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Estado de Minas

Novos direitos das domésticas estão distantes da realidade de outros países

Nos EUA, babá ganha até R$ 2,4 mil por semana


postado em 07/04/2013 06:00 / atualizado em 07/04/2013 08:32

Zulmira Furbino

A promulgação da Lei das Domésticas está empurrando o Brasil para uma nova realidade no campo do trabalho doméstico, mas ainda vai levar tempo para que o país chegue ao menos perto dos países europeus, dos Estados Unidos e do Japão, as nações mais desenvolvidas do mundo, no que se refere à maneira de lidar e à forma de remunerar serviços dessa natureza. Em Londres, para trabalhar quatro horas, uma faxineira ganha, em média, o equivalente a R$ 25 por hora. Em Paris, contratar uma babá custa cerca de R$ 35 a hora; nos Estados Unidos, o mesmo serviço custa, em média, entre R$ 1.600 e R$ 2.400 por semana. Em Washington (EUA), uma família paga R$ 800 mensais a uma housekeeper (faxineira) que trabalha uma vez a cada duas semanas.

Levantamento realizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 2010 mostra que o número de empregados domésticos espalhados entre 117 países é inversamente proporcional ao nível de desenvolvimento de cada nação ou região. Segundo a OIT, naquele ano havia 52,6 milhões de homens e mulheres trabalhando em serviços domésticos no mundo, nada menos do que 78% deles concentrados na Ásia (41%) e na América Latina (37%). Entre todas as nações pesquisadas, o organismo internacional aponta que o Brasil é o país que mais tem empregados domésticos – 7,2 milhões. Já os países desenvolvidos, juntos, empregam apenas 7% deles.

A brasileira Simone Araújo mora em Londres há nove anos e chegou na Inglaterra sem saber falar inglês. Na primeira semana, acordou cedo e partiu para os bairros de maior poder aquisitivo deixando bilhetes de apresentação nas casas. “Arrumei clientes logo de cara e cheguei a receber 15 pounds por hora (R$ 55)”. Como tinha visto de estudante, tinha permissão para fazer 20 horas de faxina por mês, mas trabalhava por fora para engordar a renda. “Trabalhei numa casa durante sete anos, e os patrões me registraram como funcionária da empresa deles.“ Hoje, Simone trabalha numa farmácia que vende produtos naturais na cidade. Ela conta que o mercado londrino de limpeza de residências foi invadido pelos “polacos”, imigrantes do Leste Europeu, e o preço do serviço caiu muito. “Para eles, vale a pena cobrar mais barato porque a moeda deles é muito desvalorizada em comparação com a libra”, explica.

Ronaldo Doval é professor particular de inglês em Belo Horizonte e morou nos Estados Unidos de 1985 a 1998. Lá, estudou a língua nativa e trabalhou em restaurantes, car wash e na limpeza de casas, até montar uma empresa de serviços domésticos. “Nos Estados Unidos, os trabalhos são feitos por empreitada. É possível levar duas, três pessoas. Nossa empresa calculava, por exemplo, que o serviço ia durar duas horas. Nesses casos, podíamos enviar dois faxineiros e ainda sobravam US$ 15”, lembra.

Ele afirma que saíam da Flórida para limpar um apartamento em Chicago “porque o dono não confiava em mais ninguém”. “Nos Estados Unidos, esse tipo de trabalho funciona na base da confiança. O problema é que não há nenhuma segurança, você não é protegido por lei nenhuma”, diz Doval. Ele acredita que no Brasil os serviços domésticos caminham nesse rumo. “Quem tem renda mais baixa vai dispensar a empregada e contratar diaristas. Isso já está ocorrendo”, afirma.

Em extinção

Na Itália, ter empregada doméstica é um verdadeiro luxo. A estilista mineira Marcela de Oliveira mora em Florença, já contou com os serviços de uma diarista, mas teve que dispensá-la. "Na Itália, a empregada doméstica está em extinção. Os custos são imensos, e as possibilidades de conseguir garantir (pagar) todos os impostos (previdência, pensão etc.) são cada vez menores.” Segundo ela, poucas famílias podem ter uma empregada em casa, pois ela tem os mesmos direitos de qualquer outro trabalhador, seja comerciário ou policial. A solução é assumir a contratação de uma diarista que compareça uma, duas ou três vezes por semana, sem pagar os impostos. “A maior parte das italianas faz assim”, diz. Hoje, na Itália, uma doméstica ganha de oito a 10 euros por hora. Desde 2011, Marcela de Oliveira dispensou a ajuda e se organiza para cuidar do marido e da filha. "Eu faço tudo. Limpo a casa num dia, passo roupas no outro e por aí vai.” (Colaborou Graziela Reis)

 

Empurrão para ficar perto dos desenvolvidos

Para Marcio Pochmann, professor de economia do trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Emenda Constitucional 77, a PEC das Domésticas, que igualou os direitos trabalhistas dos empregados domésticos com os dos outros trabalhadores brasileiros, é um empurrão para que o Brasil se aproxime de seus pares desenvolvidos nessa questão. Ele acha estranho que um país como o nosso, nada menos do que a sexta economia do mundo, ainda seja o líder em contingente de domésticos. “Há um atraso na evolução e na composição desse tipo de atividade no país. Nada menos do que 70% dos empregados domésticos estão em situação irregular, vivem à margem da legislação trabalhista”, afirma.

Segundo Pochmann, no Brasil há três questões que envolvem a mudança que a nova lei poderá provocar na sociedade. Primeiro, é preciso saber como vai se comportar a fiscalização do cumprimento das novas regras pelo Ministério de Trabalho e Ministério Público. Depois, as mudanças vão depender de os próprios trabalhadores cobrarem os seus direitos. Além disso, será preciso esperar para ver se os patrões vão aceitar o custo adicional, já que a contratação de um trabalhador doméstico é diferente de um trabalhador comum. “As empresas visam ao lucro quando contratam um empregado, mas as famílias visam ao bem-estar.”

Desigualdade

Olhando para a situação da prestação de serviços domésticos em nações desenvolvidas, Waldir Quadros, professor do Instituto de Economia da Unicamp, avisa: “Ainda não é para lá que a gente vai. A situação desses trabalhadores no Brasil vai permanecer distante por muito tempo porque a desigualdade social do país é grande e essa situação favorece o uso do trabalho doméstico”. (ZF)

 

Babá de US$ 180 mil
Em março de 2012 – um ano antes da aprovação da PEC das Domésticas no Brasil –, o jornal The New York Times publicou matéria sobre a brasileira Zenaide Muneton, de 50 anos, sob o título “A melhor babá que o dinheiro pode comprar”. Nascida em uma família pobre na periferia de São Paulo, Zenaide emigrou para os EUA na década de 1990, incentivada por uma amiga americana que fez no Brasil e que percebeu o talento dela para lidar com crianças . Em poucos meses, Zenaide era babá de uma família rica na Carolina do Sul, onde ganhava US$ 100 por semana. Em 2002, passou a trabalhar para uma agência especializada em fornecer mão de obra doméstica para milionários e elevou seus ganhos a US$ 85 mil anuais. Em 2011, segundo declarou ao jornal, Zenaide recebeu US$ 180 mil – mais um bônus de Natal – pelo trabalho como babá de crianças milionárias em Nova York.

 


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