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Estado de Minas

De reis do lucro a banqueiros falidos

A ganância e a capacidade de encantar o público levaram a quebras históricas de empresas de varejo a construtoras


postado em 10/11/2013 06:00 / atualizado em 10/11/2013 07:47

Íntimo de personalidades como JK, Mário Garnero criou o banco de investimentos Brasilinvest, liquidado em 1985, depois de desfilar no mundo empresarial(foto: Blogspot/Reprodução da Internet)
Íntimo de personalidades como JK, Mário Garnero criou o banco de investimentos Brasilinvest, liquidado em 1985, depois de desfilar no mundo empresarial (foto: Blogspot/Reprodução da Internet)

A história de ascensão e queda do ex-todo-poderoso Eike Batista carrega um pouco das características de cada brasileiro que sonha com uma vida de poder, influência, glamour e, de quebra, acompanhada de lucros repentinos e sem esforços estrondosos. Não à toa, os bilionários da moda exercem tanto fascínio e não demoram a virar celebridades das mais endeusadas: o povo — de maneiras e intensidades diferentes — encontra neles os ingredientes necessários para alimentar ilusões.

Estranhamente, fatos e atitudes que deveriam estimular desconfiança, por vezes, provocam encantamento. É como se os desejosos da riqueza e influência instantâneas necessitassem de modelos para se apoiar e, assim, sedimentar a própria tese. A ganância e a atração pelos privilégios rondam a humanidade desde sempre, protagonizando decadência de impérios, quebras de pequenas e grandes empresas e traiçoeiras armadilhas na vida privada de tanta gente.

“Querendo ou não, é também resultado do capitalismo, de um sistema de acúmulo de capital de todas as formas e a qualquer custo”, comenta o publicitário e vice-presidente executivo da NBS Comunicação, Dudu Godoy. As derrocadas são fenômenos anunciados, acredita ele. “Ou você acha que as pessoas não sabem que a bolha vai estourar?”, instiga.

Geralmente, uma boa lábia ajuda a fundamentar a ideia de poder e lucro fáceis. Embora alguns casos sejam mais emblemáticos do que outros, a estratégia básica passa por criar um ambiente favorável ao convencimento de que é possível entregar algo impossível de ser entregue. “É o conceito de ilusão. Nada paga muito para muita gente e por muito tempo”, defende o educador financeiro Álvaro Modernell, incrédulo diante de toda e qualquer promessa mirabolante.

A trajetória do empresário Mário Garnero, de 76 anos, por exemplo, foi construída a partir do relacionamento com personalidades, entre as quais o ex-chanceler norte-americano Henry Kissinger. Tornou-se diretor de grandes empresas até abrir o banco de investimentos Brasilinvest, liquidado em 1985. Deu a volta por cima e segue com uma ilustre rede de contatos, sobretudo dos Estados Unidos.

As reviravoltas são mesmo uma marca desses símbolos. A mais expressiva deu, há quase meio século, o empresário Olacyr de Moraes, de 82, que trocou uma construtora em São Paulo por uma agropecuária no Mato Grosso, aproveitando incentivos de governo. Duas décadas depois foi coroado rei da soja, maior produtor mundial do grão. Seu perfil comedido, contudo, caiu por terra nos anos 1990. Divorciado, passou a desfilar com belas jovens em festas e eventos oficiais em Brasília. Sua queda, na virada do milênio, veio com a venda da endividada Fazenda Itamarati, entregue a trabalhadores sem terra.

As derrocadas também deram o que falar no sistema financeiro brasileiro nas últimas décadas. A falência dos bancos Santos, Econômico, Nacional e outros que viram os cofres esvaziarem tem como pano de fundo a história de grandes empresários cujo poder ruiu junto com investimentos de pessoas físicas e fundos de pensão. Muitos deles vivem tentando manter a pose, ao mesmo tempo em que respondem a infindáveis processos na Justiça e buscam, igualmente nos tribunais, recuperar parte do rombo em ações contra, principalmente, o Banco Central.

Olacyr de Moraes não conseguiu se manter na condição privilegiada de rei da soja, protagonizando a maior reviravolta vista no país da riqueza à quebra (foto: Junior Baron/CB/D.A Press - 2013 11/12/91 )
Olacyr de Moraes não conseguiu se manter na condição privilegiada de rei da soja, protagonizando a maior reviravolta vista no país da riqueza à quebra (foto: Junior Baron/CB/D.A Press - 2013 11/12/91 )
Graças à sua especial habilidade para comprar grandes empresas em dificuldades, para revendê-las mais adiante, o empresário paulista Ricardo Mansur, de 65, chegou um dia a ser conhecido como o Rei do varejo no Brasil. Primeiro adquiriu, em 1997, a rede paulista de lojas de departamentos Mappin. No ano seguinte fez o seu lance mais ousado, para agregar a famosa rede fluminense Mesbla. O aperto financeiro das duas marcas, a piora das vendas e os desentendimentos entre o milionário e o Bradesco, banco com quem havia feito um acordo para capitalizar as redes em R$ 420 milhões, por meio de emissão de debêntures, levou ao pedido de falência em julho de 1999.

Ao lançar um livro há três anos para relatar sua versão sobre a quebra da construtora Encol, Pedro Paulo de Souza reviveu os tempos em que circulava com desenvoltura pelas festas de Brasília. Ele foi dono da maior construtora de imóveis comerciais e residenciais do país. Pouco depois do início da derrocada, deixou a casa no Lago Sul, em Brasília, e hoje vive em um apartamento de classe média alugado em Goiânia. Os 42 mil clientes da Encol que não haviam recebido as chaves quando a empresa parou de funcionar iniciaram ali um longo calvário judicial para tentar reaver ao menos uma parte do patrimônio.

Visão
franciscana

A economia é um dos assuntos tratados com frequência pelo papa Francisco em seus discursos. Na Páscoa deste ano, o pontífice, que tem chamado a atenção pelo estilo franciscano de governar a Igreja Católica, pediu paz para um mundo que, segundo ele, ainda vive dividido pela “ganância que busca o lucro fácil”.


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