junho. (DB)


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