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Estado de Minas

Barreiras dificultam o controle familiar

Procedimento de cobertura obrigatória, colocação de DIU é dificultada por convênios. Valores abortam chances de uso


postado em 18/03/2012 07:32

O dispositivo intrauterino hormonal (DIU) foi indicado como o melhor método anticonceptivo para a atendente Maria Elizabeth Valadares. Seguindo a atual média brasileira, ela tem dois filhos e não quer aumentar a família. O dispositivo que custa entre R$ 650 e R$ 800 foi incluído na cobertura obrigatória dos planos de saúde, mas apesar disso Elizabeth levou um ano para garantir o planejamento familiar. Como ela, a psicóloga Mariana Silva (nome fictício) também quer ter acesso ao método, mas ainda não conseguiu. A pedra no caminho das usuárias é o valor do procedimento que pode atingir R$ 1,5 mil e depende de um desembolso inicial do consumidor. O montante é maior que a renda mensal média da brasileira de R$ 1.341,81, segundo estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para dezembro de 2011.

O DIU foi incluído no rol de cobertura obrigatória dos convênios, mas a forma que a maior parte das operadoras adotou para cumprir a lei cria uma barreira para as pacientes e está desestimulando o uso do dispositivo. Em vez de fornecer o produto, os planos estão transferindo para as coneniadas a obrigação de comprá-lo. O modelo exige que a paciente tenha em caixa valores para a compra e apresenta ainda outro desafio. “Foi muito difícil encontrar um médico que não cobrasse para colocar o DIU, que fizesse o procedimento pelo plano. A maioria dos médicos que encontrei só fazia atendimento particular, com preços de até R$ 1,2 mil”, conta Elizabeth.

A maratona da usuária traz à tona o velho conflito entre médicos e operadoras de planos de saúde: a remuneração. No ano passado a questão ficou tão acirrada que os prestadores de serviço promoveram um dia de boicote aos planos. Pela colocação do DIU, as operadoras pagam entre R$ 80 e R$ 90, mas o valor é considerado baixo para o procedimento delicado, que segundo especialistas ouvidos pelo Estado de Minas tem riscos de infecção e até de perfuração do útero. No mercado particular, o preço varia entre R$ 450 e R$ 1,2 mil. O reembolso pelo dispositivo é integral. Mas o retorno pelo valor pago ao profissional pode não chegar a 10%.

Há seis meses Mariana Silva planeja colocar o DIU hormonal, mas ainda não conseguiu. “Meu médico não coloca DIU pelo plano de saúde. O preço do serviço particular é R$ 600 e o reembolso do meu plano não compensa. Ainda não consegui um ginecologista de minha confiança que faça o procedimento pelo plano”, afirmou.

Avanço e problemas O DIU hormonal foi incluído em 2010 no rol de procedimentos de cobertura obrigatória da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), sendo considerado um grande avanço. No Brasil, segundo dados da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o planejamento dos filhos ainda é um desafio: 55% das mulheres não programam a gravidez. A presidente do Comitê de Planejamento Familiar da Sociedade Mineira de Ginecologia (Sogimig), Ana Lúcia Valadares, aponta que o formato usado pela maioria dos planos não é bom, já que o reembolso leva 30 dias, uma dificuldade para mulheres com renda menor. “Isso tem sido um desestímulo à adoção ao método.”

O ginecologista e obstetra Diogo Lago coloca o DIU por vários planos mas diz que a tabela de remuneração é tão baixa em relação ao risco que ele prefere pensar que realiza o procedimento gratuitamente. “Coloco o DIU porque acompanho a paciente, gosto dela e quero o melhor para ela. O ato extrapola a questão financeira.”
Maria Elizabeth conseguiu colocar o DIU recentemente e ainda espera pelo reembolso, no valor de R$ 635. Ela conta que não desistiu do procedimento porque queria realmente substituir a pílula pelo método intrauterino, mas não foi fácil. “Pesquisei em várias farmácias e quando encontrei o produto tive que esperar uma promoção.” Elizabeth aguardou as férias para usar o dinheiro do descanso na comprar do dispositivo. “Seria bem melhor se o plano mesmo fizesse essa compra.”

Empresas dizem cumprir lei

Não é de hoje que o conflito de remuneração entre médicos e operadoras causa transtorno aos pacientes. O presidente da Comissão de Saúde Suplementar da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Márcio Bichara, comentou que o impasse em torno do DIU é o mesmo que já foi enfrentado pela vasectomia (método anticoncepcional masculino), que tinha a tabela de remuneração defasada, assim como pela remuneração das consultas, que desencadeou protesto nacional no ano passado.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), que representa 15 grupos de operadoras privadas, informou que, uma vez aprovada a inclusão de um novo procedimento no rol da ANS, a legislação é rigorosamente cumprida pelas operadoras afiliadas. Sobre a remuneração do procedimento de implante do DIU, a Fenasaúde esclarece que a medida é definida individualmente pelas operadoras nas redes prestadoras.

A Amil, Assistência Médica Internacional, que está entre as maiores operadoras de saúde do país, informou por meio de nota da filial Minas Gerais que considera relevantes as atualizações do rol de procedimentos médicos. “A empresa esclarece que as beneficiárias, que possuem contratos de planos regulamentados pela Lei 9656/98, contam com cobertura para implante do dispositivo de hormônio.” Com relação ao trâmite de aquisição do DIU, a Amil informou que recomenda que a compra seja feita diretamente pelo profissional que vai realizar o implante.

O conflito parece estar longe de um acordo. O ginecologista M.B conta que depois de um desentendimento com um determinado plano de saúde simplesmente avisou à operadora que não colocaria mais o DIU. “Meu problema com o plano é que eles queriam que eu comprasse o dispositivo para receber o reembolso sei lá quando. Eu sou médico, não comprador de DIU. O plano pode fazer isso com mais propriedade, compra em grande escala, com preço menor.”

A enfermeira Gisele Siuves conta que pesquisou o assunto antes de optar pelo método, há cerca de quatro meses. Ela constatou que o preço cobrado no mercado pela maioria dos médicos é próximo a R$ 450. “Considero excessiva a cobrança de valores acima de R$ 1 mil”, comentou. O plano da enfermeira é um dos poucos do mercado que fazem a compra do DIU. Gisele comentou que por sorte não precisou pagar pelo procedimento porque colocou o dispositivo após ato cirúrgico, no hospital. (MC)


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